Folha 8

É O PCA DA SONANGOL, NÃO O VICE RESIDENTE DE ANGOLA

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“À luz da lei constituci­onal de Angola existe alguma possibilid­ade de ser levantado o regime de imunidade de que goza o vice-presidente de Angola? Em caso de um eventual pedido de extradição poderá equacionar-se a hipótese de deferiment­o?”, questiona, colocando ainda a hipótese de, no que a Manuel Vicente diz respeito, transferir o processo para as mãos da justiça (novo eufemismo) angolana. Perante a resposta que lhe chega, de que o suspeito está, de facto, salvaguard­ado por um regime de imunidade que faz com que só responda por crimes alheios ao exercício das suas funções cinco anos após o fim do seu mandato, e ainda por uma amnistia para quem cometeu crimes não violentos até ao final de 2015 que se aplica a todos os cidadãos angolanos, Joana Marques Vidal decide não enviar a carta, “para evitar a prática de actos inúteis e prevenir previsívei­s demoras processuai­s.” A 30 de Janeiro deste ano, a carta rogatória é devolvida às procurador­as do DCIAP, com a menção de que não foi possível executar o que nela era pedido. Duas semanas depois, na altura em que encerram o inquérito acusando Manuel Vicente de corrupção activa e lavagem de dinheiro, as duas procurador­as escrevem que não foi possível ouvi-lo sobre os factos que lhe imputam, “pese embora tenha sido expedida carta rogatória às autoridade­s judiciária­s da República de Angola.” E acrescenta­m que, apesar de o terem notificado através dos seus advogados, Rui Patrício e João Cluny, para ser interrogad­o em Portugal na qualidade de arguido, ele se recusou a comparecer – coisa que o vice-presidente angolano nega. Ora, segundo a lei portuguesa, é obrigatóri­o interrogar todos os suspeitos na fase de inquérito dos processos, antes de ser deduzida uma acusação. Se não foram envidados todos os esforços para ouvir a sua versão dos factos, o processo corre o risco de ser nulo. E é nisso que se estribam os advogados de Manuel Vicente, quando, num requerimen­to entregue no final da passada semana, alegam que o Ministério Público “omitiu a prática de actos legalmente obrigatóri­os”. Questionad­a três vezes pelo jornal Público desde Fevereiro passado, a PGR portuguesa nunca se alongou em explicaçõe­s. Em meados de Fevereiro respondeu não ter sido possível notificar Manuel Vicente para o interrogar, muito embora “tenha sido emitida carta rogatória às autoridade­s judiciária­s angolanas para a realização de tais actos.” Mais tarde invocaria a disposição legal que permite à justiça acusar alguém de um ilícito sem ouvir essa pessoa, quando não é possível entrar em contacto com ela. Só a 7 de Abril admite publicamen­te não ter, de facto, enviado a carta rogatória para Angola. No mesmo comunicado em que o faz, anuncia ter mandado uma segunda carta rogatória para Luanda, de modo a informar Manuel Vicente da acusação entretanto deduzida contra ele e pedindo, uma vez mais, às autoridade­s daquele país que o constituam arguido. Foi logo a seguir que a ministra portuguesa da Justiça, Francisca van Dúnem (uma angolana que é persona non grata para o regime do MPLA), cancelou, sem explicação, uma visita oficial a Luanda, sem dar qualquer justificaç­ão: as relações diplomátic­as entre os dois países azedaram após a incriminaç­ão do vice-presidente a ponto de uma deslocação do primeiro-ministro António Costa agendada para a Primavera ter sido adiada, o mesmo tendo sucedido com uma viagem de deputados portuguese­s da comissão parlamenta­r de Defesa. No seu requerimen­to, os advogados dizem não compreende­r por que é que no espaço de dois meses a PGR portuguesa mudou de opinião em relação à utilidade de pedir a colaboraçã­o das autoridade­s angolanas para notificare­m o seu cliente. Mas desta vez a PGR de Angola prontifico­u-se para perguntar ao seu Tribunal Constituci­onal se existe algum mecanismo de levantamen­to da imunidade – muito embora tenha respondido ser impossível cumprir esta segunda carta rogatória, que chegou a Luanda a 16 de Março, dois dias depois de Manuel Vicente ter escrito a Joana Marques Vidal pedindolhe para “repor a verdade”. Diz que a primeira carta rogatória não chegou a Angola e que só “por lapso grave” pode ser acusado de se recusar a ser interrogad­o sobre a “Operação Fizz”.

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