OS FACTOS
A análise da evolução do negócio do Porto Caio é baseada na interpretação dos textos oficiais: i) Decreto Presidencial n.º 177/12, de 14 de Agosto de 2012. Através deste decreto, o ministro dos Transportes foi autorizado a realizar um contrato de concessão com a empresa Caioporto S.A. relativamente ao novo Porto do Caio. Esse contrato estaria no âmbito de uma parceria público-privada e incluiria, por parte da empresa privada Caioporto S.A., o financiamento, planeamento, concepção, remodelação, engenharia, construção e aprovisionamento do novo Porto do Caio. (artigo 2.º do DP n.º 177/12). Em contrapartida desta tarefa, a empresa obtinha o exclusivo no fornecimento de instalações e serviços no Porto a qualquer embarcação que o utilizasse. ii) Decreto Presidencial n.º 234/12, de 4 de Dezembro. A grande alteração que este decreto introduz no contrato é a autorização de prestação de uma garantia de Estado de pagamento à primeira solicitação a favor das entidades que financiam a concessão (redacção do artigo 6.º A do Decreto Presidencial n.º 177/12 introduzida pelo artigo 2.º do Decreto Presidencial n. 232/12). O n.º 2 do mesmo novo artigo 6.º A acrescenta que o Estado Angolano presta a favor da empresa privada uma garantia de receita mínima para assegurar a viabilidade económica do Porto. Isto quer dizer que o Estado se responsabiliza pelo sucesso do negócio. Transcreve-se o artigo, uma vez que foi objecto de contestação directa no e-mail: “O Estado vai ainda prestar, a favor da concessionária, uma garantia de receita mínima, por forma a garantir a viabilidade económica do Porto do Caio o longo do período da concessão.” Isto nega em absoluto as afirmações do e-mail no ponto (a.5). iii) Decreto Presidencial n.º 230-A/15, 29 de Dezembro de 2015. Este decreto cria mais benefícios para a zona a ser explorada pela empresa e autoriza a prestação de uma garantia de Estado no valor de 751 milhões de dólares. iv) Decreto Presidencial, o n.º 238/16, de 21 de Dezembro. Este decreto muda tudo. O financiador deixa de ser a empresa privada e passa a ser o Estado. E o Estado financia a obra através da inclusão do projecto na linha de crédito concedida pela China e definida pelo Decreto Presidencial n.º 138/16, de 17 de Junho. Este decreto, no seu artigo 1.º, estabelece que a concessão atribuída à Caioporto S.A. se mantém exactamente igual, excepto naquilo que concerne ao financiamento. O financiamento fica previsto nos artigos 2.º e 4.º, segundo os quais o Estado assume 85 por cento do financiamento e a empresa 15 por cento, sendo que o valor do contrato de empreitada é de pouco mais de 831 milhões de dólares (uma subida de 290 milhões de dólares, equivalente a 54 por cento). A empreiteira é a empresa chinesa China Road and Bridge Corporation. Portanto, o Estado financia 85 por cento. A empresa financia 15 por cento, ou seja, 124 milhões de dólares. A 30 de Janeiro de 2017, é anunciado que o Fundo Soberano de Angola vai investir no Porto de Caio 180 milhões de dólares. Por consequência, facilmente se vê que o seu investimento é que complementa o empréstimo chinês. Assim, os 15 por cento de financiamento que competiam à empresa privada, afinal, são trazidos pelo muito público Fundo Soberano. No e-mail afirma-se que “O FSDEA não investiu na Caioporto, S.A., como incorretamente indicado nos Artigos. (sic)”. Mas de seguida confirma-se o investimento: “O FSDEA não investiu na Caioporto, S.A., como incorretamente indicado nos artigos. O investimento de 180 milhões de dólares americanos do FSDEA no porto foi, na realidade, feito através do fundo de infra-estruturas de 1,1 mil milhões de dólares americanos do FSDEA.” Não foi o Fundo Soberano que investiu, foi um fundo do Fundo Soberano… Um fundo do Fundo Soberano é o quê? É de aparvalhar. Afirma-se, também no e-mail, que “as (…) garantias foram revogadas logo após o decreto presidencial ter sido emitido” (a.5). Aqui temos um exemplo do desconhecimento/ignorância (?) demonstrado na notificação. Ainda em 2015, após o Decreto de 2012, que o e-mail contesta, é publicamente prestada uma garantia de 750 milhões de dólares. Está documentado. A garantia soberana só seria revogada posteriormente porque o Estado assumiu o custo da obra, portanto não se vai garantir a si próprio… Ademais, se assim não fosse, a retirada de garantias soberanas a instituições terceiras já provocou o caos financeiro e o descalabro na credibilidade bancária de Angola no estrangeiro aquando da “revogação” da garantia prestada ao BESA. Por consequência, tal (a revogação de uma garantia) não seria uma boa notícia, mas mais um exemplo de desregramento e desrespeito pelas regras de direito financeiro internacional. Finalmente, a notificação também confunde garantia soberana com garantia de receita mínima. Realidades muito diferentes. Num caso, o Estado assegura o pagamento de dívidas de uma terceira pessoa. No outro, o Estado assegura determinado pagamento a essa terceira pessoa. Em suma, quem tem de pedir desculpas é Jean-Claude Bastos de Morais e o seu dependente José Filomeno dos Santos. Têm de pedir desculpa aos cidadãos angolanos, porque saqueiam os fundos públicos (que são pertença da população angolana) através do Fundo Soberano. Mais do que isso, têm de ressarcir os cidadãos angolanos por todos os milhões que desviam para enriquecimento próprio. Confrontá-los em tribunal será uma honra. Tarde ou cedo serão julgados.
(*) Maka Angola