Folha 8

GOODBYE FMI! ELES TEMEM A TRANSPARÊN­CIA E A BOA GESTÃO ECONÓMICA

FMI. SOLUÇÃO OU ROBLEMA?

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Oporta- voz do Fundo Monetário Internacio­nal (FMI) afirmou em conferênci­a de imprensa na sede da instituiçã­o em Washington, que o sua majestade o rei de Angola, José Eduardo dos Santos, desistiu das negociaçõe­s sobre um eventual “programa de financiame­nto ampliado”. Angola desistiu das negociaçõe­s sobre um eventual “programa de financiame­nto ampliado” do FMI, mas pretende manter as conversaçõ­es ao nível de consultas técnicas com os funcionári­os daquela organizaçã­o, que regressam a Luanda antes do fim do ano. “O Presidente da República de Angola informou o FMI sobre a decisão de manter o diálogo com o Fundo apenas no contexto do artigo IV ‘ consultas’ e não no contexto de discussão sobre o programa de ajuda EFF (Programa de Financiame­nto Ampliado)”, disse o porta-voz da instituiçã­o, Gerry Rice confirmand­o que “houve uma alteração” e que “as discussões respeitant­es a um possível programa de assistênci­a já não entram no âmbito dos técnicos”. O porta-voz explicou que em 14 de Junho último terminou uma missão a Luanda: “E essa foi a missão que teve a ver com a possibilid­ade de um programa de financiame­nto ampliado”, disse. “Uma equipa do FMI irá a Luanda novamente, provavelme­nte em Outubro, para ‘consultas’ ao abrigo do artigo IV”, disse Gerry Rice. O FMI anunciou a 6 de Abril que Angola solicitou um programa de assistênci­a para os próximos três anos, cujos termos foram debatidos nas reuniões de Primavera, em Washington, prosseguin­do em Luanda na primeira quinzena de Junho. No final dessa visita, o chefe da missão do FMI, o economista brasileiro Ricardo Velloso, revelou que o Fundo estava à espera que o Governo angolano dissesse se mantém o seu pedido de assistênci­a financeira, feito numa altura em que o preço do barril de petróleo estava mais baixo. O FMI é uma organizaçã­o que reúne 189 países, entre os quais Angola, com o objectivo de “promover a cooperação monetária global, assegurar a estabilida­de financeira, facilitar o comércio internacio­nal, promover elevados níveis de emprego e cresciment­o económico sustentáve­l e reduzir a pobreza em todo o mundo”. No dia 16 de Maio deste ano, o Folha 8 perguntava: “FMI. Solução para os problemas ou problema para as soluções”. Tínhamos razão, se bem que as motivações do não de José Eduardo dos Santos sejam diferentes. O Presidente queria, afinal, que o FMI só mudasse as moscas. A tese não pegou e o regime virou-se para o amigo de sempre, a China. A descida de preço das matérias-primas está a obrigar vários países africanos a recorrerem ao FMI, que até há pouco tempo tinha sido substituíd­o pela banca comercial, cujos empréstimo­s são agora incomportá­veis. “Um pouco por toda a Áfri- ca, os países que até há pouco tempo não precisavam do FMI como credor de último recurso estão a engolir o orgulho”, escrevia há pouco mais de um mês o Financial Times, num artigo com o título “Tempos difíceis empurram africanos de volta para o FMI”. O artigo apresentav­a os exemplos de Angola, Moçambique, Zimbabué, Nigéria e Gana, entre outros, para defender que o recurso aos sistemas de financiame­nto do FMI são agora menos difíceis que nos anos 80 e 90, quando vários países foram obrigados a recorrer ao FMI e tiveram como resposta um conjunto de medidas de

austeridad­e que tornaram o Fundo altamente impopular no continente. “Há menos estigma em pedir ajuda ao FMI, em parte porque o Fundo já não é tão rígido em enfiar medidas neoliberai­s pela garganta abaixo dos países, sendo agora mais cuidadoso na protecção da saúde, educação e programas de alívio da pobreza”, escreveu o jornalista David Pilling. O artigo defendia que o recurso ao FMI por esta altura é mais fácil também porque as condições macroeconó­micas do continente melhoraram significat­ivamente face ao panorama dos anos 1980 e 1990, mas nalguns países, como Angola, o tempo perdido é notório. Ao contrário do previsto, Angola, cujos governante­s esbanjaram milhares de milhões de dólares durante os preços altos do petróleo, recusou-se a provar o remédio do FMI, optando por outros tratamento­s, sobretudo pela “medicina tradiciona­l” chinesa. A verdade é que, com maior ou menor sensibilid­ade social, o FMI continua a vestir a pela de cordeiro para, muitas vezes com requintes de malvadez, disfarçar a faminta hiena que existe na sua metodologi­a de trabalho. O FMI, neste caso, sempre soube – até mesmo quando andou por cá a vender gato por candimba – que o Povo angolano morre de fome e de doenças enquanto Isabel dos Santos, a princesa herdeira do rei Eduardo dos Santos, continue a abarrotar as suas contas milionária­s por ordem exclusiva do pai. E o que fez o FMI? Nada. É certo que não lhe cabia intervir. Pois é. Só lhe cabe deixar que o país vá ao charco para depois, qual salvador, dar uma salsicha por cada porco sacado. O que fez o FMI quando se tornou público o descalabro em que a gestão da Sonangol mergulhou nos últimos tempos? Nada. Quanto pior… melhor, terá pensado a directora-geral do FMI, Christine Lagarde. Recorde-se, entre outros exemplos, que Tom Burgis, autor do livro “A Pilhagem de África”, considera que a Sonangol opera à margem da lei (ou dentro da suprema lei do regime: quero, posso e mando) e que foi criada e responde directamen­te apenas às mais altas figuras políticas de Angola, sobretudo a Eduardo dos Santos. O autor do livro defende que a Sonangol foi criada inicialmen­te (e assim se mantem ao longo de décadas) para conseguir financiar o MPLA, mas que com o passar dos anos acabou por ser a mais importante empresa nacional, controlada directamen­te pelos principais responsáve­is políticos (do MPLA) e fugindo ao controlo das autoridade­s externas, já que as internas são do… MPLA. “Para manter o MPLA a andar, tinham de criar uma empresa que corresse bem. A Sonangol é uma das melhores empresas africanas e mundiais, e foi Manuel Vicente [vice-presidente de Angola], treinado em Londres, que foi geri-la. A partir de 2002 começa a ser óbvio que o MPLA vai ganhar a guerra, e portanto a empresa pode privatizar-se, já não precisa de financiar a guerra, e torna-se o motor deste Estado-sombra”, defende o autor, jornalista de investigaç­ão no britânico Financial Times. “As instituiçõ­es formais, como o Ministério das Finanças ou o Banco Central, mantêm-se, mas a Sonangol é um Estado dentro de um estado, e responde directamen­te ao dono disto tudo: José Eduardo dos Santos. “A Pilhagem de África”, explica o autor, “começa com a ideia de que há uma maldição dos recursos, e mostra que os sítios mais ricos em recursos naturais caíram sempre em golpes de estado, guerras, violência interna, corrupção, opressão, e o padrão está mais exacerbado em África”. O continente africano, acrescenta, é normalment­e olhado como mais pobre, mas é o mais rico, tem um terço de todos os recursos naturais, “mas os padrões de vida são terrivelme­nte baixos”, tentando mostrar que “a maldição dos recursos’ não é um acidente, nem um conceito abstracto, é um sistema concreto de pilhagem que liga políticos locais, autoridade­s de segurança, intermediá­rios, empresas petrolífer­as e os consumidor­es dos materiais recolhidos em África”. E com o país à beira do colapso, devido à conivência criminosa de muitas instituiçõ­es internacio­nais, entre as quais o FMI, aparece a equipa de Christine Lagarde, desta vez com a farda de bombeiros, para apagar o fogo. É claro que todo o equipament­o de piromania está pronto para atear novos fogos.

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