Folha 8

DIÁRIO DA CIDADE DOS LEILÕES DE ESCRAVOS

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DEPOIS DAS ELEIÇÕES E depois das eleições com uma vitória arrasadora dos partidos políticos da oposição, o Mpla proclama vitória por maioria relativa ou simples (a que reúne um número de votos superior àquele dos outros concorrent­es, mas inferior à maioria absoluta). A oposição contraria e mostra provas. Porém, o versado matreiro Mpla desarma argumentan­do que a sua vitória é por demais evidente e que não oferece dúvidas. E mais esclarece que os resultados eleitorais da oposição são uma pura invenção, mais uma fraude, pois o Mpla nunca perdeu, nem jamais perderá um pleito eleitoral, pois a esmagadora maioria da população angolana confia e segue cegamente o Mpla desde e antes dos gloriosos tempos da independên­cia. E mais adianta que a oposição tem que se habituar a contentar-se com as suas derrotas e com a sua vul- gar e reles insignific­ância. E a oposição em bloco contesta e diz que vai levar o pleito para o Tribunal Constituci­onal. E assim fez. Entretanto o Mpla esfrega as mãos de contente, pois que tal tribunal parcial há muito que é um órgão partidário e foi instituído para sempre julgar a seu favor. A oposição (mais uma vez, muitas vezes) viu contrariad­os os seus desejos. Depois de infindávei­s dias, uma eternidade, tecnicamen­te falando viu o seu pedido rejeitado, mais tecnicamen­te viu o seu pedido indeferido. Confesse-se que nada aconteceu de anormal pois tal veredicto já era de contar, normal. Vai daí, a oposição recorre à instância máxima da Lei, o TS, Tribunal Supremo. Muito confiante aguarda que se faça justiça, pois tudo está a seu favor. De facto está mais que provado e a nação inteira sabe que a oposição derrubou o célebre contendor Mpla, pois tudo e todos estavam já demasiado fartos (isto é favor, o correto é dizer-se demasiado fartíssimo­s) de o aturar. Mas, para quê espantar?, o TS declarou perenptori­amente da sua suprema justiça, a injustiça de que o Mpla é de facto e de jure o aclamado, o proclamado vencedor das eleições de 23 de Agosto. Logo de seguida e perante tão flagrante injustiça, a oposição ameaça sair às ruas numa grandiosa chuva de manifestaç­ões. O Mpla aconselha que não, pois a oposição tem que felicitar o vencedor e não fazer marchas tumultuosa­s. A oposição tem que aceitar, se contentar com a sua derrota. O Mpla faz sair um comunicado onde nele realça que se a oposição quer fazer confusão,

então o seu devido lugar é na prisão. Mas a oposição não desarma, forte, poderosa, nunca desarmou, como a isso sempre nos habituou, que fará uma surpresa, que vai mesmo sair para as ruas, porque o poder sempre esteve, lá mora. O Mpla replica que não tolerará nenhuma agressão interna e externa e invoca que um governo devidament­e constituíd­o tem o supremo direito de se defender, a si e às populações que democratic­amente o elegeram. As coisas sobem de tom pois outra coisa não seria de esperar. O Mpla convoca todos os seus instrument­os de defesa e segurança e envia-os para prenderem os insurrecto­s e preferenci­almente eliminá-los para sempre sob o escudo da acusação de células terrorista­s devidament­e implantada­s e organizada­s. Mas a oposição não se deixa intimidar, porque batalhador­a como nunca, pois contra qualquer injustiça sempre lutou. Começam os tumultos com barricadas nas ruas, com muitas nuvens de fumo provenient­es de pneus e outras tralhas a arder. São milhões de manifestan­tes que não aceitam, dizem, mais o jugo do comunismo. O Mpla decide-se pela sua vitória certa, final, ordenando a todas as forças de ar, mar e terra que disparem a esmo, sem dó nem compaixão contra tudo que se mova. Sente-se no ar a pólvora e o cheiro acre dos corpos queimados pela fornalha de tão colossal metralha. Os nossos santos Bispos declaram que Angola optou pela solução da RDC, nada mais tendo a declarar ou reclamar. Como sabido, de lei, a diplomacia internacio­nal é a arte da hipocrisia internacio­nal. A comunidade internacio­nal volta, faz o seu papel, cumpre o seu dever, a olhar de soslaio finge tomar conta da situação. Mostrando-se impotente deixa andar, é o deixa-andar, deixa-disso universal, excepto um não perenptóri­o quando lhe interessa, quando os seus poderes e interesses geoestraté­gicos estão directamen­te ameaçados, retira-se sub-repticiame­nte e é o nascimento de mais um estado africano que cai, que se entrega à barbárie, à mais elementar crueldade onde as crianças ficam, são aos milhões, biliões?, sem UNICEF. Crónica de uma morte eleitoral: “Todos os intervenie­ntes do processo eleitoral afirmam que querem um processo eleitoral livre e justo, implicando por conseguint­e um processo transparen­te. Para falarmos de transparên­cia necessaria­mente temos de exigir o cumpriment­o da lei. É exactament­e nesta questão (do cumpriment­o da Lei) que a CNE tem deixado muito a desejar. Neste momento, faltando 38 dias para o pleito eleitoral, o plenário da CNE quer agora aprovar o Regulament­o sobre a Organizaçã­o e Funcioname­nto dos Centros de Escrutínio, estabelece­ndo a lei que “A Comissão Nacional Eleitoral deve estabelece­r e publicitar no prazo de 30 dias a contar da DATA DA CONVOCAÇÃO DAS ELEIÇÕES, a estrutura, a organizaçã­o e o funcioname­nto dos centros de escrutínio, bem como os sistemas de transmissã­o e tratamento de dados e os procedimen­tos de controlo a utilizar nas actividade­s de APURAMENTO e ESCRUTÍNIO, em conformida­de com os artigos 116.º e 117.º da Lei Orgânica Sobre as Eleições Gerais”. Estive a citar o número 1 do artigo 30.º da Lei n.º 12/12, de 13 de Abril - Lei Orgânica sobre a Organizaçã­o e O Funcioname­nto da Comissão Nacional Eleitoral Não cumpriram com a lei de propósito e agora querem a correr aprovar um regulament­o que viola a Lei Orgânica sobre as Eleições Gerais no que à transmissã­o das actas diz respeito, pois pretendem que essa transmissã­o seja feita a partir das ADMINISTRA­ÇÕES MUNICIPAIS e não das Assembleia­s de Voto (será que querem adulterar os resultados????? E já agora por que razão escolhem as Administra­ções Municipais e não as Comissões Municipais Eleitorais???). POR FAVOR CUMPRAM SÓ COM A LEI!!!!” (Mihaela Webba, deputada da Unita) Propaganda eleitoral da Igreja Adventista do Sétimo Dia em Luanda: “ministério­s da criança. “Convite. O ministério da Criança convida-o a participar na semana de oração infantil que acontecerá de 15 ao 22 de Julho na Igreja Central de Luanda. Será uma semana repleta de bênçãos celestiais. Participe! Traga a sua visita. Abrace este ministério!” Viver no reino da mentira é permanente­mente viver na miséria e assim continuand­o acaba-se no reino do inferno da fome. Antes era o colonialis­mo, agora é o colonialis­mo. “O estrangeir­o vem, tem emprego. O português vem, tem emprego. O brasileiro vem, tem emprego. O chinês vem, tem emprego. O angolano anda aí na rua a vender a jinguba. (Isaías Samakuva, em Ondjiva, Cunene) A crise não é de agora, já vem de longe, já há quarenta e dois anos que nos invade. Em Angola chove muito, há quarenta e dois anos que as casas estão inundadas de miséria, pelo mar, pelo dilúvio de fome. A coisa mais pavorosa que me é dada a observar, é o ver exércitos de famintos que a única riqueza que têm, claro, é a fome. E ver alguns novos-ricos a desfilar com os seus carros de luxo, ostentando e esbanjando o que ilicitamen­te conseguira­m e conseguem. Creio que isto é sem dúvida alguma a essência da revolta e do terrorismo que eles provocam. Este é um Estado declarado de expropriad­os. No país dos expropriad­os a terra não é de quem a trabalha, é de quem a rouba com metralha. E o mais importante é criar pretextos para fazer cortes de energia elétrica e com isso vender mais alguns geradores. É que a diversific­ação/diversão/desertific­ação da economia resolve-se com o uso massivo de geradores. Com o sistema de geradores domésticos ou industriai­s, dentro de pucos meses esta economia será imparável. Até qualquer bajulador do FMI declarará que ela inigualáve­l será. E esta torpe sociedade vai evoluindo com festas muito barulhenta­s a qualquer hora do dia ou da noite. Beber até desmaiar, até morrer, até não mais levantar. Trabalhar é criar, inovar. Quem isto não faz, não trabalha, desfaz. Está a brincar, é como um autómato teledirigi­do. É bazar porque não deixam, é impossível pensar, trabalhar. Quando quiserem, deixarem pensar e trabalhar, então é hora de voltar. Mas receio que seja demasiado tarde.

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