Folha de S.Paulo

Agressivo, petista sai mais réu que candidato

No 1º depoimento a Moro, ex-presidente elaborou discurso para campanha; desta vez, foi enquadrado pelo juiz

- IGOR GIELOW

Quatro meses atrás, Luiz Inácio Lula da Silva permeou seu primeiro encontro com Sergio Moro de ironias e com um firme propósito de estabelece­r um discurso para a militância do PT.

Nesta quarta (13), o que se viu em Curitiba foi o petista acuado e agressivo, obrigado a falar sobre o objeto da ação que responde e tolhido ao tentar fazer manifestaç­ões mais politizada­s.

Se isso deveria ser a normalidad­e num processo judicial, a realidade aguda da crise política brasileira tornou o episódio uma exceção.

De lá para cá, as coisas mudaram. Lula se manteve à frente de pesquisas de intenção de voto para a Presidênci­a em 2018, mas foi condenado pelo mesmo Moro e agora sua elegibilid­ade depende de uma improvável reversão total da sentença pelo Tribunal Regional Federal de Porto Alegre.

Mesmo com os óbvios recursos neste caso, o PT já trabalha num plano B. O partido gostaria de ver a decisão da segunda instância até maio, para ter tempo de elaboração de uma campanha que seja competitiv­a.

O ex-presidente tenderá a manter-se como um polo da disputa, estando ou não na urna, mas o seu encolhimen- to retórico e mesmo o fraco apoio que obteve nas ruas inspira um acompanham­ento próximo para a manutenção dessa assertiva.

A expressão corporal de Lula mudou neste depoimento. Se demonstrav­a algum nervosismo e ansiedade na oitiva de maio, agora vociferou e ficou perto de explodir verbalment­e diversas vezes.

Foi particular­mente notável seu embate com a repre- sentante do Ministério Público, que acabou mal para Lula: num dado momento, ele a chama de “querida” e é repreendid­o por Moro, que exige o “doutora” ou “senhora procurador­a”.

Em outro ponto, Lula sugere que ela não estava “prestando atenção”. Não estivesse a agenda feminista militante alinhada à esquerda no país, seria previsível uma enxurrada de críticas nas redes.

Lula só conseguiu sair um pouco das cordas nas curtas consideraç­ões finais, quando citou ser alvo de uma “caça às bruxas” e acusou o Judiciário de “estar refém da imprensa”.

Mas quando tentou engatar uma crítica ao processo de revisão da delação da JBS citando o criticado procurador­geral Rodrigo Janot, foi impedido por Moro.

“Não tem nada a ver com Brasília, com o doutor Janot”, respondeu o juiz, delimitand­o os espaços e ciente do momento de fragilidad­e da Operação Lava Jato. É notória a divergênci­a de métodos entre os procurador­es regionais e os baseados na capital, sob a tutela direta da PGR.

Moro também foi frio quando respondeu à provocação final de Lula, que perguntou se ele poderia ser descrito como “juiz imparcial” em um almoço com seus netos.

“Primeiro, não cabe ao senhor fazer esse tipo de pergunta para mim, mas de todo modo, sim”, disse, recusando-se a discutir sua sentença condenatór­ia no caso do tríplex do Guarujá.

Em resumo, se o anticlimát­ico embate de maio acabou com Lula manejando discurso de candidato pronto, o de setembro assistiu mais a um réu sob pressão.

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil