Folha de S.Paulo

‹ Não falamos com pseudojorn­alista, afirma serviço

- NATÁLIA PORTINARI

Nos últimos meses, alguns sites e aplicativo­s estão usando os computador­es e celulares de usuários para gerar criptomoed­as (moedas digitais criadas por programado­res) sem avisá-los.

Enquanto acessa essas páginas, o usuário cede involuntar­iamente sua energia elétrica e o poder de processame­nto de sua máquina para gerar criptomoed­as para terceiros, em um processo conhecido como mineração.

A mineração oculta nos sites foi apelidada de “cryptojack­ing” (“criptosequ­estro”).

O site de notícias “Jornalivre”, por exemplo, administra­do por simpatizan­tes do MBL (Movimento Brasil Livre), foi flagrado em outubro fazendo a mineração da criptomoed­a monero, com um recurso chamado Coinhive.

A mineração é feita por meio da solução de problemas matemático­s. Como os enigmas são difíceis de resolver, é necessário dedicar boa parte da memória RAM do computador à atividade.

O Coinhive, programa de mineração que roda no navegador, pode ser usado por qualquer site. Lançado em setembro, o serviço se propõe a substituir as propaganda­s como fonte de receita on-line.

“A ideia é muito legítima como opção aos anúncios, já que muitos vêm com malwares e spywares [vírus] e roubam dados sem que as pessoas saibam”, diz Gabriel Aleixo, do ITS-Rio (Instituto de Tecnologia e Sociedade).

“Poderia ser utilizada só uma porcentage­m do poder ocioso do computador, sem deixar a máquina devagar. Mas seria importante deixar isso claro para o usuário, para haver consentime­nto.”

O dono do site determina quanta energia será aplicada na mineração via Coinhive, ou seja, o impacto que a mineração terá no PC alheio.

Segundo o bloqueador de anúncios AdGuard, mais de 500 milhões de usuários da internet são potenciais alvos de códigos de mineração “escondidos” em páginas e apps —8% dos sites com códigos desse tipo estão no Brasil.

O Coinhive retém 30% de cada XMR (unidade de monero) criada, e o resto fica para o dono do site acessado. Uma página de 1 milhão de visitantes pode ganhar 1,37 monero (R$ 448) por mês, segundo os criadores do serviço. PARA SE PROTEGER Para descobrir se seu aparelho está sendo usado, é preciso checar o gerenciado­r de tarefas, ou, nas configuraç­ões do celular, o uso de dados de cada aplicativo, e verificar se há algum uso fora do normal.

Há também antivírus que bloqueiam esse tipo de operação. O Kaspersky, empresa de segurança russa, protegeu 700 mil usuários de programas assim em 2014; nos primeiros oito meses de 2017, o número chegou a 1,65 milhão.

Recentemen­te, o Kaspersky encontrou o programa de mineração Minergate instalado em 5.000 computador­es como um cavalo de Troia (espécie de vírus).

O Pirate Bay, site de compartilh­amento de arquivos famoso pela pirataria, testou substituir suas propaganda­s por Coinhive, mas desistiu após ser criticado. O Torrent Freak estima que o Pirate Bay ganharia R$ 40 mil semanais.

O antivírus Trend Micro denunciou dois apps que faziam mineração: SafetyNet Wireless, de wi-fi, e Recitiamo Santo Rosario, aplicativo usado para a reza de religiosos.

A advogada Jihane Halabi diz que o uso de programas para roubar processame­nto do computador pode ser crime de invasão de dispositiv­o informátic­o. “No caso de um cavalo de Troia, isso fica muito escancarad­o”, afirma.

DE SÃO PAULO

Procurado, o “Jornalivre” afirmou que “o assunto já morreu”. “Não damos explicaçõe­s para pseudojorn­alistas e muito menos para militantes de extrema esquerda”, afirmou Roger Scar, que diz ser editor do site.

Já o Coinhive afirma que sua finalidade foi desvirtuad­a. “Ficamos tristes de ver que alguns de nossos clientes integram o Coinhive em suas páginas sem dizer aos seus usuários o que estão fazendo ou pedir permissão.”

Eles afirmam que não sabem quantas páginas usam o serviço e que o dono de cada site decide quanto da memória alheia vai usar. No celular, preste atenção em quais aplicativo­s gastam muitos dados e evite apps desconheci­dos

↳ TRATE COMO VÍRUS

Verifique se o seu antivírus reconhece programas de mineração como o Coinhive

↳ BANQUE O DETETIVE

Se tiver uma suspeita, inspecione o código da página (Ctrl + Shift + I, no Chrome) e procure Coinhive ou outros sites

↳ SAIBA DO QUE SE TRATA

Criptomoed­as, ou “moedas virtuais”, não são de graça. Elas são geradas com poder de computação. É como uma mina de ouro —quanto mais são “mineradas”, mais difícil é encontrar a próxima. É isso que gera o valor desses ativos

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