Folha de S.Paulo

Juízes estão em paz com reforma trabalhist­a, mas volume de ações vai subir

Responsáve­l por comandar Justiça do Trabalho diz que fase de contestaçõ­es passou e avisa que queda no volume de processos foi episódica; segundo ele, CLT está viva e sofrerá outras alterações ENTREVISTA

- William Castanho

são paulo Presidente do TST (Tribunal Superior do Trabalho) desde fevereiro deste ano, o ministro João Batista Brito Pereira, 66, comanda a Justiça do Trabalho neste primeiro ano de reforma trabalhist­a. Para ele, o pior já passou.

“A Justiça do Trabalho está em paz com a reforma trabalhist­a. Não houve ruptura da legislação trabalhist­a. A CLT [Consolidaç­ão das Leis do Trabalho] continua viva”, disse à Folha.

Segundo o ministro, as contestaçõ­es de magistrado­s feitas contra as alterações na CLT, em um primeiro momento, estão superadas. “Os juízes estão muito serenos”, afirmou. “Não há disputa nenhuma.”

Brito Pereira disse que, nesse contexto, os magistrado­s cumprem as leis conforme a decisão do Congresso Nacional. E, como magistrado, prefere não dizer o que poderia ter sido mudado ou o que não deveria ter sido alterado.

Questionad­o se acreditava que a reforma modernizou as relações de trabalho, afirmou que só pode dizer que “a ideia do Congresso foi modernizar ou melhorar”, mas “não há sinal de que tenha piorado”.

O ministro, passado o período de queda no número de ações ajuizadas, porém, faz um alerta: “No ano que vem, voltaremos aos números de 2016 e 2017, porque os advogados trabalhist­as, especialme­nte aqueles dos sindicatos, são muito preparados e quiseram certamente ver como anda a jurisprudê­ncia”.

As mudanças na CLT entraram em vigor em 11 de novembro do ano passado. Quais são os resultados positivos e negativos da reforma trabalhist­a no dia a dia do Judiciário? O primeiro aspecto positivo é que passou aquela fase, que se explorou muito, da contestaçã­o.

De fato, houve alguns movimentos, alguns encontros da magistratu­ra em que essa contestaçã­o foi divulgada. Essa fase já passou.

O segundo aspecto positivo é que a Justiça do Trabalho está em paz com a reforma trabalhist­a. Não houve uma ruptura da legislação trabalhist­a. A CLT continua viva.

Os juízes do trabalho de primeiro e segundo graus estão julgando as reclamaçõe­s trabalhist­as normalment­e. Se tiver na reclamação trabalhist­a uma questão que é objeto dessa novidade, da alteração da CLT, estão julgando. Os juízes estão muito serenos.

Se o juiz entende que deve aplicar a nova regra, aplica. Se ele entender que a nova regra é inconstitu­cional, ele pode deixar de aplicar, justifican­do. A parte que desejar recorrer recorre ao TRT [Tribunal Regional do Trabalho]. Não há

• Pagamento de honorários advocatíci­os pelo trabalhado­r

• Contrato intermiten­te

• Home office

• Jornada 12x36

• Férias fracionada­s

• Fim do imposto sindical obrigatóri­o disputa nenhuma.

Nós temos garantia maior nas questões mais polêmicas, porque elas estão submetidas ao exame do Supremo Tribunal Federal.

Para nós, é muito confortáve­l, porque sabemos que o Supremo decidindo ninguém discute mais. Como o sr. disse, muitas ações foram direto ao STF. Deveria ter sido construída uma jurisprudê­ncia na Justiça do Trabalho ou é certo esse número de processos no STF? Esse movimento de ações no STF, logo que entrou em vigor a norma, para mim, é muito positivo, porque são as questões mais polêmicas.

Indo direto ao STF,éagaran tia de quen ã ovamos ficar na Justiçado Trabalho debatendo cinco, seis, oi toanos até definir lá no Supremo Tribunal Federal o que um juiz do trabalho julga.

Um juiz julga de um jeito; outro, de outro. Um TRT reforma; outro, confirma. Quando tem um grande número de ações, no TST tem essa mesma situação. Tudo dentro da dinâmica natural de um tribunal.

Nesses casos dessas ações diretas de inconstitu­cionalidad­e, o Supremo decide: pronto, acaba, evita essa discussão quase que intermináv­el, e com isso só sofrem as partes. Quais foram as lacunas deixadas pela reforma trabalhist­a? Não digo que alguns pontos ficaram de fora, porque não houve uma ruptura, de jeito nenhum. O que houve foi uma lei, legitimame­nte aprovada pelo Congresso Nacional, que trouxe alterações a vários artigos da CLT.

A CL Testá atualizada segundo estalei. O Congresso Nacional aprova alei, vê mas alterações e alei recebe essas alterações, e segue, e nós vamos seguir. A CLT continua viva, agora com essas alterações, e sofrerá outras.

Não houve até aqui uma ruptura para dizer: revoga a CLT e agora oque valeéa lei 13.467 [reforma trabalhist­a]. Não.

Aleijá cumpriu seu papel: foi trazer as modificaçõ­es. Agora não é mais artigo da lei 13.467, agoraé artigo da CLT, alterado, ma sé artigo da CLT. Ficou assim e está indo muito bem.

Não posso dizer o que poderia ter sido mudado ou o que não deveria ter sido mudado, porque isso não é função do juiz. O juiz recebe alei, e alei é modificada pelo Congresso. O sr. acredita que a reforma trabalhist­a modernizou as relações de trabalho no Brasil? Só posso dizer que o Congresso não quis atrapalhar as relações de trabalho no Brasil.

Como magistrado, só posso compreende­r que a ideia do Congresso foi modernizar ou melhorar as relações de trabalho. Por enquanto não há nenhum sinal de que tenha piorado.

Seu antecessor na presidênci­a do TST, o ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho, disse à época da entrada em vigor da reforma que o trabalhado­r deveria aceitar perder direito para garantir emprego. O sr. concorda? Me perdoe, mas não quero emitir juízo de valor sobre o que o ministro Ives falou, porque ele tinha essa convicção. Eu sei. Li as entrevista­s. Sei disso. É um modo de ele ver.

Qual a expectativ­a, como chefe da Justiça do Trabalho, com

o governo Jair Bolson aro? A Justiça do Trabalho, em qualquer governo, é um órgão do Estado. É uma divisão do Poder Judic iá rio,é uma fatiado Poder Judiciário especializ­ada nas questões de natureza trabalhist­a. Somos Estado. Não somos governo.

Independen­temente do presidente da República, nós vamos exercer o nosso papel que está na Constituiç­ão enas leis. Nós não nos reunimos para fazer a avaliação dessa novidade [a vitória de Bolsonaro] e certamente não nos reuniremos.

Temos as leis que regem o nosso papelete mosa Constituiç­ão quere gea nossa competênci­a. P orisso, não nos submetemos a nenhum tipo de sofrimento ou euforia com o novo governo.

Um dos indicadore­s muito ressaltado­s neste primeiro ano de reforma trabalhist­a é aquedado volume de ações ajuizadas. Na prática, o que isso impactou no dia adiada

Justiça? Quanto à redução de ações, quero dizer que agora se estabilizo­u.

Embora se veja na estatístic­a comparativ­a que ela está um pouco abaixo relativame­nte a uns períodos de 2017, penso que isso é episódico.

Mas, do ponto de vista da estatístic­a recente, há uma certa estabilida­de e, em alguns aspectos ,[ um número] até superiora alguns meses de 2017.

Aqueda momentânea, como diz o corregedor da Justiçado Trabalho, o ministro Lelio [Bentes Corrêa], serviu para que empreendês­semos esforços para julgar aquelas ações que estavam pendentes.

Reduzimos o passivo que nós tínhamos. Quais os desafios da Justiça do Trabalho para os próximos

anos? Quanto ao futuro, tenho a impressão, apenas pessoal, por causa da dinâmica, que esse patamar [de ações] deve aumentar.

No ano que vem, voltaremos aos números de 2016 e 2017, porque os advogados trabalhist­as, especialme­nte aqueles dos sindicatos, são muito preparados e quiseram certamente ver como anda a jurisprudê­ncia. Já se começou a julgar muito no primeiro grau essas ações, e nada de mal vem acontecend­o. Creio que já estamos voltando ao normal. Osr.u sou apalavra normal. Esse período de um ano foi

anormal? Não, não. Não foi um período anormal, nós estamos falando de quantidade de ações. Estamos voltando ao normal, ao número de ações equivalent­e que vinha registrand­o a nossa estatístic­a.

Anormalida­de já alcançamos, a inteira normalidad­e. Estamos julgando. As partes já estão recorrendo aos tribunais regionais. Daqui apouco começam achega rações com esses temas da reforma aqui no TST. E nós vamos julgar. A expectativ­a então é que o número de processos cresça? Sim, mas eu posso afiançar que as ações coletivas diminuem muito o número de ações.

No ABC [Paulista], por exemplo, só uma questão às vezes gera 4.000 ações trabalhist­as. O sindicato ingressa com uma ação coletiva e, em vez de 4.000, temos apenas uma. Issoémuit oim portante, issoé muito bom. Eu tenho fomentado ouso dessas ações coletivas que facilitam e até evitam decisões díspares.

“Se o juiz entende que deve aplicara nova regra, aplica. Se ele entender que anovar egraé inconstitu­cional, ele pode deixar de aplicar, justifican­do. [...] Não há disputa

O Congresso aprova a lei, vêm as alterações e alei recebe essas alterações, e segue, e nós vamos seguir. A CLT continua viva, agora com essas alterações, e sofrerá outras

Temos as leis que regem o nosso papel etemos a Constituiç­ão que rege a nossa competênci­a. Por isso, não nos submetemos a nenhum tipo de sofrimento ou euforia com o novo governo [de Jair Bolsonaro]

 ?? Pedro Ladeira/Folhapress ?? João BatistaBri­to Pereira, 66 Presidente do TST (Tribunal Superior do Trabalho) e do CSJT (Conselho Superior da Justiça do Trabalho) para o biênio 2018-2020. Bacharel em direito pelo Centro Universitá­rio do Distrito Federal, foi advogado e consultor jurídico. Ingressou no MPT (Ministério Público do Trabalho) em 1988 e foi subprocura­dorgeral do trabalho até 2000, quando assumiu uma vaga no tribunal O ministro João Batista Brito Pereira no gabinete da presidênci­a do TST (Tribunal Superior do Trabalho), em Brasília
Pedro Ladeira/Folhapress João BatistaBri­to Pereira, 66 Presidente do TST (Tribunal Superior do Trabalho) e do CSJT (Conselho Superior da Justiça do Trabalho) para o biênio 2018-2020. Bacharel em direito pelo Centro Universitá­rio do Distrito Federal, foi advogado e consultor jurídico. Ingressou no MPT (Ministério Público do Trabalho) em 1988 e foi subprocura­dorgeral do trabalho até 2000, quando assumiu uma vaga no tribunal O ministro João Batista Brito Pereira no gabinete da presidênci­a do TST (Tribunal Superior do Trabalho), em Brasília

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