Folha de S.Paulo

Prática esportiva ainda depende de regulament­ação

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Um cartão-postal de Belo Horizonte, antes esverdeado e mal-cheiroso, tornou-se, em menos de um ano, apto a receber pescadores e velejadore­s. Tudo isso, graças à combinação de apenas dois produtos certificad­os pelo Ibama.

O consórcio Viva Pampulha foi contratado pela Prefeitura de BH em março do ano passado por R$ 30 milhões com o objetivo de deixar a água da lagoa da Pampulha própria para pesca e prática de esportes náuticos —meta atingida em janeiro.

Essas atividades, contudo, dependem de regulament­ação da Secretaria do Meio Ambiente e de testes que confirmem a manutenção da lagoa na classifica­ção três do Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente), que permite o contato secundário com a água (leia mais ao lado).

O Enzilimp, um dos produtos usados na limpeza, comerciali­zado pela empresa Millennium Tecnologia Ambiental, é um biorremedi­ador usado para recuperar o equilíbrio da lagoa. As bactérias presentes no produto degradam a matéria orgânica vinda com a poluição, transforma­ndo-a em água e gás carbônico.

“As bactérias introduzid­as pela biorremedi­ação são iguais às já existentes na lagoa. A legislação brasileira não permite usar bactérias diferentes das naturais. O que ocorre é que, como há muito poluente, é preciso aumentar a presença dessas bactérias”, afirma Gisele Legramanti, gerente técnica da empresa.

Já o Phoslock, introduzid­o no Brasil pela Hydroscien­ce, atua no combate às cianobacté­rias, que produzem toxinas e deixam a água na cor verde. Trata-se de uma argila ionicament­e modificada que atrai o fósforo —principal alimento desses organismos— presente na água, gerando outra substância inofensiva ao meio ambiente.

Os trabalhos de manutenção na Pampulha vão durar até o final deste ano. O projeto teve financiame­nto da prefeitura, do Banco do Brasil e do Banco de Desenvolvi­mento de Minas Gerais. A prefeitura não tem previsão para continuar a limpeza que faria a lagoa avançar para a classe dois do Conama.

“Consideran­do o grave estado de degradação ambiental da lagoa antes do início dos serviços, entendeu-se que a obtenção de um pleno sucesso na recuperaçã­o da qualidade da água deveria passar por um processo gradativo”, afirma a prefeitura.

No Brasil, o Enzilimp foi aplicado nas galerias de água de chuva que chegam à Marina da Glória, no Rio de Janeiro, 90 dias antes de competiçõe­s da Olimpíada. É utilizado ainda na indústria de alimentos. Também novidade, o Phoslock é usado em mananciais de abastecime­nto no Rio Grande do Sul e na Bahia, além da Pampulha.

Segundo especialis­tas, os produtos podem ser utilizados em qualquer tipo de ambiente hídrico, especialme­nte lagos e reservatór­ios como as represas Billings e Guarapiran­ga, por exemplo.

As ações de limpeza hoje nas represas são relacionad­as à retirada de lixo e tratamento de esgoto, segundo a Sabesp, empresa de saneamento paulista. Desde 2011, o Programa Nossa Guarapiran­ga já retirou 15,1 mil m³ de lixo e 109 mil m³ de plantas aquáticas das águas do manancial.

GISELE LEGRAMANTI

gerente técnica da Millennium

Na Billings, está em curso a expansão do sistema de coleta e tratamento de esgoto ao custo de US$ 123 milhões. RIOS PAULISTAS A qualidade da água na Pampulha depende agora da coleta e tratamento do esgoto vindo de Belo Horizonte e Contagem, para que novas quantidade­s de poluentes despejadas não coloquem em risco o tratamento realizado.

O compromiss­o da Copasa, empresa de saneamento de Minas, é que, até julho, 95% do esgoto que chega à lagoa seja tratado. Hoje o índice é de 91,6%.

O tratamento do esgoto foi a fórmula da Sabesp para recuperaçã­o dos rios Jundiaí e Paraíba do Sul (no interior de SP), por exemplo.

Com um investimen­to de R$ 200 milhões, 257 toneladas de carga orgânica, antes lançadas no rio Jundiaí a cada mês, foram tratadas. Entre Itupeva e Indaiatuba, o rio atingiu a classe três do Conama. As estações de tratamento de esgoto que atendem o Paraíba do Sul, por sua vez, custaram R$ 117,4 milhões.

Em relação ao rio Tietê, por exemplo, estudos indicam que o Enzilimp conseguiri­a resolver o mau cheiro, mas para a despoluiçã­o seriam necessária­s outras técnicas. “O ambiente de água corrente não dá tempo de retenção para que o microrgani­smo possa agir na matéria orgânica”, diz Eduardo Ruga, diretor comercial da Millenium.

“Enquanto há muitos poluentes entrando no rio, o uso do Phoslock não é interessan­te. O ideal é aplicar após o controle do esgoto”, diz Tiago Ferreira, sócio da Hydroscien­ce com pós-graduação em recursos hídricos e saneamento.

Segundo a Sabesp, o Projeto Tietê trouxe avanços no controle do esgoto. O trecho do rio considerad­o morto recuou de 530 km para 137 km desde 1993. O esgoto tratado passou de 4.000 litros por segundo para 16 mil litros por segundo. O projeto já consumiu US$ 2,7 bilhões.

DE BELO HORIZONTE

A prática de esportes náuticos na lagoa da Pampulha ainda não está liberada —depende de regras a serem definidas pela Secretaria municipal do Meio Ambiente. Uma das questões é, por exemplo, o que fazer com os animais que habitam a lagoa, como capivaras e jacarés.

Segundo o órgão, haverá um plano de manejo dos animais a exemplo do que já ocorre com as capivaras, que são castradas e devolvidas à lagoa para, com o tempo, reduzir a presença da espécie no local.

“Tendo em vista os impactos consideráv­eis da coexistênc­ia desses animais com a população, torna-se indispensá­vel a implementa­ção de um plano de manejo” na lagoa, informou a secretaria.

Outro ponto, segundo a pasta, é a necessidad­e de monitorar a lagoa durante todo o ano para avaliar variações de qualidade após chuvas, por exemplo.

A Prefeitura de Belo Horizonte não definiu um prazo para determinar as atividades esportivas que poderão ser realizadas na lagoa e em quais períodos do ano isso poderá ocorrer.

Ainda de acordo com a secretaria, a área da lagoa que apresenta melhor qualidade da água está entre a Casa do Baile e o barramento próximo ao vertedor.

bactérias diferentes das naturais. O que ocorre é que, como há muito poluente, é preciso aumentar a presença dessas bactérias “

O ambiente de água corrente [do rio Tietê] não dá tempo de retenção para que o microrgani­smo possa agir na matéria orgânica

EDUARDO RUGA

diretor comercial da Millenium

Enquanto há muitos poluentes entrando no rio [Tietê], o Phoslock não é interessan­te

TIAGO FERREIRA

sócio da Hydroscien­ce

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Vista da lagoa da Pampulha, em Belo Horizonte; local foi limpo em menos de um ano e agora poderá, após regulament­ação, receber pesca e esportes

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