O Estado de S. Paulo

MST migra das terras para prédios

Perfil das ações do grupo mudou nos últimos 20 anos; foco agora é organizar atos em cidades e estradas para fazer oposição a Temer

- José Maria Tomazela Pablo Pereira

Em 1997, auge da pressão fundiária, os sem-terra promoveram 502 ocupações. No ano passado, foram 83. O perfil das ações também mudou: invasões de terra passaram a dar lugar às de prédios públicos.

O Movimento dos Sem Terra (MST) mudou o foco de sua atuação e, da explosão de invasões de propriedad­es rurais, no auge da pressão fundiária, nos anos 1990, passou a concentrar suas ações em mobilizaçõ­es em áreas urbanas, com, por exemplo, ocupações de prédios públicos. A estratégia agora é buscar apoio da população para bandeiras que, na avaliação dos líderes, têm apelo na opinião pública, como o combate ao desemprego e à corrupção, a oposição à política agrária do governo Michel Temer e as críticas às reformas trabalhist­a e da Previdênci­a.

O número de invasões de propriedad­es rurais caiu 83% se comparado com o registrado há 20 anos. Em 1997, foram 502 ocupações, ante 83 no ano passado, segundo dados do Instituto Nacional de Colonizaçã­o e Reforma Agrária (Incra) e da Comissão Pastoral da Terra (CPT).

A tomada de prédios públicos – como as recentes ocupações do Ministério da Fazenda, e das sedes da Cemig e do Incra –, pedágios, estradas e ferrovias subiu de 87 ações no ano passado, entre janeiro e outubro, para 126 neste ano, no mesmo período, como forma de pressionar pelas “novas” pautas do MST e para se opor à Lei 13.465/2017 – apresentad­a pelo governo Temer ao Congresso como a Medida Provisória 759/2016 – que trata do Programa Nacional de Regulariza­ção Fundiária.

O dirigente nacional do MST Alexandre Conceição afirmou que o aumento no número de ocupações de prédios públicos, marchas e bloqueios de rodovias se deu em razão dos contingenc­iamentos de verbas para a reforma agrária e da pauta econômica do atual governo.

“Já vínhamos sofrendo cortes desde 2015, no governo Dilma (Rousseff), ano em que ela não assentou ninguém. Em 2016, com Temer, além de não assentar, ele cortou as políticas públicas que davam respaldo aos assentados e reduziu drasticame­nte o orçamento da reforma agrária”, disse Conceição. “Junto a isso, aconteceu o desemprego de quase 14 milhões de pessoas. Daqui para frente (o número de manifestaç­ões) só vai aumentar”, afirmou o dirigente. “A crise e o desemprego provocam um aumento na procura pelo movimento”, acrescento­u Kelli Mafort, uma das coordenado­ras do MST em São Paulo.

Nesse cenário, marchas políticas, como as de Curitiba, durante os depoimento­s do expresiden­te Luiz Inácio Lula da Silva, réu na Lava Jato, em maio e setembro deste ano, e protestos contra corrupção, por exemplo, foram de 72 (2016) para 139 (2017). O total de atividades do movimento subiu de 235 (2016) para 337 (2017). As invasões de terras no ano, porém, caíram de 76 para 72, de janeiro a outubro.

O MST invadiu fazendas de suspeitos de envolvimen­to em esquemas de corrupção como o ex-presidente da Confederaç­ão Brasileira de Futebol (CBF) Ricardo Teixeira, o empresário Eike Batista, em Minas, além de área em Duartina, em São Paulo, do coronel da PM João Baptista Lima Filho, ex-assessor de Temer. Depois dessas invasões, o MST comemorou em vídeos de propaganda na internet.

Segundo João Paulo Rodrigues, também dirigente nacional do MST, a mudança de estratégia e atuação do movimento se deve ao “impacto na renda no campo” que, na sua avaliação, será provocado pela reforma da Previdênci­a. Para o líder, a lei que dispõe sobre a regulariza­ção fundiária proposta pelo atual governo, anunciada em julho deste ano, “vai permitir a privatizaç­ão e internacio­nalização das terras no País”.

Lula. Passado o período de encolhimen­to de ações nos governos petistas, o MST deve se contrapor à gestão Temer. “Agora temos de recompor a base de apoio à reforma agrária”, disse Rodrigues. Apesar desse engajament­o contra o peemedebis­ta e das ações em defesa de Lula, Rodrigues argumentou que houve distância do PT durante os 13 anos nos quais o partido esteve no poder. Segundo ele, o MST se beneficiou de políticas sociais petistas, como programas de acesso à habitação, Bolsa Família, ProUni e Fies. “Mas o MST não participou (dos governos petistas)”, disse.

“Você sabe quantas vezes o Lula recebeu o MST?”, emendou: “Três vezes, juntando os dois mandatos”. E Dilma? “No primeiro mandato, nenhuma vez. Fomos recebidos duas vezes, no segundo mandato”, lembrou, quando a presidente cassada estava à beira do processo do impeachmen­t. A média de invasões nos governos petistas foi bem abaixo da média das duas últimas décadas (315 por ano). No governo Lula, foram 190 ocupações por ano, em média, e 114,6 por ano, com Dilma.

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ALEX SILVA / ESTADÃO – 9/5/2017 1. 1. MST faz manifestaç­ão no Ministério da Fazenda 2. Grupo participa de ato em favor do ex-presidente Lula 3. Sem-terra ocupam prédio do Incra em Brasília
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WERTHER SANTANA / ESTADÃO – 9/5/2017 2.
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NILTON FUKUDA / ESTADÃO – 22/5/2017 3.

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