Folha de S.Paulo

Crítico transita de inquieto a polêmico em nova coletânea

Antologia de ensaios reúne inéditos de cinco livros de Antonio Carlos Secchin

- Leonardo Gandolfi

CRÍTICA Percursos da Poesia Brasileira: Do Século 18 ao 21 ***** Antonio Carlos Secchin. Editora Autêntica / Editora UFMG, R$ 59,80 (368 págs.).

Acaba de ser publicada uma antologia de ensaios do poeta e professor Antonio Carlos Secchin que reúne textos escolhidos de cinco livros seus editados entre 1996 e 2014, além de alguns inéditos.

Se no título “percursos” aparece no plural, na nota que abre o livro lemos que se trata da “‘leitura seletiva’ da trajetória da nossa lírica”.

O livro não coloca para si propriamen­te a tarefa de escrever uma história da poesia, mas o subtítulo e a disposição em ordem cronológic­a dos autores estudados sugerem certo caráter historicis­ta.

Desta forma, na seleção de Secchin, vemos o desenrolar de alguns desses momentos fundamenta­is.

Desde Tomás Antonio Gonzaga, passando por uma sequência de textos dedicados aos românticos, entre outros, até desaguar no tempo contemporâ­neo com a leitura da canção “As Vitrines”, de Chico Buarque.

O percurso em que o crítico aborda o romantismo é inquietant­e, sobretudo quando escolhe um tema e percorre diversas obras no encalço dele. Tal busca não se contenta com nomes canônicos, apresentan­do outros autores cujos livros foram editados apenas no século 19.

Destaque para o interessan­te Augusto Emílio Zaluar (1826-1882), poeta luso-brasileiro literalmen­te sem lugar por “vincular-se a dois países e, talvez por isso, estar excluído do cânone de ambos”.

Bem que Secchin poderia nos brindar com uma edição no século 21 da poesia de Zaluar, assim como já fez com a obra de Mário Pederneira­s (1867-1915), recuperada por ele em livro de 2004.

Aliás, Pederneira­s também está presente no panorama. O poeta seria o “primeiro divulgador” do verso livre (1906) que, para o crítico, no caso, mais do que livre, seria polimétric­o, quer dizer, combinação irregular de versos metrificad­os.

É também nessa direção que ele lê a poesia de Carlos Drummond de Andrade (1902-1987). Do momento modernista até 1951, o mineiro também faria largo uso do verso polimétric­o, deslocando-se “progressiv­amente na direção da regularida­de métrica”.

Daí em diante se percebe que um dos caminhos não declarado do livro busca reavaliar o protagonis­mo do Modernismo de 22, a partir da crítica a tópicos como verso livre e coloquiali­smo.

Em artigo sobre Vinicius de Moraes, o crítico afirma: “a hegemonia da versão paulistana do movimento acabou minimizand­o, quando não excluindo, a consideraç­ão das demais vertentes da literatura modernista”. Entre as exclusões estão obras de “linhagem simbolista da modernidad­e”, como a de Cecília Meireles (1901-1964).

Relativiza­do o protagonis­mo de um poeta como Oswald de Andrade (1890-1954), resta a ele aparecer de soslaio, no ensaio sobre João Cabral de Melo Neto (1920-1999), como autor de um “rigor destrutivi­sta” e “incapaz ou indesejoso de desenvolve­r outro gesto que não fosse o da irrisão e da paródia”.

Trata-se de uma avaliação polêmica. O que, aliás, nos faz lembrar que a escrita da história é embate entre pontos de vista. E cada um desses olhares, ao falar do objeto escolhido, falará também muito de si próprio, isto é, de seus juízos e valores.

 ?? Arquivo Última Hora ?? A poeta Cecília Meireles (1901-1964), em foto dos anos 1960
Arquivo Última Hora A poeta Cecília Meireles (1901-1964), em foto dos anos 1960

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