Folha de S.Paulo

A privatizaç­ão da segurança

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RIO DE JANEIRO - Quem circulou pela Lagoa, um dos bairros mais ricos do Rio, nas últimas semanas, topou com um grande cartaz, onde se lia: “Nós moradores pagamos impostos para que a Fecomércio mantenha a operação Lagoa Presente”.

Era um pedido —uma ordem, na verdade, como se nota pelo tom arrogante— dirigido à federação do comércio para que continuass­e a bancar a referida operação, que usa policiais militares da ativa e da reserva e “agentes civis egressos das Forças Armadas” para policiar o bairro.

A Segurança Presente foi iniciada na Lapa, em janeiro de 2014, e se expandiu para Lagoa, Aterro do Flamengo e Méier em dezembro de 2015, indo depois para o Centro, em julho de 2016. Até a última segunda (15/5), o conjunto das operações realizou 10.118 prisões, sendo 5.465 por posse e uso de entorpecen­tes.

Diante da ameaça de que o convênio da Fecomércio com o governo estadual não fosse renovado —Pezão garante que será—, os moradores armaram o protesto. Ele revela uma visão equivocada do que seja segurança pública, a começar pelo fato de ser direcionad­o não ao governador, mas ao presidente da federação comercial.

A crença irracional numa solução privada, particular, para o problema da violência urbana levou à proliferaç­ão de fortalezas residencia­is e, no caso mais extremo, à defesa da liberação do porte de armas. Levou também à formação de milícias, como já se observa em bairros da zona sul carioca como Flamengo e Copacabana, onde não são raros os relatos de bandos de homens agredindo quem julgam culpado de algum crime.

Não há solução possível para a criminalid­ade do Rio enquanto os moradores de áreas ricas pensarem apenas em defender seu território, achando que fazem jus a tratamento preferenci­al porque pagam impostos e que a privatizaç­ão é o caminho para a segurança pública. marco.canonico@grupofolha.com.br

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