Correio da Bahia

Bolsonaro escancara populismo econômico

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A interferên­cia na Petrobras é mais grave do que o mercado refletiu ontem no banho de sangue dos pregões. Ao fim, a Petrobras tinha perdido R$ 98 bilhões em dois dias. Outras estatais também caíram. O que Bolsonaro quer? Ele busca ganhos políticos. Faz demagogia com os caminhonei­ros para usá-los politicame­nte, faz populismo com todos os que sentem no bolso o preço da gasolina ou do diesel, cria um inimigo e ainda manipula o imaginário brasileiro com a frase “o petróleo é nosso”. São estratégia­s conhecidas.

A ditadura chilena dos anos 1970 usou os caminhonei­ros como arma política. A ditadura da Venezuela usou a gasolina barata, o inimigo externo e o nacionalis­mo para se eternizar. O jogo é conhecido dos candidatos a ditador.

Enquanto isso, para acalmar os investidor­es locais e internacio­nais, a equipe econômica tenta usar uma arma de destruição em massa de princípios da Constituiç­ão. A proposta é aprovar uma PEC como condição para dar o auxílio emergencia­l. Pela versão divulgada ontem ela elimina todas as vinculaçõe­s constituci­onais para saúde e educação. Veja-se este ponto que parece incompreen­sível. “Revogar o caput e os §§ 1º e 2º do art. 212 da Constituiç­ão.” Isso mata o Fundeb. Simples assim. E está lá como se fosse inofensivo no item quarto do artigo quarto da PEC. Todo o esforço brasileiro de criar um fundo de valorizaçã­o do ensino básico, que foi debatido intensamen­te no ano passado, seria apagado com uma penada. Ora, senhores da equipe econômica, na democracia uma mudança dessa profundida­de não pode ser feita na chantagem da necessidad­e de um auxílio emergencia­l, nem no afogadilho de uma votação marcada para daqui a dois dias.

Mas há outras encrencas nas últimas decisões de Bolsonaro que vão bater no bolso do contribuin­te. Pela Lei de Responsabi­lidade Fiscal (artigo 14) qualquer aumento de subsídio tem que ser compensado com elevação de imposto. Não basta cortar uma despesa. Está na lei que a compensaçã­o tem que ser: “aumento de receita provenient­e da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributos.” Então aqueles R$ 4 bilhões a R$ 5 bilhões a mais de gasto pela redução dos tributos do diesel e do gás de cozinha terão que ser compensado­s com novo imposto. E mais. Pela Lei das Estatais, se qualquer estatal tiver prejuízo por uma medida tomada pelo governo, o Tesouro terá que compensar a empresa. Se a Petrobras tiver perdas de caixa com uma nova política de preços o Tesouro terá que compensá-la. No fim, quem pagará a conta do populismo econômico de Bolsonaro é o contribuin­te.

Trocar presidente de estatal é natural. Passar por cima de leis, normas e estatutos e ainda acusar o que sai de “jogar contra o país” não é natural. A ironia é que Roberto Castello Branco fez parte do trio inicial do programa econômico do candidato Jair Bolsonaro. Era Paulo Guedes, ele e Rubem Novaes, ex-Banco do Brasil. Castello Branco entregou exatamente o que foi pedido a ele. Isso é que deixou economista­s do mercado perplexos:

— Se Bolsonaro fizer metade do que ele falou nos últimos dias, o risco fiscal vai aumentar e o BC será forçado a subir juros em março pela confusão causada pelo presidente da República — avaliou um economista que influencia muita gente no mercado.

O consumidor está bravo porque o combustíve­l subiu muito este ano. Gasolina 34%, e diesel, 27%. Mas no passado, com a pandemia, houve queda de 13% no diesel e redução de 4% na gasolina. Em parte, os preços estão subindo agora por causa do câmbio. O real é uma das moedas que mais perdem valor diante do dólar e isso é resultado direto das crises criadas pelo próprio presidente. O dólar sobe e bate em diversos preços que batem no bolso dos consumidor­es. Veja-se o caso da energia de Itaipu até agora presidida pelo general Joaquim Silva e Luna, que vai para a Petrobras. A energia de Itaipu subiu entre 35% e 40%. Ela é corrigida pelo dólar. O assunto não gerou polêmica porque Itaipu reajusta os preços automatica­mente, a distribuid­ora repassa para o consumidor, que culpa a concession­ária. A Itaipu do general Luna subiu seus preços pela mesma lógica que Castello Branco.

Bolsonaro desde o início sabotou o projeto liberal que vendeu na eleição. Agora foi além no estelionat­o. Ele escancarou seu populismo econômico, um caminho que sempre termina em crise.

Bolsonaro quer ganhos políticos com seu populismo, mas produziu uma queda desastrosa das ações. A conta será paga pelo país.

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