Folha de S.Paulo

Corredor era só sangue e corpo, diz brasileira

- ESTELITA HASS CARAZZAI DE WASHINGTON

DE SÃO PAULO

Pelo menos 17 pessoas foram mortas por um atirador que invadiu nesta quarta (14) uma escola de ensino médio em Parkland, Flórida, a 70 km ao norte de Miami, numa região que concentra migrantes brasileiro­s.

Outras pessoas estão feridas e foram internadas em hospitais, onde ainda passam por cirurgia. Pelo menos três delas estavam em situação crítica na noite de quarta.

O consulado do Brasil em Miami informou que brasileiro­s estudam na escola, mas nenhum está entre as vítimas. Eles estão bem e em segurança, disse o órgão em nota.

Um ex-aluno de 19 anos, Nikolas Cruz, foi preso como suspeito cerca de duas horas depois do início do tiroteio. Ele tinha um rifle AR-15 e fora expulso do colégio por questões disciplina­res.

Entre os 17 mortos há adultos e estudantes, segundo a polícia. A maioria das vítimas morreu na própria escola; duas foram socorridas ao hospital, mas não resistiram aos ferimentos.

“Uma estudante disse à minha filha que viu corpos por todo o lado e sangue por todo o lado”, afirmou à CNN Caesar Figueroa, pai de aluna.

Cerca de 3.000 alunos frequentam o colégio Marjory Stoneman Douglas. Parkland, com 31 mil habitantes, fica entre as cidades de Boca Raton e Fort Lauderdale, destino de migrantes brasileiro­s de todos os estratos sociais, 20 km continente adentro. A Flórida reúne a terceira maior comunidade brasileira nos EUA, de 250 mil pessoas.

O incidente ocorreu no horário de saída do colégio, pouco antes das 15h (18h de Brasília). O atirador foi detido na cidade vizinha de Coral Springs, onde se entregou.

“Começamos a olhar as suas redes sociais e há coisas muito, muito perturbado­ras”, afirmou o xerife Scott Israel sobre o atirador. Ele não deu detalhes sobre o conteúdo.

A escola ainda estava isolada no final da tarde. Imagens de televisão mostravam os estudantes saindo em fila, com as mãos sobre a cabeça, e ambulância­s no local. “É catastrófi­co. Realmente não há palavras”, afirmou o xerife.

A filha de Figueroa se refugiou em um armário com outros dez estudantes, depois que ouviu tiros e um vidro da sala de aula se quebrar, segundo contou seu pai à CNN.

A professora Melissa Falkoswki também se abrigou em um armário, com outros alunos, e disse que viu pelo menos três corpos na saída da escola. “A nossa inépcia em resolver esse problema é inaceitáve­l. A nossa sociedade falhou com essas pessoas hoje”, afirmou ela à CNN.

“Achei que fosse um treinament­o de incêndio”, contou Ryan Gott, 15. Segundo relatos, o atirador teria acionado o alarme para criar confusão. Parte dos estudantes se abrigou num supermerca­do em frente ao colégio, que realiza treinament­os para ataques a tiros e situações de emergência –um deles foi feito em janeiro.

O governador da Flórida, o republican­o Rick Scott, falou por telefone com o presidente Donald Trump. “Nenhuma criança, professor ou qualquer pessoa deveria se sentir insegura em uma escola americana”, disse Trump, que ofereceu ajuda federal.

O incidente mais recente do tipo nos EUA ocorreu há 22 dias em Benton, Kentucky. Dois estudantes morreram.

DE WASHINGTON

A única coisa que a estudante brasileira Melissa Camilo, 15, pode fazer ao ouvir os tiros foi correr em direção à parede e ficar em silêncio.

“A gente ficou bem quietinho para ele não escutar nada, não saber que tinha gente na nossa sala”, afirmou ela, em entrevista à Folha.

Ela é uma das alunas da escola Marjory Stoneman Douglas, e estudava numa sala do primeiro andar em frente ao local onde começou o ataque.

Depois, o atirador subiu ao segundo e ao terceiro piso, sempre atirando, segundo alunos e pais ouvidos pela reportagem. “Quando a gente saiu no corredor, era só sangue e corpo”, disse Camilo.

O colégio estava preparado para enfrentar uma situação do tipo: em janeiro, professore­s e alunos fizeram um treinament­o contra tiroteios.

A orientação era simples: fechar a porta da sala; correr na direção oposta, para evitar a visão do atirador; e se abrigar embaixo das mesas.

Em vídeo obtido pela Folha, é possível ouvir uma professora pedindo, repetidame­nte, em meio aos soluços de alunos: “Permaneçam calmos”. “Nós fizemos o que deveríamos fazer. Estamos bem”, dizia, já depois da saída do atirador.

Depois que os tiros cessaram, muitos alunos continuara­m em choque. A polícia precisou arrombar várias salas para resgatar os estudantes.

“Os policiais falaram: ‘Sigam essa linha e não olhem para trás’. Mas muita gente olhou. Eram só corpos”, afirmou a brasileira Fabiana Santos, 41, cuja filha, Kemily, 16, também estava na escola. “Ficou bolsa, carteira, chave do carro. Estamos em choque até agora”, disse Santos. (EHC)

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