A CARNE IN VITRO PODE EVITAR 96% DE EMISSÕES DE GÁS
Na frigideira, as pequenas imperfeições ganham uma bonita cor de caramelo. Perante isto, Uma Valeti, CEO da Memphis Meats, tem total confiança de que está perante uma almôndega capaz de mudar o mundo. E tudo porque a “bola” que estava na frigideira não era bem carne, ou melhor, nem sequer era carne. Pouco tempo depois, um assistente tirou uma amostra do produto cozinhado e deixou todos boquiabertos quando disse que sabia a carne de verdade. Depois pediu para repetir e, nesse momento, Valeti ficou com a certeza de ter um produto revolucionário nas mãos.
Claro que já existem carnes que são criadas em laboratórios, mas a descoberta de Valeti (em 2016) não se prendeu apenas com o facto de produzir proteína artificial para criar um pedaço de carne, mas sim com a capacidade de a agregar a células de gordura. Em breve, qualquer restaurante do mundo seria capaz de experimentar esta carne, acompanhada do inigualável sabor da carne ligeiramente tostada e dos sucos de gordura que ela tem. A nova carne de Valeti não só seria capaz de imitar a suculência de um hambúrguer verdadeiro, como poderia encher o prato do mais frívolo carnívoro sem ter de matar uma vaca. O interesse neste tipo de carnes in vitro criadas em laboratório explodiu nos anos mais recentes – principalmente por causa das preocupações sobre o impacto das carnes vermelhas na saúde e no meio ambiente – e a procura por parte dos consumidores tem vindo a crescer desde então. Uma pesquisa feita pelas Nações Unidas sugere que as empresas de criação de gado expelem mais de 20% das emissões de gás que promovem o efeito de estufa, mais do que todos os carros, aviões e comboios do mundo juntos. E há mais, pois cerca de um terço das mortes está relacionado com doenças cardiovasculares. Só que a solução não precisava ser algo sem sabor: investigadores da Universidade de Oxford (Reino Unido) estipulam que este tipo de carnes in vitro poderiam eliminar estas emissões até 96% sem sequer reduzir o sabor e os vários benefícios da carne tradicional. Em março deste ano, a Tyson Foods, a segunda maior produtora de carne do mundo, anunciou 120 milhões para investir em start-ups ligadas à sofisticada carne in vitro de forma a serem os primeiros a chegar ao seu prato, desde hambúrgueres de plantas, galinhas de tubos de ensaio a carne de porco impressa em 3D
As células são retiradas do músculo da vaca através de uma simples biopsia.
As células são incubadas para que possam ser divididas, criando uma secção inicial de tecido.
Cola-se este tecido a velcro para ser esticado. Isto aumenta a amostra.
Mais de 20.000 pedaços desta carne são moídos e misturados com sal, cebola e um pouco de pimenta para criar a mistura ideal para fazer um hambúrguer. (sim, isso mesmo). Com Bill Gates, criador da Microsoft, disposto a investir cerca de 240 milhões para obter um retorno de 5 biliões em 2020, esta alternativa à carne tradicional é dinheiro em caixa garantido. Porém, num país tão devorador de carne – com um consumo anual de cerca de 84 kg por pessoa, segundo um estudo do Telegraph – será que o Homem vai mesmo conseguir mudar a relação tão suculenta com um verdadeiro naco de carne? Por outro lado, com a carne vermelha ligada a tudo o que é mau - desde doenças do coração ao cancro -, será que um hambúrguer criado em laboratório não poderá salvar a nossa vida ou só nos vai deixar com um amargo de boca?
O CORTE PRINCIPAL
A carne in vitro e ideias semelhantes já existem há muito. Winston Churchill era um futurologista alimentar, e em 1931 exigiu um estudo tendo em vista a alimentação “daqui a 50 anos”, no qual ele previa o absurdo que seria criar uma galinha inteira para se poder comer o peito ou a asa. Setenta anos mais tarde, perto de 2010, a visão de Churchill ficou um pouco mais perto da realidade quando Valeti e a concorrência, apesar de trabalharem em diferentes produtos, conseguiram criar um processo viável que permite criar carne completamente in vitro. Para fazer um hambúrguer de carne completamente sem carne, é preciso obter as células de um dador (através de uma simples biopsia a uma vaca) e assim criar centenas de hambúrgueres. Estas células são depois criadas durante várias semanas em “centros de cultivo” juntamente com um serum extraído da vaca para criar fios de fibras que são depois removidos manualmente, abertos, esticados e esmigalhados para produzir carne moída. Apesar do processo complexo de produção, é muito mais económico do que o processo tradicional. Contudo, em 2013, Mark Post, um professor de fisiologia na Universidade