PACIENTE DO SUS
FOLHA
Ao receber o diagnóstico de câncer em estágio avançado com expectativa de vida máxima de dois anos, Elfriede Margarete Bleidorn Galera, 61, teve uma espécie de apagão. Não entendia a razão de ter passado tanto tempo desde que havia procurado ajuda, cerca de dois anos antes, ao notar algo de estranho em uma das mamas.
Frida, como é conhecida, descobriu em 2010 que tinha câncer de mama metastático —o tumor havia atingido ossos, pulmão e fígado.
O diagnóstico tardio provavelmente foi fator decisivo para o avanço da doença. Sem plano de saúde, procurou um posto de saúde na capital paulista. Foi atendida, mas não conseguiu realizar a mamografia. Fez o exame na rede particular e levou o resultado ao mesmo posto de saúde e foi informada de que estava tudo bem.
Em 2009, com o mamilo descentralizado e uma diferença maior entre as mamas, voltou ao posto. Novamente sem conseguir marcar a mamografia, fez novo exame na rede particular e, em novembro, procurou um posto de saúde em Cotia, na Grande São Paulo. O médico, diz ela, olhou o exame, mas não a examinou. Mas solicitou um ultrassom —marcado para setembro de 2010.
Convencida de que algo estava errado, não aguardou a realização do procedimento e foi ao hospital estadual Pérola Byington, centro de referência da saúde da mulher em São Paulo.
O hospital tem um modelo próprio de atendimento resolutivo onde, após passar pelo mastologista, o paciente já faz em seguida os exames necessários —mamografia, ultrassonografia, biópsia.
Foi diagnosticada no mesmo dia da consulta, mais de dois anos após procurar assistência médica pela primeira vez. Casada, com dois filhos adolescentes e sem histórico familiar da doença, contou a todos no mesmo dia. Foi um baque, mas a família se uniu para apoiá-la.
Frida passou por quimioterapias e hormonioterapias. Perdeu o cabelo, testou lenços e perucas e decidiu não usar nada. Entre tratamentos, fez mastectomia radical em uma das mamas.
Até que no final de 2015, diante de nova progressão da doença, teve de entrar com uma ação administrativa junto ao Estado para obter medicamento não disponibilizado pelo SUS para casos como o dela. Frida conseguiu a liberação da droga, mas teve que esperar cinco meses. “Foi a primeira vez que fiquei desesperada. Era minha única opção, a espera foi uma sensação horrível.”.
Com a experiência, passou a integrar grupos para orientar mulheres na mesma situação a obter a medicação. BRIGA NA JUSTIÇA Em 2016, mais uma progressão da doença. Dessa vez já não havia mais recursos terapêuticos dentro da rede pública, mas ela sabia da existência de um fármaco indicado para o seu caso.
Foi à Justiça contra o Estado. Mais uma vez teve que esperar meses até começar a receber a medicação, que vem usando desde então. “Cada minuto conta, mas é como se eu não fosse mais interessante para o sistema”, lamenta.
Há sete anos em tratamento, tem uma rotina hospitalar intensa, mas não reclama. “É muita luta, mas o hospital é meu pote de vida”, diz ela em referência a uma partida de videogame. “Cada vez que venho aqui, pego uma vida nova pra continuar o jogo.”