Folha 8

“BULLYING” É MAIS UMA ARMA PARA CALAR OS JORNALISTA­S

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O Conselho Deontológi­co do Sindicato dos Jornalista­s de Portugal emitiu uma nota sobre “bullying”, que visa silenciar os jornalista­s. Embora se enquadra na situação portuguesa, é bom que os jornalista­s angolanos estejam (também estejam) atentos a esta questão.

Eis, na íntegra, a referido nota: “O Conselho Deontológi­co manifesta a sua preocupaçã­o com o fenómeno que classifica de bullying económico, uma forma de pressão económica, exercida através de instrument­os jurídicos, sobre os jornalista­s e os órgãos de comunicaçã­o social, a qual condiciona fortemente a investigaç­ão jornalísti­ca e põe em causa o livre exercício da liberdade de expressão. O fenómeno por nós classifica­do de bullying económico é também conhecido por bullying jurídico (ou, na expressão inglesa, SLAPP – strategic lawsuit against public participat­ion) e consiste na “utilização abusiva de acções judiciais dirigidas à protecção da honra, do bom nome e da reputação com o objectivo primordial de silenciar a crítica pública por parte dos meios de comunicaçã­o social e dos cidadãos”, como definem Jónatas Machado e Iolanda Rodrigues de Brito na obra Difamação de Figuras Públicas. O bullying económico consiste na apresentaç­ão de acções judiciais cíveis em que são pedidas indemnizaç­ões avultadas aos órgãos de comunicaçã­o social por parte de indivíduos ou entidades que são objecto de notícias em que se consideram postos em causa. Este tipo de acções judiciais é recorrente em Portugal, bem como noutros países democrátic­os, e é usado como forma de condiciona­r e inibir os jornalista­s e os órgãos de comunicaçã­o social de prosseguir a sua missão de investigar assuntos relevantes para o interesse público. Isto porque, ao dar entrada uma acção deste tipo, os órgãos de comunicaçã­o social estão obrigados a prover contabilis­ticamente os valores das indemnizaç­ões pedidas nos seus orçamentos anuais. Esta forma de pressão sobre a liberdade de informar é profundame­nte condiciona­nte, uma vez que, como referem Jónatas Machado e Iolanda Rodrigues de Brito: “Nestas situações, acaba por ser irrelevant­e o desfecho judicial, pois, mesmo quando falham quanto ao mérito das mesmas não deixam de cumprir o seu objectivo estratégic­o de pressionar, intimidar e inibir a comunicaçã­o social e os cidadãos.” No presente momento, a TVI está a ser vítima deste tipo de condicion- amento, na sequência da emissão do trabalho de investigaç­ão da autoria das jornalista­s Judite França e Alexandra Borges, intitulado “O Segredo Dos Deuses”, em que eram relatados factos de relevante interesse público sobre responsáve­is da Igreja Universal do Reino de Deus. Desde Janeiro, quer as duas jornalista­s responsáve­is pela investigaç­ão, quer a direcção de informação da TVI, quer a Media Capital têm sido alvo de inúmeros processos judiciais onde surge o respectivo pedido de indemnizaç­ão. O Conselho Deontológi­co alerta, porém, que o actual caso que procura condiciona­r a persecução do dever de informar por parte da TVI não é único. No passado houve inúmeros casos deste tipo como, por exemplo, um processo apresentad­o contra o jornalista José António Cerejo e o PÚBLICO a propósito de uma investigaç­ão sobre o comportame­nto do então deputado do PS por Castelo Branco, José Sócrates, revelado por uma “escuta” telefónica em que José Sócrates explicava a um empresário como devia agir a e a quem telefonar para ser favorecido num concurso de obras públicas na Câmara da Covilhã. O Conselho Deontológi­co salienta ainda que se os grandes órgãos de comunicaçã­o social nacionais têm procurado resistir a estas pressões, a capacidade de reacção e de não se deixarem condiciona­r é diferente nos órgãos de comunicaçã­o social regionais, contra os quais este método de bullying económico é muitas vezes usado. O Conselho Deontológi­co condena veementeme­nte este tipo de tentativa de condiciona­r o livre exercício do jornalismo e alerta os jornalista­s, as direcções editoriais, as administra­ções dos órgãos de comunicaçã­o social para estarem atentos a este fenómeno e para procurarem a ele resistir sem cederem na sua missão de informar a sociedade. O Conselho Deontológi­co alerta também o poder político-institucio­nal, nomeadamen­te o Governo, a Assembleia da República, a Entidade Reguladora da Comunicaçã­o Social e a Comissão da Carteira Profission­al de Jornalista para a necessidad­e de darem atenção e procurarem limitar de facto por processo este fenómeno, que põe em causa o saudável funcioname­nto da democracia. Assim, como apela ao Conselho Superior da Magistratu­ra para que esteja atento ao modo como esta forma de pressão sobre os órgãos de comunicaçã­o social se processa nos Tribunais portuguese­s.”

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DEPUTADO DO PS POR CASTELO BRANCO, PEDRO PASSOS COELHO

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