É TUDO UMA QUESTÃO DE RAIO (QUE OS PARTA)
VIVER EM LUANDA E VOTAR NO NAMIBE
OS eleitores de Luanda queixam-se de, comprovadamente, terem sido colocados em cadernos eleitorais a mais de mil (1.000) quilómetros e outros ainda desconhecem em que locais deverão votar nas eleições gerais de 23 de Agosto por não constarem dos cadernos. E estão com sorte. Com um pouco mais de esforço a sucursal do MPLA (a CNE) poderá pô-los a votar noutro país. Residente do município de Cacuaco, zona da CAOP-B, em Luanda, Antonica Fernando Gouveia contou que, pese embora ter dado pontos de referência aquando do processo de registo eleitoral, com actualização do seu cartão eleitoral, “não sabe até agora onde vai votar”. “Porque nos arredores temos cerca de três assembleias de voto e, pela mensagem que enviámos à Comissão Nacional Eleitoral [CNE], ela dirige-nos para um outro local e mesmo na igreja em que nos foi indicada não encontramos nenhuma assembleia de voto”, disse. Tudo normal, portanto. Se disserem à CNE que vão votar no MPLA ela resolve o problema e até é capaz de ir à casa dos eleitores buscar o voto. Se falarem que vão votar noutro partido, aí a coisa complica-se ainda mais. Já Simões António, de 31 anos, revelou que foi transferido de Luanda, onde reside, para votar na província do Namibe, a mais de mil quilóme- tros de distância, desconhecendo as motivações, uma vez que fez a actualização do cartão de eleitor e a prova de vida na capital angolana. Também não é para perceber. É mesmo assim que o regime do MPLA funciona. “De seguida indiquei a zona onde vivo, que é na Funda Escola 8012, mas agora, quando consultei onde votar, a informação que me foi dada é que terei de votar na província do Namibe, município do Tômbwa, Escola João Firmino, mesa n.º 4”, explicou. A pé é capaz de ser demorado. Se calhar o melhor é ir de bicicleta. Não será, senhores da CNE? É uma situação que, acrescentou, o deixa “muito triste” porque o impede de votar. “Até ao momento a CNE não me consegue justificar como é que o meu nome foi parar tão longe do local onde vivo”, lamentou. “Agora como é que eu fico se as eleições são já na próxima semana”? questionou. Pois é. O melhor mesmo é… A CNE constituiu 12.512 assembleias de voto, que incluem 25.873 mesas de voto, algumas a serem instaladas em escolas e em tendas por todo o país, com o escrutínio centralizado nas capitais de província e em Luanda, estando 9.317.294 eleitores em condições de votar. No passado dia 12, a CNE informou que a indicação do ponto de referência dado pelos eleitores no acto de registo eleitoral não determinava a sua assembleia de voto, face às dúvidas levantadas pela oposição. A porta-voz da sucursal do MPLA para as questões eleitorais (CNE), Júlia Ferreira, respondia às dúvidas levantadas na véspera, em conferência de imprensa, pela UNITA, sobre uma alegada transferência de eleito- res para mesas de voto distantes da área de registo. Outros eleitores, como Adriano João, residente em Luanda e cujo nome consta dos cadernos eleitorais da província da Lunda Norte, a cerca de 1.100 quilómetros, manifestaram também a sua inquietação. Estes cidadãos cometem o erro de julgar que Angola é aquilo que nunca foi nos seus 42 anos de independência: uma democracia e um Estado de Direito. É claro que Adriano João não vai de Luanda para a Lunda Norte para votar. Mas pode ficar descansado. O voto correspondente ao seu nome vai aparecer na urna e, é claro, com o X no quadrado do MPLA. O cidadão, de 36 anos, exige “explicações”, para “perceber” como se processou esta “transferência” para “tão longe das referências” dadas aquando da actualização e prova de vida, na fase do registo eleitoral, que terminou em Março. “Então, quando fui confirmar a minha assembleia de voto, a informação que me foi passada pela CNE é que o meu nome saiu no Dundo, para meu espanto. Estou preocupado com esta situação”, apontou. Já Baptista Domingos revelou que, mesmo após ter solicitado a segunda via do seu cartão de eleitor, da parte da CNE tem recebido “informações desencontradas” sobre se vai ou não votar nas eleições gerais de 23 de Agosto. “Primeiro fui a um posto da CNE e disseram-me que o número do meu cartão não constava da base de dados, mas o meu grupo aparece em nome de uma outra pessoa e não sei como esse tipo de coisas acontece”, afirmou. Inconformado com a explicação, referiu que contactou os agentes eleitorais que estão a circular pelas ruas com “os tablets”, nos quais “já aparecem todos os dados completos, mas não conseguem indicar a assembleia de voto”. “Isto está a deixar-me muito triste porque eu quero exercer o meu direito de voto”, atirou. Sem saber onde votar no dia 23 de Agosto está também Adriano Sandendo, de 23 anos, afirmando que o seu nome “não consta da base de dados”, mesmo após ter solicitado já a segunda via do cartão de eleitor. “Deste modo, nem assembleia de voto tenho, estou preocupado porque nestas condições não poderei votar”, sublinhou.