Folha de S.Paulo

Informais já são 43% dos ocupados, um recorde

No terceiro trimestre deste ano, taxa de desemprego cai com entrada de trabalhado­res sem carteira assinada

- Anaïs Fernandes e Larissa Quintino Adrian oV izoni/Folhapress

A cada 10 brasileiro­s que estavam trabalhand­o no terceiro trimestre deste ano, cerca de 4 atuavam na informalid­ade, apontam dados da Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) Contínua, do IBGE.

De junho a setembro, o país registrou 92,6 milhões de pessoas ocupadas. Dessas, quase 43% (39,7 milhões de trabalhado­res) não tinham carteira assinada. Entram no grupo empregados dos setores público e privado sem registro, quem atua por conta própria sem CNPJ, domésticos sem carteira e quem trabalha em família.

É o maior percentual trimestral registrado pela Pnad desde que começou a separar a atividade por conta própria com e sem CNPJ, no final de 2015.

Também no terceiro trimestre, a taxa de desemprego no país ficou em 11,9%, meio ponto percentual abaixo da registrada no mesmo período de 2017. Porém o saldo de vagas formais caiu.

Segundo especialis­tas, o dado não é necessaria­mente ruim, já que a informalid­ade insere o trabalhado­r no mercado, de onde é mais fácil migrar para ocupações com carteira.

A cada 10 brasileiro­s que estavam trabalhand­o no terceiro trimestre deste ano, cerca de 4 atuavam na informalid­ade, apontam os dados da mais recente Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios) Contínua, do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatístic­a).

Entre junho e setembro, o país registrou 92,6 milhões de pessoas ocupadas.

Dessas, quase 43%, ou 39,7 milhões de pessoas, não tinham carteira assinada, somando empregados do setor privado e público sem registro, trabalhado­res por conta própria sem CNPJ, trabalhado­res doméstico sem carteira e quem trabalha em família.

Esse é o maior percentual trimestral registrado pela Pnad desde que o levantamen­to começou a separar osconta própria com e sem CNPJ,no fim de 2015.

No terceiro trimestre deste ano, a taxa de desemprego no país ficou em 11,9%, 0,5 ponto percentual abaixo da registrada no mesmo período do ano passado.

O alívio veio com o avanço de 1,5% na população ocupada, resultado da entrada de 1,3 milhão de pessoas no mercado de trabalho —especialme­nte na informalid­ade.

Thiago Xavier, analista da consultori­a Tendências, observa que, desse contingent­e, 601 mil trabalhava­m no setor privado sem carteira assinada e outros 585 mil atuavam por conta própria —sendo 236 mil sem registro.

“A rota de entrada é a informalid­ade porque, na comparação anual, o trabalho com carteira [no setor privado] ainda registrou perda de 328 mil pessoas”, afirma.

Desemprega­da há sete meses, Cássia Lins Barbosa Vila Real, 31, tem se virado com trabalhos por conta própria de maquiadora para pagar as contas. Ela afirma que o seu rendimento caiu 30% desde que foi demitida, em abril.

Ela tem conseguido conciliar os trabalhos eventuais com a educação do filho, de uma ano e três meses, mas procura uma oportunida­de de voltar para o mercado formal.

“Se eu achar algo por meio período, melhor ainda. Só trabalhand­o por conta própria a renda é muito baixa”, diz.

Essa não foi a primeira vez que Cássia teve que se reinventar.

Antes de entrar no mercado de beleza, ela trabalhou oito anos na gigante IBM, na parte de atendiment­o e também com vendas.

Em 2014, a empresa fez cortes e, até ela se recolocar, dessa vez na nova profissão, foram dois anos sem trabalho.

Segundo a maquiadora, além da falta de carteira assinada, os custos do trabalho por conta própria são o que mais dificulta a renda.

“Bancar produtos e transporte e não ter o trabalho valorizado, com o pessoal sempre querendo pagar menos, desmotiva, mas vou nessa até conseguir algo formal”, afirma ela, que cobra R$ 150 por cada maquiagem feita.

Não é só a renda do informal que não avança. O rendimento médio real habitualme­nte recebido pelos ocupados (R$ 2.222) e a massa salarial (R$ 200,7 bilhões) —soma dos os rendimento­s brutos recebidos em todos os trabalhado­s pelos ocupados— mantiveram-se estáveis no terceiro trimestre, afirma Cimar Azeredo, coordenado­r de Traba- lho e Rendimento do IBGE.

“Isso demonstra que as vagas que foram criadas são de baixo impacto salarial”, diz.

O fenômeno monetário também pode ser observado no Caged (Cadastro de Empregados e Desemprega­dos do Ministério do Trabalho), que capta os números do mercado formal brasileiro.

Em setembro, o saldo de vagas foi o melhor para o mês em cinco anos, com 137.336 postos positivos entre admitidos e desligados.

Apesar disso, a média de salário par aos trabalhado­res admitidos foi a menor dos últimos dez meses: R $1.516,89.

Segundo Clemente Granz Lucio, diretor técnico do Dieese (Departamen­to Intersindi­cal de Estatístic­a e Estudos Socioeconô­micos), há várias possíveis causas para o fenômeno: o acumulado da inflação, a alta rotativida­de do mercado, o perfil das vagas que estão contratand­o —que são mais operaciona­is no setor de serviços— e a precarizaç­ão da mão de obra, com alto número de informais.

“O repique da inflação influencia nos salários de admis- são. E as funções que mais contratam, que são do setor de serviços, oferecem até 1,5 salário mínimo [R$ 1.431]. Tudo isso ajuda a puxar o salário médio para baixo.”

O setor de serviços, mencionado por Lucio, foi responsáve­l por 44,3% das contrataçõ­es em setembro, fechando com um saldo de 60.961 no período, segundo o Caged.

Maria Andréia Lameiras, técnica de planejamen­to e pesquisa do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), diz que a queda no salário médio de entrada não é necessaria­mente ruim.

“Um salário alto não significa que o mercado está bombando. Às vezes, ele está muito alto porque tem só um setor que paga mais contratand­o”, afirma.

Segundo ela, o dado do Caged é positivo porque demonstra que o mercado está trazendo de volta uma população com qualificaç­ão mais baixa, que já estava havia muito tempo desemprega­da.

Os especialis­tas afirmam que um caminho possível seria que, após retornar ao mercado pela informalid­ade, o trabalhado­r migrasse para um emprego com carteira.

Foi o caso do motorista Nivaldo Constantin­o, 46, que voltou à formalidad­e após um período sem carteira.

Ele perdeu o emprego como motorista de uma empresa em junho deste ano e passou a utilizar sua moto para fazer entregas.

No mês passado, a mesma empresa que o demitiu ofereceu um novo emprego, dessa vez como motorista de motociclet­a.

“A necessidad­e me abriu uma nova área de trabalho, e a partir disso pude voltar. Estou feliz, com carteira assinada e recebendo praticamen­te a mesma coisa que antes”, diz Nivaldo.

Há ainda quem tenha feito do trabalho por conta própria uma nova profissão.

O mestre de obras autônomo Marcelo de Almeida, 41, foi exonerado da Polícia Militar de São Paulo há cinco anos e viu na necessidad­e a oportunida­de para iniciar uma nova carreira.

Ele afirma que desde os 13 anos trabalhava com construção. Deixou as obras para entrar na polícia e, depois de 16 anos, precisou voltar.

“Comecei a pegar algumas obras e estou nessa há cinco anos. Não penso em trabalhar com outra coisa.”

Apesar de ter tanto tempo trabalhand­o como autônomo, Almeida não pretende abrir uma empresa por causa dos altos custos e da burocracia.

“Tenho um contador, pago direitinho o pessoal que trabalha pra mim, mas não tenho como ter uma empresa e assinar carteira. A condição que tenho hoje está boa”, diz.

“Dados mostram que estamos trazendo de volta para o mercado de trabalho uma população de qualificaç­ão mais baixa que já estava há muito tempo desemprega­da Maria Andréia Lameiras técnica de planejamen­to e pesquisa do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada)

 ?? Fotos Karime Xavier/Folhapress ?? Joelma no Pateo do Collegio, no centro de SP; nas ruas há um mês, diz sofrer ‘por amor e outras coisas’
Fotos Karime Xavier/Folhapress Joelma no Pateo do Collegio, no centro de SP; nas ruas há um mês, diz sofrer ‘por amor e outras coisas’
 ??  ??
 ??  ?? A maquiadora Cássia Lins Barbosa Vila Real ,3 1, que tenta uma vaga formal para trabalhar em meio período
A maquiadora Cássia Lins Barbosa Vila Real ,3 1, que tenta uma vaga formal para trabalhar em meio período

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil