26 • Público • Domingo, 18 de Outubro de 2020 CULTURA mmmmm De Alfredo Catalani. Com Zarina Abaeva, Luis Cansino, Coro do TNSC, Orquestra Sinfónica Portuguesa. Dir.: Antonio Pirolli. Lisboa. Teatro Nacional de São Carlos. Até 18/10. Uma ópera em versão de concerto convida-nos a ouvir cuidadosamente a música, mas também a fazer a nossa própria encenação imaginária. Com La Wally, obra de cruzamentos estéticos e ideias múltiplas, a tarefa não é fácil. Seria preciso decidir se haveríamos de a colocar numa estética neogótica e nocturna, ou se deveríamos antes sublinhar os seus aspectos “veristas” e o seu realismo. Se a encenação seria pejada de referências culturais (ou invenções folclóricas) do Norte da Europa, devido aos cantos tiroleses e às valsas festivas que por ali há, ou puxada para as melodias “à italiana”, que também tem. Musicalmente, poderíamos piscar um olho a Wagner e o outro a Verdi. Poderíamos encenar uma aventura romântica sublime num cenário natural grandioso, ou desenhar detalhes naturalistas para um drama familiar. Como escolher? Talvez fosse preferível mostrar isso mesmo — a quantidade de sobreposições (musicais e teatrais) que a ópera realiza, e fazer uma encenação cheia de anacronismos, colocando-a em tempos diferentes simultâneos, e situando-a tanto em lugares reais como em lugares imaginados. Seria possível, sem que perdesse a unidade? A última obra de Alfredo Catalani é, de facto, uma ópera de multiplicidades, por vezes causando estranheza. Com libreto de um italiano (Luigi Illica) a partir de uma novela da escritora alemã Wilhelmine Von Hillern, La Wally é uma ópera “da neve”, com grandes comoções a derreter o gelo. Fugindo de um casamento de conveniência a que o seu pai quer obrigá-la, Wally canta a bela ária Ebben? Andrò... sola e lontana (Pois bem, partirei só e para longe) — e parte mesmo, para uma casa no meio da neve branca, onde deseja ficar sozinha. Essa ária é um acto de amor e liberdade, que a soprano Zarina Abaeva cantou espectacularmente, tendo arrancado na