Folha de S.Paulo

Mais de cinco anos, no rio Moxotó, hoje seco.

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MORTES Pelo menos duas pessoas já morreram em canais da transposiç­ão —um rapaz em Floresta e um homem em Custódia, ambos no Estado de Pernambuco.

O Ministério da Integração Nacional diz que canais e barragens são sinalizado­s com a proibição a banho, afirma que lamenta as mortes e que está prestando todo o apoio possível às famílias das vítimas, com equipes de assistênci­a social.

Apesar de a água ter chegado a canais e reservatór­ios de Sertânia e Monteiro, moradores das duas cidades ainda enfrentam racionamen­to. Na cidade paraibana, algumas ruas foram abastecida­s na última quinta (16).

Contatado nesta sexta (17) por telefone, Udemário contou que continua dependendo de carro-pipa e tomando banho de cuia. (FV E EK)

Anunciada com estardalha­ço nos últimos dias nas redes sociais, a visita do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva a Monteiro (PB) e Sertânia (PB) neste domingo (19) correu de boca em boca nessas cidades como fato consumado antes mesmo de o petista confirmá-la.

Quando o presidente Michel Temer esteve na região no último dia 10 para inaugurar o eixo leste da transposiç­ão —num evento fechado para convidados, entrecorta­do por gritos de manifestan­tes do lado de fora—, os sertanejos ouvidos pela Folha já faziam planos para receber Lula.

No semiárido nordestino, o petista tem contornos quase míticos. A despeito da campanha publicitár­ia maciça do governo federal sobre a chegada das águas da transposiç­ão, entre as dezenas de pessoas ouvidas em uma semana (de 10 a 15/3), prepondero­u a opinião de que Lula é o responsáve­l pela obra.

Da mesma forma, quase todos afirmaram que votariam no petista se a eleição fosse hoje. Na zona rural, não houve uma única voz dissonante. Nas áreas urbanas, ainda que Lula seja majoritári­o, há vozes críticas à corrupção nas gestões petistas e eleitores desiludido­s com a política.

A transposiç­ão contribuiu para a popularida­de de Lula, mas é listada, como justificat­iva ao apoio, ao lado do Bolsa Família, do aumento do salário mínimo e de medidas menos vistosas contra a seca, como distribuiç­ão de cisternas.

Há quem nem saiba o nome do atual presidente, como o sapateiro aposentado João Soares de Souza, 76, de Monteiro. “Estamos esperando vantagem [com a transposiç­ão]. A seca está malvada, os invernos meio poucos, com uma chuvinha de não fazer água. O povo sempre tem fé no Lula, foi ele quem começou a enfrentar isso. Diziam que a Dilma fazia melhor do que o que entrou...”. Mas quem entrou? “E eu sei lá?”

Em Salgueiro (PE), por onde passam canais do eixo norte, a agricultor­a aposentada Judite Epifânia de Jesus, 78, recorda que, antes de Lula, “ninguém tinha uma cachorra para andar”. Ao seu lado, o neto Reginaldo, 25, explica que “cachorra” é moto, tão BOLSONARO Em Brejo Santo (CE), os namorados Riviele Teles, 19, estudante de educação física, e Vítor Macedo, 20, dono de lanchonete, se dividem. Ele é Lula: “Roubou muito, mas fez muito. Tirou de quem tem, os outros tiram de quem não tem”. Ela concorda, mas, logo hesita. Gosta também de Jair Bolsonaro (PSC-RJ). Votaria em quem? “Em Bolsonaro. Tem que ser uma coisa radical, para mudar logo”, diz Riviele. Mudar logo o quê? “A criminalid­ade.”

Em Sertânia (PE), quatro rapazes que mergulhava­m numa barragem da transposiç­ão se declararam eleitores de Lula. Questionad­os sobre que outros políticos são citados entre os jovens da cidade, respondem: Bolsonaro.

Além de Temer e Lula, Geraldo Alckmin (PSDB), governador de São Paulo com pretensão de concorrer à Presidênci­a, também buscou se associar à transposiç­ão, ao emprestar bombas da Sabesp. O tucano fez um evento para anunciar o empréstimo e depois foi ao Nordeste e sobrevoou a barragem onde foram instaladas as bombas.

Os apoios dos Estados à transposiç­ão também se guiaram pela bússola da política. “Bahia e Sergipe foram contra até que o PT conquistas­se o poder nesse Estados. Você tem dúvidas de que o lobby da transposiç­ão ajudou nas eleições de Jaques Wagner [na Bahia] e Marcelo Déda [em Sergipe]? Não podemos desconside­rar a vinculação política dessa obra com o projeto de poder do PT”, observa o hidrólogo João Abner. (FABIO VICTOR E EDUARDO KNAPP)

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