As propostas mais estranhas para a compra
...e outras ofertas desconhecidas e que não passaram o teste do Banco de Portugal, como a do “reino da Atlântida” ou a do ex-patrão da FNAC, o “barão vermelho”.
Apresentaram-se como uma boutique financeira espanhola chamada Western Hill, com muito interesse na compra do Novo Banco. Chegaram a vir, no ano passado, a uma reunião no Ministério das Finanças para manifestar esse interesse, mas logo aí as coisas pareceram fora da norma. “Um dos presentes do lado deles disse que não podia dizer tudo o que queria sobre a proposta que pretendiam fazer porque não confiava num dos seus colegas, que também estava ali sentado na reunião”, conta à
SÁBADO uma fonte conhecedora do processo de venda. A sociedade teria um montante significativo de activos sob gestão – afinal, estavam a tentar comprar o terceiro maior banco em Portugal. Mas as diligências processuais feitas pelo Deutsche Bank, que assessorou o Banco de Portugal na venda do Novo Banco, não encontraram operações sob aquela marca ou quem conhecesse a empresa. Os emails enviados pelo Deutsche vieram sem resposta e não havia escritório para contactar. A Western Hill acabaria por nem apresentar uma proposta.
O segundo processo de venda do Novo Banco pôs nas notícias os três candidatos que apresentaram propostas vinculativas: a Apollo Global Management, o China Minsheng Financial e o Lone Star Funds, que acabaria por comprar 75% do banco. Mas na fase inicial do processo, o Banco de Portugal recebeu outras propostas ou manifestações de interesse de compradores menos convencionais neste tipo de processo, que não passaram pelo crivo. A Western Hill não foi caso único. Uma dessas propostas foi apresentada pela RPP, uma empresa de parques industriais liderada por Alexandre Alves, conhecido nos anos 80 e 90 como o “barão vermelho” devido à sua ligação ao PCP e à paixão pelo Benfica. Alexandre Alves diz à SÁBADO que entregou “toda a documentação” no Banco de Portugal e no Ministério das Finanças para uma proposta de 4.800 milhões de euros, da autoria de um First Boston Group. “Mandaram de lá tudo direitinho, nós imprimimos, metemos numa cartinha e fomos entregar”, afirma, destacando que se trata de uma grande instituição que “foi sócia a 50% do Credit Suisse” e que depositou “500 milhões de dólares canadianos” (333 milhões de euros) numa instituição financeira em Portugal para provar que estava a falar a sério.
O First Boston Group foi, na verdade, resgatado pelo Credit Suisse no fim dos anos 80 e a marca First Bos-
ton desapareceu há 10 anos. Questionado sobre porque iria um grande banco de investimento global – caso ainda existisse com essa designação – recorrer a uma empresa portuguesa de parques industriais para concorrer a um banco, Alexandre Alves responde que “eles sabem que em Portugal nada se faz sem corrupção” e que, por isso, precisavam da RPP, com quem “têm uma relação antiga”, como “escritório de apoio em Lisboa”. O empresário apresentou propostas com o mesmo formato (uma parceria com esse First Boston Group) pelo Banif e pelo Efisa – nenhuma foi considerada válida.
O Banco de Portugal confirma a recepção da proposta e explica a rejeição. “O Banco de Portugal solicitou, como em relação aos outros investidores que manifestaram interesse, uma avaliação ao Deutsche Bank, enquanto seu assessor financeiro, sobre se este investidor cumpria os critérios de elegibilidade previstos no caderno de encargos”, indica à SÁBADO fonte oficial do supervisor. “O Deutsche Bank informou-nos de que não foi possível contactar a RPP, nem encontrar qualquer informação sobre o First Boston Group e muito menos sobre a origem e existência de fundos depositados em Portugal”, acrescenta. Alexandre Alves, 70 anos, chegou a ser um empresário de sucesso no cavaquismo – até cair em 1992, quando perdeu a eleição para a presidência do Benfica e saiu da liderança da FNAC (Fábrica Nacional de Ar Condicionado) pouco antes de esta falir. Desde então, o “barão vermelho” fez uma empresa de parques industriais, a RPP, e em 2009 outra de parques solares. O seu percurso tem sido marcado por processos judiciais e falências. Em 2010 conseguiu um contrato para a RPP Solar de 128 milhões em fundos europeus para a construção de uma megafábrica de painéis solares em Abrantes. Em 2012, com a construção parada, o Estado rompeu o contrato.
A penhora mágica
Pelo Novo Banco chegou ainda ao Banco de Portugal a proposta de uma pessoa que a título individual queria comprar o banco por 3 mil milhões de euros “pagáveis em 500 meses”, pouco mais de 41 anos, explica fonte ouvida pela SÁBADO. O comprador propunha-se financiar este montante dando como garantia os imóveis do próprio Novo Banco. A proposta, desde logo ilegal, também não pegou. Todas os candidatos e as respectivas propostas passam um crivo inicial para perceber se cumprem os “mínimos olímpicos”, explica uma fonte ligada à venda. Mesmo na fase mais a sério, das propostas vinculativas, há quem não passe os testes – o China Minsheng, por exemplo, não conseguiu fazer a prova de que tinha fundos para concretizar a compra.
As propostas mais bizarras são lidas por quem as recebeu como manifestações de “curiosos”, de quem quer saber alguma coisa sobre o processo ou, simplesmente, de pessoas com sentido de humor. No primeiro processo de venda do Novo Banco, cancelado em 2015, houve uma proposta que chegou do “reino da Atlântida” e outra de uma pessoa que fez uma oferta de 10 euros pelo banco – e que acompanhou as palavras com uma nota (verdadeira) dentro do envelope.
ALEXANDRE ALVES FEZ A PROPOSTA EM NOME DE UM BANCO DE INVESTIMENTO QUE NINGUÉM CONSEGUIU ENCONTRAR