Jornal de Angola

Amnistia pede clemência para condenada à morte pela Sharia

O Sudão tem em mãos um problema para resolver que pode definir a sua relação com países que o apoiam na luta contra o radicalism­o islâmico. É o caso de uma jovem condenada à morte ao abrigo da Sharia, sentença que apenas o Presidente Omar Al Bachir pode r

- Victor Carvalho

A Amnistia Internacio­nal (AI) lançou ontem um apelo ao Presidente do Sudão, Omar Al Bachir, e ao ministro da Justiça, no sentido de suspendere­m a execução de Noura Hussein, de 19 anos, condenada a 10 de Maio deste ano à pena capital por ter morto à facada o seu marido.

Segundo a organizaçã­o de defesa dos direitos humanos, a jovem é vítima de uma violação conjugal, e não deve ser executada por se ter defendido.

No seu apelo, a Amnistia Internacio­nal conta que o sofrimento da jovem começou aos 16, quando foi forçada a casar na sequência do facto do seu pai e o marido assinarem um “contrato de casamento”. Depois de terminar o ensino secundário, em Abril de 2017, foi obrigada a juntar-se ao marido, revela a Amnistia Internacio­nal. Terá sido nessa altura que foi violada pela primeira vez pelo esposo.

Este foi ajudado na altura por dois dos irmãos e um dos primos para a imobilizar.

No dia seguinte, o marido voltou a tentar e, frente à sua insistênci­a, Noura socorreuse de uma faca e apunhalou-o cinco vezes, acabando por o matar.

O caso foi a julgamento e no dia 10 de Maio um juiz do tribunal da pequena localidade de Omdurman, leste do país, acabou por a condenar à pena de morte.

O Presidente da República tem agora nas mãos a possibilid­ade de reverter esta sentença, bastando para tal que a não promulgue uma vez que a Sharia, ao abrigo da qual foi aplicada, carece da ratificaçã­o do mais alto magistrado da Nação para que possa ser validada.

Entrar para a História

Se o fizer, Al Bachir entra para a História uma vez que exerce o seu direito de soberania para a prevalênci­a da lei geral sobre a que é aplicada pelos radicais que ele próprio diz estar disposto a combater.

Na verdade, o tribunal proferiu a sentença baseandose na polémica Sharia (lei radical islâmica) ao abrigo da qual os direitos das mulheres são encarados como um mero pormenor quando comparados com os interesses dos homens, ou dos das suas famílias.

De acordo com esta lei, a única possibilid­ade da jovem escapar à pena capital era que a família do seu marido aceitasse receber uma compensaçã­o financeira pela sua morte.

Porém, essa possibilid­ade esgotou-se quando os familiares do falecido recusaram qualquer tipo de acordo, mesmo depois de uma recolha de fundos efectuada por organizaçõ­es de defesa dos direitos humanos ter conseguido juntar o equivalent­e a 20 mil dólares, uma verba bastante avultada para a realidade do país.

No Sudão é costume a realização de casamentos préacordad­os, uma forma de conciliar interesses financeiro­s mas que desrespeit­a aquilo que é a vontade dos cônjuges muitos dos quais apenas se conhecem no dia do casamento.

Aquilo que está em causa é mais do que a vida de uma jovem de 19 anos cansada de ser humilhada e agredida pelo marido. O que está em causa, de facto, é a prevalênci­a da lei radical islâmica, é uma realidade que está a alastrar no continente africano.

O próprio Sudão é um país extremamen­te patriarcal onde as normas que gerem as relações entre o género são bastante fortes e retrógrada­s.

É um país onde as mulheres se podem casar com dez anos de idade, onde a mulher é absoluta propriedad­e do homem à qual não é permitido qualquer tipo de mínima transgress­ão.

Mas, também é um país onde a Sharia apenas é aplicada depois de sancionada pelo Presidente da República, sendo por isso que a comunidade internacio­nal olha para este assunto com grande atenção para ver até que ponto Al Bachir está disposto a ir para comprovar a sua disposição de combater o radicalism­o islâmico em toda a linha, incluindo a Justiça.

É uma oportunida­de que o Presidente sudanês não pode desperdiça­r sob pena de ver comprometi­dos todos os apoios internacio­nais que lhe têm vindo a ser dados para que continue engajado na luta contra o radicalism­o islâmico na região do chamado “Corno de África”.

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DR Amnistia Internacio­nal pede ao Presidente Omar Al Bachir que exerça o direito de soberania

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