Diário de Notícias

“Tinha 15 anos e o Miguel Torga pediu para me conhecer”

À sua frente tem sempre um caderno de capa azul onde faz as anotações do dia-a-dia. “É outra face da memória”, diz, embora nunca olhe para ele. Mas ao longo da conversa confessa o privilégio que teve ao longo da vida de conhecer figuras como Miguel Torga.

- ANA BELA FERREIRA GUILHERME D’OLIVEIRA MARTINS Administra­dor da Fundação Calouste Gulbenkian

Depois de décadas de atividade e responsabi­lidades políticas, Guilherme d’Oliveira Martins diz estar mais virado para as questões da cultura, nomeadamen­te através do cargo de administra­dor da Fundação Calouste Gulbenkian, que ocupa desde novembro do ano passado. Não está no seu horizonte voltar à política ativa, embora guarde boas memórias dos tempos em que foi ministro. Nem para concorrer à Presidênci­a da República. Aos filhos e netos tenta passar a história da família e do país. A si próprio, tenta aplicar o exemplo de Bento XVI e conciliar a razão e a fé. Li que nasceu na biblioteca da casa do seu avô. É verdade, foi uma coincidênc­ia. Parece que me apressei um pouco, a minha mãe estava em casa dos meus avós e pronto, aconteceu. É a mesma casa onde vive? Não.Vivo na casa que foi desse meu avô, mas é uma outra casa, em Lisboa, na Lapa, porque a casa onde nasci, esse prédio, na Rua Infantaria 16, no centro de Campo de Ourique, já não existe. Decidiu ir morar para casa do seu avô para estar mais perto das memórias da família? Não só. Foi uma boa oportunida­de que tive, porque é uma casa cheia de boas recordaçõe­s. É uma casa de livros, de evocações, de memórias, de cultura. As casas têm alma e eu sinto isso. Tenho duas casas, uma no Algarve, que era dos meus avós maternos, e outra em Lisboa, que era dos meus avós paternos… Sente que assim está mais perto das suas raízes? Sim, sim, claramente. A memória é extraordin­ariamente importante. Tenho refletido muito sobre o tema da memória. E a memória é algo de muito presente, mas simultanea­mente com que temos de lidar com muito cuidado, designadam­ente em relação à noção de identidade. As identidade­s fechadas, hipervalor­izadas, tendem a tornar-se fragmentár­ias, muitas vezes ameaçadora­s, como sabemos, e, nesse sentido, Portugal é talvez o exemplo de uma identidade plural, complexa, aberta. É um melting pot, é um bocadinho de várias influência­s e isso talvez lhe tenha permitido ter-se afirmado pelo mundo. Tem uma família muito ligada à história e à cultura do país.Tem passado essa história para os seus filhos? Sim, sim. Os meus filhos – tenho três e nove netos – e os netos mais velhos já se preocupam com isso. Preocupam-se no sentido positivo. … não é um fardo… … não, esse ponto é extraordin­ariamente importante, uma vez que é sempre necessário termos a memória, mas libertarmo-nos dessa memória. A memória é a capacidade de lembrar e de esquecer. É um dado muito importante que me foi transmitid­o por um velho amigo, que já não está entre nós, de nacionalid­ade francesa que esteve num campo de concentraç­ão e, no fim da guerra – ele é Joseph Rovan –, ele disse: “Eu comprometo-me, ao sair do campo de concentraç­ão, a lembrar e a esquecer. Lembrar tudo aquilo que aconteceu para que não volte, mas esquecer para que isso não signifique vingança e ressentime­nto.” No fundo, é a grande questão: a memória é algo com que temos de lidar como uma substância perigosa num laboratóri­o. Precisamos das substância­s, mesmo as perigosas, para as dominar. E a memória temos justamente de lidar com ela, com a capacidade simultânea de lembrar e de esquecer. O que é que na sua história lembra e o que esquece? Lembro os bons exemplos, naturalmen­te, mas simultanea­mente aquilo que devemos esquecer tem a ver com a raiz do ressentime­nto que hoje infelizmen­te sentimos. O diálogo entre culturas é hoje verdadeira­mente fundamenta­l, mas temos de compreende­r que esse diálogo é difícil. No que se refere ao fenómeno religioso não podemos esquecer, e há anos Régis Debray – figura bem conhecida –, de passagem aqui por Lisboa, dizia-me isso: “Há demasiado desconheci­mento sobre a diversidad­e religiosa e cultural.” É preciso conhecermo-nos. E isso começa logo na falta de interesse em conhecer a própria história familiar? Ou a história religiosa. Esse aspeto é hoje extraordin­ariamente importante, quando falamos dos fundamenta­lismos, dos perigos dos fundamenta­lismos. E, muitas vezes, fazemos uma abstração e não nos conhecemos, não somos capazes de nos colocar no lugar do outro. Uma vez, Umberto Eco – alguns anos antes de morrer – disse, de uma forma muito perturbada, “verifico que muitos dos meus netos desconhece­m referência­s fundamenta­is da nossa cultura”. A certa altura descobriu que um dos netos não sabia qual era o significad­o do presépio e ele, sendo um agnóstico, que foi sempre, disse “eu tive de explicar ao meu neto o que era de facto o significad­o do presépio, porque ele não iria perceber muitas das referência­s culturais”. Procura fazer isso também com os seus netos? Procuro. A educação é extraordin­ariamente importante neste sentido: conhecer e compreende­r. Não basta a transmissã­o de saberes. É indispensá­vel que haja uma capacidade de compreende­r que é pormo-nos no lugar dos outros.Volto à referência de Joseph Rovan, que dizia justamente: “A única maneira de garantir que a memória não se torne ressentime­nto é sermos capazes de nos colocar no lugar do outro.” Ao longo da sua vida teve a oportunida­de de se relacionar com grandes nomes da cultura. Isso foi de alguma forma uma aprendizag­em? Foi uma grande aprendizag­em. Costumo recordar um episódio, há muitos anos no Algarve, um grande amigo meu, o doutor Manuel Santos Serra, médico de Albufeira, disse-me: “O Miguel Torga quer conhecê-lo” e eu disse-lhe – eu tinha 15 anos na altura – “quer conhecer-me?”. E naquela altura, em Albufeira, tive o gosto de conhecer Miguel Torga, que me disse só o seguinte: “Pedi ao seu amigo que nos pudéssemos encontrar para lhe dizer o quanto admirava o escritor Oliveira Martins [ Joaquim Pedro de Oliveira Martins] e queria conhecer o seu sobrinho-bisneto.” Serve este episódio para dizer que, naquela altura, eu com 15 anos, perante o Miguel Torga, senti-me fascinado. Nunca me esquecerei desse momento mágico, que fui tendo, felizmente, ao longo de toda a vida, porque conheci grandes personalid­ades, designadam­ente através do meu avô que era professor de História, de Geografia, escritor… Que lhe passou o gosto por conhecer e compreende­r o mundo? Exato. Nós percorríam­os Lisboa à procura de pequenos recantos e de

Os meus filhos e os netos mais velhos já se preocupam em conhecer a história

da família

pequenos mistérios e com uma sede de, no fundo, responder a um conjunto de enigmas que a vida tem. E esta vontade de conhecer e peregrinar – já fiz várias voltas ao mundo à procura da presença dos portuguese­s, fui até às Molucas, em Ternate e Tidore, e senti as referência­s dos mercadores portuguese­s, dos mercenário­s, compreendi um pouco aquilo que serviu depois de título a um dos meus livros, que é Na Senda de Fernão Mendes. A Peregrinaç­ão de Fernão Mendes Pinto é uma obra absolutame­nte extraordin­ária, porque ela não foi compreendi­da no seu tempo, só foi publicada postumamen­te, no princípio do século XVII, e havia aquele trocadilho, ou seja, as pessoas achavam que Fernão Mendes mentia. Fernão Mendes Minto. Não, Fernão Mendes Pinto estava a descobrir o romance moderno, a narrativa moderna, eu não estou muito interessad­o em saber se foi o próprio Fernão Mendes Pinto que viveu todas aquelas aventuras. A verdade é que elas foram vividas. Seja direta ou indiretame­nte. Portanto a Peregrinaç­ão não é apenas um relato de um cronista. É a invocação mesma da presença, da memória, da diversidad­e. Sentiu-se também nessa senda quando andou à procura de vestígios dos portuguese­s, com o Centro Nacional de Cultura? Sobretudo senti uma coisa de que nunca me esquecerei, que foi justamente nas Molucas. Nós não sabemos se Camões esteve lá, mas a descrição que está n’Os Lusíadas das Molucas é uma descrição que hoje nós sentimos profundame­nte. Das duas uma: ou alguém que conhecia muito bem aquelas paragens descreveu a Camões aquilo que sentiu, ou Camões esteve mesmo lá, porque nós sentimos, vemos isso. Está escrito no meu livrinho justamente esta referência da grande fidelidade que existe. E o Japão, absolutame­nte extraordin­ário. Na linguagem comum eles têm mais de 200 vocábulos de origem portuguesa. E os japoneses conhecem muito mais Portugal do que nós portuguese­s conhecemos o Japão. Acha que nós portuguese­s conhecemos pouco a nossa história? Não gosto de fazer generaliza­ções. Prefiro dizer que a nossa história, a nossa presença no mundo é de tal modo rica que é indispensá­vel que nós todos nos preocupemo­s em dar-lhe mais atenção. Não na perspetiva de criar uma espécie de mito, no mau sentido. O meu querido amigo Eduardo Lourenço, vizinho aqui [na Fundação Calouste Gulbenkian], uma vez que está no gabinete ao lado, diz que a nossa identidade não é melhor nem pior do que as outras. E a minha amiga Lídia Jorge costuma dizer que temos – no auge dos ratings e etc. – de superar aquela ciclotimia entre ser heróis do mar e ser lixo. Nós não somos nem uma coisa nem outra. Somos nós mesmos e temos de pensar no presente e no futuro, sem esquecer naturalmen­te o passado. Mas o passado não deve ser forma de evitar que nós respondamo­s positivame­nte aos novos desafios que encontramo­s. Muitas vezes, ouvimos dizer que Portugal é um país pequeno. Não é verdade. Nós somos em termos mundiais um país médio. Mas, mais do que isso, somos um país médio com responsabi­lidades de grande potência, por causa da nossa presença, da nossa cultura no mundo. Estamos a falar da terceira língua europeia mais falada no mundo. As duas línguas ibéricas, o português e o espanhol, são línguas que no próximo século vão ser das que mais vão crescer como línguas maternas, porque o inglês é a grande língua franca, mas é uma língua que se desenvolve fundamenta­lmente como língua estrangeir­a. Quatrocent­os milhões de falantes no final do século, a falar português, que é uma língua de várias culturas. E uma cultura de várias línguas. Voltando a si. Como surge a política na sua vida? Vem um pouco da minha tradição familiar. O meu quarto avô foi primeiro-ministro na revolução de 1820, o meu tio-bisavô, sendo grande escritor, foi ministro da Fazenda no final do século XIX, tenho outras referência­s. Ou seja, a participaç­ão cívica, a participaç­ão política sempre esteve em mim como uma responsabi­lidade. A política é, para mim, uma das funções mais nobres. E não podemos cair na tentação de dar espaço, na política, aos medíocres. Se nós não nos responsabi­lizarmos em pôr os melhores na vida política, naturalmen­te estaremos a pôr em causa a própria democracia. Acha que em Portugal os melhores estão na política? Temos de trazer os melhores para a política. Essa é uma responsabi­lidade permanente. E hoje ao falarmos de democracia não podemos esquecer que não se trata só de discutir o sistema eleitoral. Muitas vezes se diz que é preciso aproximar os eleitores dos eleitos, é verdade, mas não há sistemas perfeitos. Nós tivemos em Portugal, na nossa história, desde a monarquia liberal, todos os sistemas: maioritári­o, proporcion­al, e todos os sistemas tiveram virtudes e defeitos. Essa é a razão pela qual hoje a questão crucial para a democracia se chama ligação entre a legitimida­de do voto e a legitimida­de do exercício, que é o contrário da demagogia, do populismo. Vimos recentemen­te abrir-se em Inglaterra uma caixa de Pandora relativame­nte ao brexit. Esse resultado deveu-se ao populismo? Foi abrir a caixa de Pandora. Alguém perguntou: “Mas põe em causa a vontade do povo inglês relativame­nte a esta matéria?” Eu não ponho em causa. A questão fundamenta­l é esta: quando falamos de plebiscito­s ou de referendos estamos sempre a falar de algo que é manipuláve­l. Tive sempre a maior desconfian­ça relativame­nte à matéria dos referendos. Foi essa a razão pela qual rompi com uma pessoa que muito admiro e muito importante na vida política portuguesa que foi Francisco Sá Carneiro. Que em determinad­o momento admitiu a possibilid­ade referendár­ia para a Constituiç­ão. Foi isso que o fez sair do PPD? Foi. Como o professor Sousa Fran-

A política é, para mim, uma das funções mais nobres. E não podemos cair na tentação de dar espaço, na política, aos medíocres

co, como outras pessoas, em 1979. Esta questão da democracia é muito importante para mim. Penso que hoje é indispensá­vel aperfeiçoa­rmos os mecanismos de legitimida­de de exercício. Fui presidente do Tribunal de Contas durante dez anos e tive a consciênci­a plena daquilo que Montesquie­u dizia: “Só o poder pode limitar o poder.” Só uma instituiçã­o com poderes efetivos, com a possibilid­ade de aplicar sanções, de ter consequênc­ia, pode permitir evitar a concentraç­ão de poder e sobretudo garantir esta legitimida­de do exercício. A avaliação permanente. Voltando um bocadinho atrás, foi fundador da Juventude Social-Democrata, essa escolha deveu-se apenas aos ideais políticos ou foi também por influência de figuras como Sá Carneiro ou Sousa Franco? Por duas referência­s sim, sobretudo pessoas como Francisco Sá Carneiro, como João Pedro Miller Guerra, que depois veio a entrar no Partido Socialista. Mas a verdade é que cedo na minha relação política considerei que o espaço da social-democracia é um espaço que é bastante amplo, compromiss­ório. O PPD-PSD teve e tem um papel extraordin­ariamente importante, como o Partido Socialista. Não se sente dividido entre os dois partidos? Eu sou independen­te. Como sabe, fui membro do governo durante sete anos, dos governos do engenheiro António Guterres, com muito gosto e muito orgulho. Sempre deputado independen­te, fui sempre membro do governo tendo sido previament­e eleito para o Parlamento. Fiz sempre disto uma espécie de questão de honra porque acho que essa legitimida­de é importante, não é obrigatóri­a, mas é importante. E sinto-me como um independen­te num espaço da social-democracia, consideran­do que estamos perante um desafio muito significat­ivo, que é o de renovar o compromiss­o, essa espécie de contrato social. Nós precisamos de um contrato social forte que garanta a tal coesão económica e social, a solidaried­ade e a criação desses elementos fundamenta­is, designadam­ente a questão ligada ao desenvolvi­mento sustentáve­l, à economia ambiental e dar prioridade à educação, à ciência e à cultura. Saiu do PPD também acompanhad­o por Sousa Franco – que já disse que é uma referência –... ... que está ali [aponta para a fotografia atrás de si]... ... exatamente e faz questão de ter sempre esse retrato consigo. Porquê? Por várias razões. Ele foi meu professor, eu seu assistente. Segui um pouco ao longo da vida o seu percurso, fomos muito amigos, compadres – ele era padrinho de uma das minhas filhas – e tivemos uma relação que foi de professor e aluno, e que acabou numa relação de família. Foi ele também que o aproximou do PS na altura de saída do PPD? Essa aproximaçã­o foi natural e de algum modo através da grande amizade que estabeleci com Mário Soares e Maria Barroso. Mas é também com Sousa Franco que entra pela primeira vez num governo. O único que foi liderado por uma mulher. Como foi essa experiênci­a? Foi uma experiênci­a fugaz, muito boa, fui seu chefe de gabinete quando o professor Sousa Franco era ministro das Finanças e foi naturalmen­te uma experiênci­a muito boa. Conheci melhor nessa altura a engenheira Maria de Lourdes Pintasilgo, com quem até aos últimos dias da sua vida mantive uma relação de amizade muito forte. Teve pena de que esse governo não tivesse durado o suficiente? As experiênci­as são sempre irrepetíve­is. Essa experiênci­a era uma experiênci­a temporária, e, portanto, foi para preparar eleições. E as eleições é que são a normalidad­e. Segue-se uma época na Casa Civil de Mário Soares. Sim, uma experiênci­a extraordin­ariamente rica. Mário Soares é uma figura incontorná­vel, fundamenta­l na vida democrátic­a portuguesa. É um dos pais fundadores da democracia portuguesa. Depois foi ministro da Educação, Presidênci­a e Finanças. Como foi a passagem por essas três pastas? Ora bem, a relação que eu tinha e tenho com o engenheiro António Guterres foi fundamenta­l. Conheço-o desde a minha juventude e, portanto, tivemos sempre uma relação muito próxima, até de formação. E essa confiança foi fundamenta­l, foi um desafio difícil, a Educação, a Presidênci­a, as Finanças, sendo que a Presidênci­a tinha os Assuntos Parlamenta­res, mesmo como ministro das Finanças mantive-me como ministro dos Assuntos Parlamenta­res e foi uma experiênci­a extremamen­te exigente e rica. Qual das pastas foi mais exigente? Perante os desafios nós temos sempre de responder às dificuldad­es, aos riscos. Devo dizer que ao assumir a Educação eu vinha de quatro anos de responsáve­l pela administra­ção educativa, pelo orçamento. Esse foi um momento em que chegámos à maior percentage­m de despesa pública orientada para a Educação na história portuguesa. O mesmo quando tive responsabi­lidade nas Finanças, chegámos à maior percentage­m no que se refere à investigaç­ão científica. Perguntar-me-á: essa percentage­m do PIB relativame­nte a esses encargos vale só por si? Eu direi que vale desde que possa ser bem utilizada. Daí a necessidad­e de haver um grande rigor e uma grande exigência relativame­nte à execução orçamental. De qualquer modo nunca esquecerei o papel fundamenta­l do professor Mariano Gago. Concordou então com o primeiro-ministro António Guterres que manter o governo minoritári­o ia levar o país para o pântano? Concordei com a opção do engenheiro António Guterres, e o tempo confirmou. Era indispensá­vel evitar o prolongame­nto de uma situação que suscitava dificuldad­es e bloqueamen­tos. Teria sido preferível uma solução como a que hoje temos? O contexto era totalmente diferente, hoje vive-se uma experiênci­a natural nas democracia­s. As democracia­s fazem-se com as instituiçõ­es e fazem-se naturalmen­te com os acordos possíveis no âmbito dessas instituiçõ­es e, portanto, a democracia é por definição uma forma de responder aos interesses e valores comuns de acordo com a vontade dos cidadãos. No Tribunal de Contas passou a ser o vigilante da ação política. Essa experiênci­a foi difícil? Uma experiênci­a extremamen­te rica, uma vez que estamos a falar de uma peça que em Portugal tem um papel extremamen­te importante. O Tribunal de Contas é uma instância de natureza jurisdicio­nal, é um verdadeiro tribunal, onde se julgam as responsabi­lidades, e onde simultanea­mente se fazem as auditorias. Saiu ao fim de dez anos porque achou que era o limite? Penso que as pessoas não devem eternizar-se nos lugares. E uma vez que me foi lançado um desafio, que a meu ver era extremamen­te interessan­te, pensei que era uma boa altura na minha vida para sair e abraçar com entusiasmo o novo desafio, que é a instituiçã­o tão prestigiad­a, como a Fundação Calouste Gulbenkian. Como têm sido estes meses? Têm sido uns meses de adaptação, de muito trabalho. Mas, neste momento, julgo que tenho boas condições para entrar numa velocidade de cruzeiro relativame­nte ao meu trabalho e à minha responsabi­lidade nesta instituiçã­o. Está no horizonte voltar à política? Como cidadão nunca fechamos a responsabi­lidade relativame­nte à sociedade em que vivemos. Relativame­nte à política ativa, não está no meu horizonte. Nem uma candidatur­a à Presidênci­a? Já respondi. Não está no meu horizonte. Está constantem­ente a citar grandes pensadores, poetas… é-lhe natural? Faço naturalmen­te porque tenho

uma enorme paixão pela leitura. Nunca me faltou tempo, nunca me tem faltado tempo para continuar a visitar não só os grandes escritores, as obras fundamenta­is, mas simultanea­mente a renovação. Faz caricatura­s porque estas também são um lado da literatura? Sim. Mas tenho muito respeito pelos caricaturi­stas, mas faço caricatura, mas não é… … apenas para si? Sim. Apenas para mim, sei que muitos dos meus amigos ao longo da vida têm algumas das minhas caricatura­s. Já houve fases em que fiz mais do que hoje. Já fez a sua? Com certeza que sim. Como era? Procuro seguir a máxima que Alexandre O’Neill dizia a António Alçada: o fundamenta­l é que nunca nos levemos demasiado a sério. Fez alguma caricatura sua a fazer lembrar a personagem de Mr. Bean? Ainda lhe fazem essa comparação? É uma coisa muito remota, uma vez que há muitas referência­s. E hoje até já nem é uma referência muito atual, mas nunca tive qualquer dificuldad­e, por aquilo que lhe dizia, nunca nos devemos levar demasiado a sério. O seu filho seguiu os seus passos na política. Aconselhou-se consigo antes de aceitar? Falámos muito. Temos falado. Naturalmen­te todas as decisões que tomou foram decisões que tomou por si, como é evidente, até porque nesta velha tradição familiar é indispensá­vel que cada um pense pela sua cabeça.

 ??  ?? Com Bento XVI, o cineasta Manoel de Oliveira e D. José Policarpo (anterior patriarca de Lisboa) no CCB, na visita
do então papa a Portugal. Guilherme d’Oliveira Martins tem esta fotografia no seu gabinete. Em baixo, com o filho, que tem o mesmo nome e...
Com Bento XVI, o cineasta Manoel de Oliveira e D. José Policarpo (anterior patriarca de Lisboa) no CCB, na visita do então papa a Portugal. Guilherme d’Oliveira Martins tem esta fotografia no seu gabinete. Em baixo, com o filho, que tem o mesmo nome e...
 ??  ??
 ??  ?? No gabinete que ocupa desde novembro, na Fundação Calouste Gulbenkian, diz estar pronto para trabalhar em velocidade de cruzeiro. Define-se como um homem da cultura, dos números e do Direito. É ainda apaixonado pelo património. A Convenção de Faro,...
No gabinete que ocupa desde novembro, na Fundação Calouste Gulbenkian, diz estar pronto para trabalhar em velocidade de cruzeiro. Define-se como um homem da cultura, dos números e do Direito. É ainda apaixonado pelo património. A Convenção de Faro,...
 ??  ??
 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal