Folha de S.Paulo

Área com registro de extinção dos dinos é aberta no Nordeste

Registro do impacto foi identifica­do por geólogo nos anos 1990 e é o único, até agora, no Brasil

- Reinaldo José Lopes Fotos Gabriel Cabral/Folhapress

O único lugar do Brasil onde cientistas conseguira­m identifica­r com clareza as marcas da catástrofe que vitimou os dinossauro­s há 66 milhões de anos agora está aberto à visitação para estudantes e professore­s universitá­rios.

Chamado oficialmen­te de Geossítio K-Pg Mina Poty, o local fica em Paulista (PE), perto de Olinda. A área fazia parte das lavras de mineração exploradas pela empresa Votorantim Cimentos quando a assinatura da confusão geológica causada pelo impacto de um meteorito foi identifica­da ali no início dos anos 1990 pelo geólogo Gilberto Albertão, que na época fazia mestrado na Universida­de Federal de Ouro Preto sob orientação de Paulo Martins.

Embora as atividades mineradora­s (retirada de argila) continuem nas vizinhança­s, a empresa, em parceria com a UFPE (Universida­de Federal de Pernambuco), decidiu transforma­r cerca de seis hectares da antiga lavra na área protegida do geossítio. A sigla “K-Pg” se refere à transição entre o Cretáceo (última fase da Era dos Dinossauro­s) e o Paleógeno, como é conhecida a fase seguinte da história geológica da Terra na qual os mamíferos tomam o lugar dos dinos como principais vertebrado­s terrestres do planeta.

A hipótese mais aceita para explicar o sumiço dos dinossauro­s e de outras espécies no fim do Cretáceo é o impacto de um meteorito de uns 15 km de diâmetro na península do Yucatán, no México.

Com energia comparável à de 10 bilhões de bombas atômicas de Hiroshima, a pancada causou tsunamis, incêndios e uma bagunça atmosféric­a quase inimagináv­el. E deixou marcas nas rochas do planeta, como uma fina camada de irídio (elemento químico mais comum no espaço do que na Terra) e microesfér­ulas (grãos de vidro microscópi­cos produzidos pelo impacto).

O irídio e as microesfér­ulas, não podem ser observados a olho nu, mas os visitantes poderão, mesmo assim, ter uma ideia clara da violência envolvida nessa transição crucial da história geológica do planeta, diz Albertão, que hoje trabalha na Petrobras.

O elemento-chave para isso é o chamado tsunamito, um tipo de rocha que, como o nome diz, foi produzido pela ação devastador­a dos tsunamis. “É algo que uma pessoa leiga é capaz de perceber”, diz. O tsunamito ali é caracteriz­ado por grãos grossos de sedimento —sinal da força da água, carregando pedaços grandes — que misturam elementos terrestres, marinhos de águas rasas e de águas profundas, reunindo num só pacote coisas tão díspares quanto madeira fossilizad­a e dentes de tubarão. “O padrão é completame­nte distinto do que a gente vê na deposição normal de sedimentos.”

De um lado, a relativa proximidad­e do litoral pernambuca­no com a zona de impacto direto do meteorito contribuiu para que os indícios da catástrofe ficassem preservado­s por lá. Em outros lugares do Brasil, os processos de deposição de sedimentos no fim do Cretáceo também não eram favoráveis à sobrevivên­cia de evidências da colisão.

Por outro lado, como muitas áreas do país ainda não foram bem exploradas pelos geólogos, não se pode descartar que alguma também tenha sinais da ação do bólido. Na América do Sul, só foram identifica­dos sedimentos similares em outros dois lugares, na Argentina e na Colômbia.

A área também tem se revelado importante para o estudo de vertebrado­s fósseis de origem marinha. Cientistas da UFPE, como a paleontólo­ga Alcina Barreto, têm estudado ali restos de mosassauro­s —grandes répteis marinhos que lembram orcas — crocodilos, tartarugas e tubarões.

Exposições no local explicarão em detalhes a importânci­a das descoberta­s, e o site da Votorantim também abrigará informaçõe­s gerais e estudos científico­s produzidos sobre a região.

Instituiçõ­es de ensino interessad­as em visitar o local podem requisitar informaçõe­s pelo e-mail geossitio.poty@ vcimentos.com.

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Vista aérea do geossítio K-Pg Mina Poty, em Paulista (PE); área fazia parte das lavras de mineração exploradas pela Votorantim Cimentos
 ??  ?? Parede tem divisão entre rochas do Cretáceo, última fase da Era dos Dinossauro­s, na parte de baixo, e o Paleógeno, acima Pesquisado­res e imprensa visitam o geossítio
Parede tem divisão entre rochas do Cretáceo, última fase da Era dos Dinossauro­s, na parte de baixo, e o Paleógeno, acima Pesquisado­res e imprensa visitam o geossítio
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