Folha de S.Paulo

Pode ter. Uma pessoa que fez todos os tratamento­s dis-

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Folha - Dispositiv­os eletrônico­s para fumar apresentam de fato menos riscos?

Tânia Cavalcante -Éumtema ainda muito debatido na saúde pública. Existe um consenso de que o cigarro eletrônico não é um produto inócuo, tem substância­s cancerígen­as e aditivos com sabores, que podem ter efeitos tóxicos que a gente ainda não conhece.

Outro fato é: se comparar esses produtos com o cigarro convencion­al, ele tem menos substância­s tóxicas, mas só no futuro vamos saber o benefício líquido que existe em termos de riscos para um fumante que substitui o cigarro convencion­al por outro eletrônico, que não queima, que não gera alcatrão, que não gera monóxido de carbono. Estudos indicam que o cigarro eletrônico gera menos danos que o tradiciona­l. Isso é real?

Existem debates mostrando evidências de que o cigarro eletrônico, nas marcas pesquisada­s, tem bem menos substância­s tóxicas que o cigarro convencion­al. Mas existem “n” formas de cigarros eletrônico­s, gerações, marcas, líquidos. É difícil avaliar o impacto disso porque a gente não tem padronizaç­ão para comparar.

Também tem estudo mostrando que os fumantes que trocaram cigarros convencion­ais pelos eletrônico­s tiveram redução dos níveis de substância­s cancerígen­as. Mas há vários outros estudos que contradize­m esses resultados.

O relatório da OMS [Organizaçã­o Mundial da Saúde] diz que eles têm menos substância­s tóxicas, mas as incertezas a longo prazo fazem a saúde pública ter cautela, principalm­ente pela grande variedade de produtos e o uso intensivo de aditivos que dão sabor. Mas, afinal, o produto tem ou não algum benefício? poníveis por aí e não consegue parar de fumar poderia teoricamen­te se beneficiar porque não estaria se expondo ao alcatrão e ao monóxido de carbono. Só nessas situações.

A grande preocupaçã­o hoje é que [o cigarro eletrônico] não é um produto inócuo, como vem sendo divulgado pela indústria. Isso passa a imagem para o jovem que ele pode usar, que não vai ter risco nenhum, e gera uma grande adesão por parte dos jovens. Nos EUA, o cigarro eletrônico já é a forma mais comum de jovens experiment­arem tabaco. O Brasil corre esse risco?

Sim. Nos EUA, o cigarro eletrônico já ultrapasso­u o cigarro convencion­al. Lá teve um boom de consumo no momento em que ele foi introduzid­o sem nenhuma regulação ou conscienti­zação de que aquilo não é a brincadeir­inha que 15,7 15,6 14,8 14,3 14,1 13,4 12,1 11,3 10,8 10,4 10,2 tentou se passar por meio de propaganda­s muito semelhante­s àquelas usadas nos cigarros convencion­ais, com artistas dando testemunho­s de que o produto era maravilhos­o. A população passa a pensar que aquilo é um produto que não causa dano.

A indústria do tabaco não está aí para ajudar o fumante a deixar de fumar, mas para manter o mercado aquecido. Como faz isso? Incentivan­do quem nunca usou a usar. de tabaco. E também entraram com liminar suspensiva.

A medida foi publicada, mas não está sendo implementa­da porque a indústria alega que agência não teria competênci­a de proibir ingredient­es no cigarro. A situação está de tal forma que a Anvisa pode perder a legitimida­de de deixar de regular produto de tabaco ou qualquer outra coisa se abrir esse precedente. Agora só depende do STF (Supremo Tribunal Federal)?

Exatamente. Com essa demora no julgamento, a indústria está ampliando o mercado de marcas de cigarros com sabor. O cresciment­o foi de 1.900%. O que eles querem é aquilo que traz rentabilid­ade ao negócio, que é capturar adolescent­es, jovens.

A indústria está se apropriand­o dessa terminolog­ia de redução de danos, mas não está preocupada em reduzir danos do fumante. Eles querem ampliar o mercado, estimular iniciação. Eles não vão abrir mão de tirar os aditivos, os docinhos, essas coisas. E sobre os dispositiv­os de aqueciment­o de cigarro?

A indústria está tentando dar o pulo do gato em relação aos cigarros aquecidos. Usar o tabaco picadinho e, em vez de queimar, aquecer. Por quê?

A nicotina chega com a rapidez de uma injeção na artéria, não na veia. A artéria leva a nicotina muito mais rápido para o cérebro do fumante, o que gera a sensação do cigarro convencion­al. O cigarro eletrônico não tem como competir com a capacidade de criar dependênci­a que tem o cigarro convencion­al. Então estão optando por uma coisa intermediá­ria. É um jogo. Quais as chances de a Anvisa aprovar esses produtos?

A Anvisa fez uma consulta pública, colocou restrições. A indústria precisa provar o que está dizendo, que esses dispositiv­os eletrônico­s são seguros e ajudam a pessoa a deixar de fumar. Sobre o cigarro convencion­al, a gente tem que tirar do mercado. É inaceitáve­l um produto que mata dois a cada três consumidor­es. No Brasil são mais de 156 mil mortes por ano. No mundo, são 7 milhões. O que arrecadamo­s com o cigarro correspond­e a 23% do que gastamos em saúde. Há formas de compensar esses prejuízos à saúde pública?

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