Folha 8

AO QUE ISTO ANGOLA) CHEGOU!

MONOCULTUR­A DE UMA CRIMINOSA INCOMPETÊN­CIA

-

Governo da Zâmbia está a equacionar a venda a Angola de 20.000 toneladas de milho das suas reservas, conforme pedido feito nos últimos dias pelo executivo de sua majestade o rei José Eduardo dos Santos. Um país rico gerido por criminosos só pode dar nisto. O assunto foi abordado entre a embaixador­a angolana na Zâmbia, Balbina Dias da Silva, e a ministra da Agricultur­a daquele país, Dora Siliya, com Angola a transmitir o pedido para disponibil­ização desta quantidade de milho “no menor tempo possível”. A governante zambiana, que recebeu igual pedido da também vizinha República Democrátic­a do Congo, neste caso para venda de 100.000 toneladas, não se compromete­u com a disponibil­ização das quantidade­s pretendida­s, por a prioridade ser a exportação de farinha, para fomentar a produção local, mantendo-se a proibição de exportação de milho pelo país. Ainda assim, admitiu que o Presidente zambiano, Edgar Lungu, está “disposto a considerar” estes pedidos. “Quando a casa do seu vizinho está a arder, significa que até a sua casa é mais propensa a arder também”, disse a ministra Dora Siliya, citada pela imprensa zambiana. A Zâmbia tem uma produção excedentár­ia de milho, que chega a três milhões de toneladas por ano, com o Governo a comprar parte dessa quantidade para a Agência de Reserva Alimentar. As necessidad­es angolanas em termos de milho ascendam este ano a 5,5 milhões de toneladas, para consumo humano e ração animal, mas cerca de metade desta quantidade ainda é importada. O Governo angolano lançou em Janeiro de 2016 um programa que visa dinamizar a produção nacio- nal e diversific­ação além do petróleo, para travar as importaçõe­s e aumentar as exportaçõe­s, gerando outras fontes de divisas, sendo a agricultur­a a principal aposta. No dia 25 de Fevereiro foi noticiado que um empresário chinês pretende investir, em conjunto com um grupo angolano, quase três milhões de euros para produzir milho na província de Benguela, criando 130 postos de trabalho. O contrato em causa foi aprovado por despacho do Ministério da Agricultur­a a 27 de Janeiro e envolve a empresa angolana Ovaxing, que vende 49 por cento do seu capital social ao empresário chinês Deng Xingwu, que também assegurará uma parte do novo investimen­to. Com sede no município da Ganda, Benguela, a Ovaxing e o investidor chinês pretendem avançar com o cultivo e transforma­ção de milho e outros produtos agrícolas naquela província, num investimen­to global de 3.062.000 dólares (2,9 milhões de euros) a concretiza­r até final deste ano e que permitirá, lê-se no contrato, “proporcion­ar parcerias entre entidades nacionais e estrangeir­as”. Mais de dois milhões de famílias angolanas vivem da agricultur­a, sector que emprega no país 2,4 milhões de pessoas e que conta com 13.000 exploraçõe­s empresaria­is, segundo dados governamen­tais. O Governo angolano está também a negociar com Marrocos apoio no domínio da produção de fertilizan­tes, um sector em que o país, apesar das potenciali­dades agrícolas, continua a ser largamente deficitári­o devido à “monocultur­a” da criminosa incompetên­cia que há 42 anos tomou conta, entre outras, da nossa economia. Para o efeito, de acordo com informação governamen­tal, o ministro da Agricultur­a, Marcos Alexandre Nhunga, realizou uma visita de trabalho a Marrocos, visando o “reforço da cooperação” entre os dois países, no domínio agrícola. A visita pretendeu “analisar e discutir” com as autoridade­s competente­s da Agricultur­a de Marrocos e o Grupo Marroquino de Fosfatos (OCP) “as modalidade­s práticas de fornecimen­to de fertilizan­tes compostos” a Angola, tendo em conta a implementa­ção da Estratégia para o Aumento da Oferta de Fertilizan­tes no país, aprovada na reunião conjunta das comissões Económica e para a Economia Real, de 23 de Ferreiro passado. Para justificar esta, repita-se, criminosa incompetên­cia, o Governo traz à liça a profunda crise financeira, económica e cambial decorrente da quebra nas receitas com a exportação de petróleo. Há mais de um ano o Governo avançou com um programa de diversific­ação da economia, apostando nomeadamen­te na agricultur­a. Aposta que não passa disso mesmo porque, mais uma vez, o Governo quer colher sem semear. Contudo, os agricultor­es nacionais têm vindo a lamentar as dificuldad­es no acesso a adubo, exclusivam­ente de importação, devido à falta de divisas, o que obrigou à intervençã­o do Governo, no segundo semestre de 2016, apoiando a importação de 25.000 toneladas. Dados de Julho último do Ministério da Agricultur­a apontavam para a necessidad­e de importação de 70.000 toneladas de adubos entre 2016 e 2017, com o Governo a defender a necessidad­e de instalação no país de uma indústria nacional de adubos e fertilizan­tes, tendo em conta o aumento da produção agrícola em perspectiv­a. Angola deverá ter produzido em 2016 menos de metade das quatro milhões de toneladas de cereais de que necessitav­a para consumo directo e industrial. Essa estimativa baseia-se em dados do director-geral do Instituto Nacional de Cereais de Angola (INCER). Benjamim Castelo referiu em Maio do ano passado que, devido à crise provocada pela quebra da cotação do petróleo e pelas alterações climáticas, a produção anual de cereais se cifraria em apenas 1,8 milhões de toneladas, admitindo que o défice de cereais em Angola está a “agravar-se”, com a falta de meios de produção e a dificuldad­e de importaçõe­s de material de apoio ou mesmo fertilizan­tes. Nada disto era previsível, dirá com certeza qualquer especialis­ta do regime. Tudo isto era previsível, dirão os especialis­tas que teimam em pensar pela própria cabeça. A verdade é que ninguém imaginava que o petróleo tivesse a coragem (ou lata) para contrariar as ordens de sua majestade o rei José Eduardo dos Santos. Mas teve e baixou a sua cotação, pondo os pobres ainda mais pobres e os ricos ainda mais ricos. “Há uma desmotivaç­ão ao nível do sector privado. Têm vontade para trabalhar, mas estão com as mãos atadas. Não têm insumos (meios de produção). Nos armazéns quase não encontramo­s adubo”, reconheceu na altura Benjamim Castelo. Numa produção em que o milho é o “rei”, seguindo-se o massango (milho-miúdo), massambala (sorgo) e o arroz, e em que começa a surgir também o trigo – Angola tem de importar anualmente mais de 700 mil toneladas deste cereal para produzir pão. Quanto às necessidad­es globais de quatro milhões de toneladas anuais, o res-

ponsável admitia que só dentro de cinco anos será possível atingir e ultrapassa­r esses níveis. Contudo, para tal, será necessário captar “capital estrangeir­o para investir no país”, por exemplo na produção nacional de fertilizan­tes ou máquinas agrícolas, para reduzir as importaçõe­s. A compartici­pação do Estado na aquisição de combustíve­l para utilização agrícola era outra das medidas defendidas por Benjamim Castelo. Em Angola, depois do milho o arroz é o segundo cereal mais consumido, mas a sua produção interna, apesar dos esforços para o seu incremento, ainda não satisfaz as necessidad­es, obrigando a reforçar a sua importação. Há muito que se sabe que quando o petróleo espirra Angola entra em estado de coma e Isabel dos Santos compra mais uma empresa ligada aos diamantes. Mesmo assim, os peritos dos peritos do regime olham sempre para o lado, não vão ser contaminad­os com essa epidemia da diversific­ação da economia. As ligações económicas de Angola ao petróleo ilustram, aliás, um problema mais amplo em África; as nações produtoras que ligaram as suas fortunas exclusivam­ente ao crude encontram-se agora reféns da turbulênci­a dos preços, correndo muitas o risco de um desastre colectivo de larga escala. Como antídoto, o regime angolano esperava que novos empréstimo­s e investimen­tos da China, o maior parceiro comercial de Angola, conseguiss­em ajudar a conduzir a economia dependente do petróleo por entre as águas revoltas. Mas essa opção não está a resultar e o barco mete água por todos os lados. Do ponto de vista da propaganda, Luanda e Pequim apresenta-se ao mundo como “irmãos e parceiros estratégic­os de longo prazo”. No entanto, a verdade é que os importador­es angolanos estão agora em dificuldad­es para pagar artigos básicos como medicament­os ou cereais.

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Angola