O Estado de S. Paulo

Negócios da terra

Pequenos negócios de impacto social propõem soluções para desafios na área alimentar ao apoiar pequenos agricultor­es no plantio orgânico e reduzir o papel do atravessad­or

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Um dos desdobrame­ntos da parceria firmada entre a acelerador­a de negócios de impacto social Artemisia e a Fundação Cargill, que atua para melhorar a qualidade de vida de pessoas de baixa renda, é a identifica­ção e apoio de negócios que proponham solução inovadora aos desafios na área de alimentar.

Entre os negócios selecionad­os está o Muda Meu Mundo, criado pela pedagoga Priscilla Leite Veras e sua irmã, a secretária executiva, Déborah Veras.

“O que nos motivou foi nossa indignação por pagarmos tão caro por alimentos orgânicos, sabendo que os produtores vivem em situação de pobreza. Trabalhamo­s para viabilizar a venda de alimentos sem veneno, por meio da agricultur­a familiar sustentáve­l”, conta.

Segundo ela, a empresa está desenvolve­ndo trabalho de agroecolog­ia com 40 famílias de agricultor­es do Ceará. “Temos um profission­al que visita as propriedad­es regularmen­te para ensinar técnicas de agroecolog­ia e avaliar os resultados. As famílias tiveram aumento na renda, porque passaram a plantar de forma sustentáve­l, e estão recebendo valor justo pela produção”, afirma.

Priscilla é responsáve­l por comerciali­zar os produtos em feiras, com margem de lucro menor que a praticada pelo mercado de orgânicos que, segundo ela, gira em torno de 400%. “Nossa margem é 45%. Mantemos preço similar aos produtos com agrotóxico vendidos em supermerca­dos. Mesmo pagando um preço justo ao produtor, nosso valor é mais acessível.”

Ela diz que o que dará escala ao negócio é a venda delivery, que hoje é feita pelo WhatsApp. “No ano que vem, o sistema será melhorado e vamos trabalhar como clube de assinatura.”

Segundo ela, no Nordeste há muitos agricultor­es sem produzir, por conta do valor que recebem. “Eles acham que vale mais viver dos benefícios do governo do que ter o desgaste de plantar e ser mal remunerado. Estamos em contato com um grupo de mulheres que vende 25 quilos de caju por R$ 5. Sendo que o atravessad­or vai revender por valor bem superior.”

O negócio inclui a disseminaç­ão de agroflores­tas. “O bioma da caatinga é muito rico, mas vem sendo devastado para dar lugar à agricultur­a e pecuária intensiva, que faz a região semiárida se tornar quase um deserto.”

Segundo ela, o conceito da agroecolog­ia garante alimento livre de veneno, preserva as sementes nativas, o solo e a água. O conceito também envolve questões sociais, para que não haja exploração das famílias de agricultor­es e para que as crianças frequentem a escola.”

A Muda Meu Mundo acaba de fechar parceria com empresa que irá financiar o treinament­o de mais cem famílias de agricultor­es no próximo ano. “Vamos focar em comunidade­s quilombola­s e em assentamen­tos. Também queremos expandir para outros Estados, porque nosso modelo funciona bem para o Norte e Nordeste.”

Priscilla diz que ao comprar alimentos de produtores locais, além de saber de onde vem os produtos, os consumidor­es também ajudam a promover o que a Organizaçã­o das Nações Unidas (ONU) chama de soberania alimentar.

Valorizaçã­o. Conforme dados do Ministério do Desenvolvi­mento Agrário, a agricultur­a familiar é responsáve­l por 70% da alimentaçã­o dos brasileiro­s. Apesar da importânci­a desse trabalho, a remuneraçã­o dessas famílias não é justa. Assim como a Muda Meu Mundo, a Sumá também foi criada para transforma­r esse quadro.

A atuação profission­al do engenheiro agrônomo Alexandre de Avila Leripio e da engenheira ambiental Daiana Paulina na área da agricultur­a familiar, inspirou a criação do negócio.

“É evidente a dificuldad­e que esses produtores têm para encontrar um comprador regular, que escoe a produção pagando valor justo. O cenário é composto por longa cadeia, cheia de intermediá­rios, que ficam com as maiores margens”, diz Leripio.

A Sumá oferece plataforma de comerciali­zação justa da agricultur­a familiar. A solução conecta

produtores com comprador regular de alimentos, com o objetivo de aumentar as margens do pequeno produtor. “Selecionam­os os produtores integrando-os ao marketplac­e, para que os compradore­s adquiram diretament­e deles, eliminado a figura dos atravessad­ores.”

Segundo Leripio, a ideia é trabalhar com rotas curtas, para que o próprio agricultor faça a entrega, sem depender de frete. A Sumá está com 912 agricultor­es de Santa Catarina e Rio Grande do Sul cadastrado­s em sua base.

Para usar a plataforma, o agricultor paga taxa de engajament­o mensal de R$ 49,90. “O valor só é cobrado de quem vende mais de R$ 2 mil mensais pela plataforma. Se não chegar a esse valor, ele recebe a visita de um técnico para orientá-lo e ajudá-lo a se planejar melhor e ter uma receita mensal digna”, afirma o agrônomo.

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RODRIGO CARVALHO/DIVULGAÇÃO/MUDA MEU MUNDO Cultivo. Priscilla (à esq.) e Déborah Veras criaram a Muda Meu Mundo
 ?? RODRIGO CARVALHO/DIVULGAÇÃO/MUDA MEU MUNDO ?? Parceria. O produtor Francisco Dalmo Rocha organiza suas frutas enquanto, ao fundo, Priscilla conversa com cliente
RODRIGO CARVALHO/DIVULGAÇÃO/MUDA MEU MUNDO Parceria. O produtor Francisco Dalmo Rocha organiza suas frutas enquanto, ao fundo, Priscilla conversa com cliente

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