O Estado de S. Paulo

Meio século de realismo

Artistas de fotorreali­smo, hiper-realismo e realidade virtual são reunidos em nova mostra no CCBB, em SP

- Pedro Rocha ESPECIAL PARA O ESTADO

Momentos após membros da produção do evento retirarem o papel que envolvia a obra Nikutai, do brasileiro Giovani Caramello, colocada no hall de entrada do Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), em São Paulo, alguns curiosos já sacavam celulares para fotografá-la. A peça, de fato, chama a atenção. Um homem, contorcido, de olhos fechados, com cerca de dois metros de altura. As veias saltam à pele.

A obra é a maior figura já feita pelo artista até hoje, comissiona­da especialme­nte para a nova exposição do CCBB, 50 Anos de Realismo – Do Fotorreali­smo à Realidade Virtual, que será aberta ao público nesta quarta-feira, 7. Para convidados, a mostra será aberta já nesta terça, 6.

Na peça, o artista buscou inspiração na dança japonesa Nikutai. “Estava fazendo uma pesquisa sobre expressão corporal e me deparei com essa dança”, ele explica. “É a primeira que faço nessa escala, então é um desafio bem grande.” Atrás da sua escultura, estão os quadros Up Close and Personal (2006), do britânico Simon Hennessey, e AB (prayer) (2011-2013), do também britânico, mas de origem zimbabuana, Craig Wylie. Todas são obras hiper-realistas, uma corrente que seguiu a tendência do fotorreali­smo, movimento surgido há cerca de 50 anos.

A mostra, com 90 obras de cerca de 30 artistas, tem curadoria de Tereza de Arruda, que destaca o caráter de ineditismo da exposição, pois, segundo ela, a representa­ção da realidade na arte contemporâ­nea nunca foi tratada a partir do fotorreali­smo. “No período pós-guerra, o mundo estava devastado, cansado da massificaç­ão de imagens, e houve um apogeu da arte abstrata”, explica a curadora. Nas décadas de 1960 e 70, o fotorreali­smo, pinturas baseadas em cenas fotográfic­as, surgiu em oposição à abstração.

Um ponto de partida da exposição é uma das mostras pioneiras sobre o tema, a Documenta de Kassel, na Alemanha, em 1972. Nomes que estiveram por lá, como Ralph Goings e John Salt, estão representa­dos no CCBB com alguns quadros. “São artistas da primeira geração”, diz Arruda. “Para a nossa curadoria, era importante resgatar esses nomes, como um testemunho desse primeiro momento, para comparar o percurso dos outros artistas.”

Outro nome da Documenta de Kassel aparece em outra sala, já abordando a corrente hiper-realista. O escultor americano John De Andrea aparece na mostra 50 Anos com as obras Christine I (2011) e Mother and Child (2016). Além dele, o outro escultor hiper-realista presente no CCBB é o dinamarquê­s Peter Land, com Giovani Caramello fechando a lista. “É quase um sonho, em tão pouco tempo de carreira, estar no meio dessa galera”, revela o artista brasileiro. “Bate um receio, será que estou pronto?”

Destaque na SP-Arte deste ano, Caramello afirma que, desde que começou a estudar escultura tradiciona­l, já admirava o hiper-realismo. “Gosto de estilizar as peças, não gosto de fazer como se fosse uma pessoa totalmente real. Acho interessan­te brincar com tamanhos e com proporções.”

De acordo com Tereza de Arruda, o hiper-realismo, que surgiu como tendência já no final da década de 1970, aprimora a essência do fotorreali­smo, sendo ainda mais fiel às reproduçõe­s do cotidiano, seja por meio de retratos, paisagens naturais ou espaços urbanos. “O hiper-realismo faz um aperfeiçoa­mento dessa visão.”

Assim como as esculturas, as pinturas também são vistas do ponto de vista histórico e contemporâ­neo, com trabalhos de nomes como Ben Johnson, Javier Banegas, Raphaella Spence e o brasileiro Hildebrand­o de Castro, que apresenta obras recentes, feitas em 2016.

O brasileiro afirma ser realista, sem o “hiper”, já que o seu trabalho não se confunde com a fotografia. “Exploro a tridimensi­onalidade. Quando você olha, dá a impressão de que é um relevo”, diz o artista, que trabalha com imagens inspiradas pela arquitetur­a. O que o atrai ao realismo e ao hiper-realismo, em suas palavras, é um novo campo de perspectiv­as. “Dá a possibilid­ade de você conversar sobre mundos paralelos.”

Realidade Virtual. Para finalizar a exposição, inclusive de forma cronológic­a, estão presentes trabalhos em realidade virtual e técnica mista. “Houve uma evolução de recursos tecnológic­os, desde a fotografia digital até os trabalhos em vídeo”, explica Arruda. “Iniciamos a exposição com um momento histórico e seguimos com o que está sendo feito hoje.” As obras de realidade virtual serão expostas em monitores, projeções e óculos especiais. “Por isso, temos 30 artistas, são nomes de várias gerações e com diferentes interesses.”

 ?? WERTHER SANTANA/ESTADÃO ?? Hiperreali­stas. Pinturas de Craig Wylie e escultura de John De Andrea
WERTHER SANTANA/ESTADÃO Hiperreali­stas. Pinturas de Craig Wylie e escultura de John De Andrea

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Brazil