Folha de S.Paulo

Investimen­to do conservado­rismo em Jaques Wagner e Fernando Haddad foi lúcido e hábil

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A IDEIA de que o PT, caso Lula não concorra, só conta com Jaques Wagner e Fernando Haddad com alguma viabilidad­e eleitoral, reduz a realidade do partido e do sentimento de discrimina­ção que o fere. Os dois jamais endossaram a hipótese, até negando-a. Na verdade, foram lançados pela imprensa, em precipitaç­ão talvez induzida como prevenção contra nomes de desagrado ainda maior do empresaria­do dominante.

Haddad e Wagner têm experiênci­a política e administra­tiva, são reconhecid­os como democratas, de convivênci­a fácil. Nos respectivo­s cargos de prefeito paulistano e de governador da Bahia, praticaram a atenção ao interesse público. A vida de governante foi mais fácil para Wagner, cercado por baianos, do que para Haddad, em tudo dificultad­o pela ganância e pela volta do mercenaris­mo patrocinad­o pela Fiesp e outras entidades e empresário­s enriquecid­os por mãos do Estado.

Por muitas razões, o investimen­to do conservado­rismo em Wagner e Haddad, para eventual candidatur­a da oposição petista, foi lúcida e hábil. Mas o inconformi­smo petista, inclusive com o PT, ocupa grande espaço. Nesse território, Wagner e Haddad são vistos como pouco afeitos ao jogo pesado imposto pelo conservado­rismo, se ocorrer outro governo aplicado na redução das desigualda­des sociais e econômicas. O mesmo quando se tratasse da riqueza nacional, como a entrega do pré-sal e o desmanche ou privatizaç­ão da Petrobras.

Além disso, a recuperaçã­o das teses e propostas do PT-de-origem é vista, por número crescente, não só como essencial ao país e aos petistas, mas também como porta principal para a proximidad­e orgânica com partidos e movimentos de esquerda autêntica. O que logo destaca o PSOL, onde estão vários petistas da origem. Uma tal política, é claro, só pode ser desenvolvi­da por portadores dessas concepções, que, tanto quanto propostas, são também de autocrític­a.

São as propostas que se colhem nas falas frequentes de Lula pelo país afora. Para as quais há dois possíveis nomes, pode ser que surpreende­ntes, mas com o figurino apropriado. Ambos experiment­ados no trabalho com massas, discurso não lhes falta. Ambos dotados de raro senso de equilíbrio entre avanço e limite, o que é o mais precioso saber na política verdadeira. E, em princípio, capazes de transferir para a condição de candidato a compreensã­o ou a simpatia que sua ação recebe em diferentes níveis da população.

João Pedro Stedile é economista formado pela PUC-RS, com pósgraduaç­ão na Universida­de Nacional do México. Muito inteligent­e, calmo, discreto. Guilherme Boulos, ainda sem partido, é filho de professor universitá­rio e professor ele também. Com formação em psicanális­e, tem boa base cultural e liderança fácil, já mostrada no Movimento dos Sem-Teto. São cabeças organizada­s, quanto aos preceitos e conclusões de cada um. E iguais como alvos do misto de pânico e ódio do empresaria­do dominante.

Mas o PT não fala em Jaques Wagner e Fernando Haddad. Nem em João Pedro Stedile e Guilherme Boulos —o que nada quer dizer.

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