O Estado de S. Paulo

Pauta-bomba no Congresso põe em risco ajuste fiscal

Projetos que tramitam na Câmara e no Senado podem gerar despesas extras de pelo menos R$ 20 bilhões

- Fernando Nakagawa Adriana Fernandes/ BRASÍLIA

Parlamenta­res estão dando andamento no Congresso a projetos que podem dificultar a tentativa de ajuste das contas públicas que tem sido feita pelo governo. Perdão de parte da dívida dos produtores rurais e reajuste do Bolsa Família – entre outros itens – são exemplos de pautas que podem gerar despesas que superariam R$ 20 bilhões já no primeiro ano após sua aprovação. Com a anuência de presidente­s de comissões e apoio de parlamenta­res da base insatisfei­tos com o governo, projetos com efeito contrário ao plano de ajuste executado pelo ministro Henrique Meirelles (Fazenda) têm avançado e podem ser colocados em votação, caso haja consentime­nto dos presidente­s da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Eunício Oliveira (PMDBCE).

Perdão de parte da dívida dos produtores rurais, atualizaçã­o da tabela do Imposto de Renda em 11,4% e parcelamen­to das dívidas das Prefeitura­s coma Previdênci­a são alguns projetos antigos que, discretame­nte, os parlamenta­res estão tirando da gaveta eque podem dificultar­a tentativa de ajuste das contas do governo federal.

O Congresso, que já tem dificultad­o a aprovação de medidas do ajuste fiscal, ameaça com esses projetos criar gastos que podem superar R$ 20 bilhões no primeiro ano após sua aprovação. O movimento chega a ser comparado ao da “pauta-bomba” armada pelo ex-deputado Eduardo Cunha contra Dilma Rousseff em 2015.

Coma anuência de presidente­s de comissões e ajuda de parlamenta­res dabas e insatisfei­tos como governo, tem havido avanço de projetos com efeito exatamente contrário do plano de ajuste executado por Meirelles, que tem feito cortes até em programas sociais para economizar as despesas do governo.

Um exemplo de criação de gasto sé a recente ampliação do Programa de Regulariza­ção Tributária Rural. Em um acordo de última hora, governista­s e oposição aprovaram semana passada condições mais amigáveis aos devedores com perdão integral de multas e juros, sem limite para inclusão de dívidas no Refis Rural. Assim, crescerá a renúncia fiscal originalme­nte calculada em R$ 5 bilhões. N ames malinha, abancadamu­nicipalist­a pressiona por nova rodada de negociação de dívidas coma União.

O Congresso também avalia mudança da Lei Kandir – programa de compensaçã­o a exportador­es –, que exigiria repasse anual de R$ 9 bilhões da União aos Estados.

Em todo sesses casos, as iniciativa­s precisam seguira tramitação normal no Congresso e dependem dos presidente­s da Câmara e do Sena dopar achegar ao plenário, mas o simples avanço pode virar munição para pressão contra o governo.

Centrão. Projetos menos conhecidos também têm seguimento e várias iniciativa­s vêm do “Centrão” – bloco de partidos cada vez mais insatisfei­tos com Temer. A proposta feita em 2011 pela deputada Gorete Pereira (PR-CE) é um exemplo: obriga o Sistema Único de Saúde (SUS) a criar uma unidade de atendiment­o para mulheres a cada 100 mil brasileira­s.

O texto ficou seis anos parado e chegou a ser arquivado, mas nas últimas semanas foi retomado e aprovado pela primeira vez em uma comissão. O projeto obrigaria o governo a criar mais de mil unidades de saúde.

Há, ainda, proposta de criação de piso salarial para agentes de saúde. Projeto para conceder bolsas de estudos a filhos de policiais mortos em serviço, concessão de indenizaçã­o a vítimas de violência familiar, inclusão de remédios contra depressão e tireoide no programa Farmácia Popular, entre outros (leia quadro acima).

Parlamenta­res não parecem surpresos com o movimento. “Partidos podem querer aproveitar para pressionar o governo. O meu não tem interesse em lançar candidato a presidente, mas quem quer concorrer pode querer não deixar as coisas fáceis para Temer e Meirelles”, diz o presidente da Comissão de Finanças e Tributação da Câmara, Covatti Filho (PP-RS).

Responsáve­l pela proposta de atualizaçã­o da tabela do IR em 11,4%, o deputado Pepe Vargas (PT-RS) reconhece que esse tipo de iniciativa pode se transforma­r em instrument­o de pressão: “O pessoal do ‘Centrão’ pode até usar o projeto para chantagear Temer”.

O governo aposta num novo desbloquei­o de despesas do Orçamento ainda este mês e nas negociaçõe­s em torno da montagem da reforma ministeria­l para acalmar os ânimos dos deputados e conseguir apoio para aprovar das medidas fiscais. Com isso, espera desarmar a tramitação dos projetos que podem ampliar o buraco das contas públicas

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