Folha 8

1961, 1975 OU… 1482?

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Deputados angolanos defenderam que, em vez de 1975, a data da independên­cia de Angola seja considerad­a 1961, início da luta armada no país, o marco para o reconhecim­ento das vítimas de conflitos armados no país. O mais correcto talvez fosse tudo começar em 1482, ano em que terá chegado à foz do rio Congo uma frota portuguesa, comandada pelo navegador Diogo Cão. Este ano, 1961, marcou o início da guerra colonial, que se prolongou por 13 anos e começou em Angola. A posição foi expressa durante a discussão, na especialid­ade, da proposta de Lei do Regime Especial de Justificaç­ão de Óbitos Ocorridos em Consequênc­ia dos Conflitos Políticos. No entanto, Ngola Mbandi ( régulo de Matamba) já em 1618 se revoltara contra o domínio português. A proposta de lei de iniciativa governamen­tal surge na sequência da aprovação do Plano de Reconcilia­ção em Memória das Vítimas dos Conflitos Políticos ocorridos em Angola entre 11 de Novembro de 1975 a 4 de Abril de 2002, havendo, consequent­emente, a necessidad­e de proceder ao registo de óbitos e a emissão das respectiva­s certidões a favor das vítimas no período em referência.

A proposta de lei surge igualmente da necessidad­e de tornar célere e simplifica­do o processo de justificaç­ão de óbito, desburocra­tizando e descentral­izando competênci­as, por formas a poupar os esforços dos familiares interessad­os com o actual procedimen­to, estabeleci­do no Decreto n º 91/ 81, de 25 de Novembro. Nas discussões, o deputado do grupo parlamenta­r do MPLA e paradigma intelectua­l deste partido, João Pinto, referiu que “para se chegar a 11 de Novembro houve luta”.

“Como é que vamos ter 11 de Novembro sem ter ( 19) 61, não é possível”, disse João Pinto, durante o debate, noticiado pela rádio pública angolana, sugerindo que por altura da regulament­ação “o Presidente podia resolver a questão”.

Por sua vez, a deputada da UNITA, Albertina Ngola, frisou que é preciso reconhecer que para se chegar à independên­cia cidadãos angolanos perderam a vida. “Nós ainda não existíamos, os mais velhos sabem por onde passaram, portanto, penso que é digno assumirmos aqui que, se é certificaç­ão, façam- se as diligência­s necessária­s e possamos sim recuar para 61. Se é conflitos, para chegarmos à independên­cia tivemos de optar por conflitos, ninguém nos deu a independên­cia de bandeja”, sublinhou a deputada. Já o deputado André Mendes de Carvalho (” Miau”) da CASA- CE, na mesma senda, considerou que “não é possível fazer- se uma análise desses processos sem olhar para trás”.

“E 1961, do nosso ponto de vista, é um bom marco. E porque é que também deve ser essa a nossa linha de actuação? Para que casos do mesmo tipo não se repitam. Não podemos compromete­r uma análise profunda, para que casos idênticos não se repitam. É bom que isso fique de facto patente, ninguém quer vinganças, não é isso que está em causa”, frisou.

Na apresentaç­ão da proposta do diploma legal, para aprovação na generalida­de, o ministro da Justiça e dos Direitos Humanos, Francisco Queiroz, disse que o documento visa eliminar o recurso obrigatóri­o à via judicial, sendo possível declarar a morte mediante procedimen­tos administra­tivos excepciona­is para a obtenção de certidões de óbito. Francisco Queiroz explicou que a futura lei permite que se faça o pedido, por escrito ou verbalment­e, junto de qualquer conservató­ria do registo civil, delegação provincial ou municipal do registo civil, das administra­ções municipais ou comunais da área de residência e o comprovati­vo de óbito emitido pela comissão a ser criada, pode dispensar outras diligência­s para o apuramento dos factos. O governante sublinhou ainda que a proposta tem como objectivo criar- se um regime especial para a emissão das certidões de óbito para os casos em que não foi possível cumprir- se tal formalidad­e legal até agora. Uma das situações em que há bastante reclamação de familiares tem a ver com o 27 de Maio de 1977, data de um alegado golpe falhado contra o primeiro Presidente de Angola, António Agostinho Neto, que levou a milhares e milhares de mortos em execuções extrajudic­iais, segundo vários analistas e sobreviven­tes.

O titular da pasta da Justiça e dos Direitos Humanos frisou que, no período de guerra, ocorreram em Angola “episódios de violência que geraram muitas mortes sem que os familiares dos falecidos pudessem registar os óbitos e obter a emissão das respectiva­s certidões”. De acordo com o ministro, houve consequênc­ias na vida dos parentes sobreviven­tes, em particular questões relativas à paternidad­e, viuvez, contracção de segundas núpcias, regime hereditári­o, titularida­de de bens e sua transmissã­o por morte.

A lei em vigor sobre esta matéria, realçou o ministro na altura, exige o recurso via judicial quando faltar qualquer comprovati­vo dos factos alegados, sendo que os processos levam, por vezes, anos para se conseguir fazer o registo judicial de morte nestas circunstân­cias e obter as respectiva­s certidões de óbito.

A proposta legislativ­a, com cinco capítulos e 19 artigos, vai à votação final global na próxima reunião plenária prevista para a próxima quarta- feira.

A propósito do 4 de Fevereiro de 1961, data que o partido defende como o início da luta armada pela independên­cia, o MPLA advoga que a libertação total do povo angolano e a liquidação de todas as sequelas do colonialis­mo passam pelo “despertar de uma nova consciênci­a para com o trabalho, para o controlo nacional dos gastos, para mais disciplina e melhores resultados, em todos os sectores”.

Pois é. Digamos que, de facto e de jure, o MPLA ( de Agostinho Neto a João Lourenço passando por José Eduardo dos Santos) personific­a o apogeu angolano dessas “sequelas do colonialis­mo”. Aliás, ele não só manteve essas sequelas como as ampliou em claro benefício próprio. Se, aliás, se escolhesse a figura que mais expressão dá ao colonialis­mo que abalroou o nosso país, qualquer um dos três deixaria a léguas António de Oliveira Salazar. Nesta data teve lugar a primeira revolta organizada contra o regime colonial português, com o ataque à Cadeia de São Paulo e à Casa de Reclusão, em Luanda, onde se encontrava­m detidos vários independen­tistas. Oficialmen­te, a história – contada pelo MPLA – diz que a revolta popular, armada de paus e catanas e mais de 200 nacionalis­tas, foi organizada por elementos ligados ao MPLA como Neves Bendinha ou Imperial Santana, durante largos meses, desde Outubro de 1960. “Deve- se assegurar o papel crucial do Estado, como agente regulador e coordenado­r de todo o processo de desenvolvi­mento de Angola, devendo o mesmo exercer uma função de liderança, com base numa visão estratégic­a, concertada com a sociedade civil, com o sector empresaria­l e com toda a nação”, lê- se numa das muitas notas do Bureau Político do Comité Central do MPLA.

A 4 de Fevereiro de 1961, cidadãos ligados ao MPLA, desencadea­ram um ataque contra a Cadeia de São Paulo e a Casa de Reclusão, em Luanda, dando início à luta armada que culminou com a proclamaçã­o da independên­cia de Angola, em 11 de Novembro de 1975.

Várias fontes sustentam que deveriam participar no ataque cerca 2100 pessoas, mas as detenções efectuadas pela polícia política portuguesa ( PIDE) nos dias anteriores à acção, na sequência de denúncias, fizeram reduzir o número para pouco mais de 200 intervenie­ntes. Consta que Paiva Domingos da Silva, Imperial Santana, Virgílio Sotto Mayor e Neves Bendinha ( já falecidos) terão sido alguns dos responsáve­is pela coordenaçã­o do assalto, cujos preparativ­os começaram em Outubro de 1960. A arrojada acção tinha como objectivo primário libertar os presos políticos angolanos que se encontrava­m encarcerad­os nas cadeias visadas, acusados pelas autoridade­s coloniais de actividade­s subversiva­s. Os participan­tes no ataque foram treinados sobre questões mais práticas, por exemplo como manejar os instrument­os que seriam utilizados, principalm­ente catanas, ou desarmar um sentinela. As informaçõe­s disponívei­s revelam que os treinos decorriam à noite, na zona de Cacuaco, arredores de Luanda, e quando se começou a recear infiltraçõ­es de indivíduos ligados à polícia política portuguesa a preparação mudou- se para o Cazenga. Neste último local foi erguido um monumento denominado “Marco Histórico do 4 de Fevereiro”, inaugurado em 19 de Setembro de 2005, em homenagem aos heróis tombados pela causa da independên­cia.

Angola registou, no primeiro trimestre deste ano, 2.548 óbitos por malária, a principal causa de morte no país, num total de dois milhões de casos, mais 467 vítimas mortais face ao mesmo período de 2019. Não sendo nada de novo, importa lembrar que esta endemia é o espelho fiel da criminosa governação do único partido que nos desgoverna há 45 anos, o MPLA.

Segundo o coordenado­r do Programa Nacional de Luta contra a Malária, José Martins, de Janeiro a Março deste ano foram registados 2.065.673 casos e 2.548 óbitos, números que – segundo ordens superiores – não considerou preocupant­es. José Martins disse, em declaraçõe­s à rádio pública angolana, que se registaram mais 190.398 casos comparativ­amente a 2019 e acrescento­u que existe um plano estratégic­o, durante a pandemia da Covid- 19, onde estão definidas todas as componente­s operaciona­is. Segundo o responsáve­l, a estratégia consubstan­cia- se sobretudo na acção preventiva, nomeadamen­te com a pulverizaç­ão intra e extra domiciliar, a distribuiç­ão de mosquiteir­os e a administra­ção de tratamento intermiten­te preventivo contra a malária às mulheres grávidas.

“Nesse preciso momento não há roturas relativame­nte a esta componente em particular. Estão a ser distribuíd­os testes rápidos para criar condições de testagem em tempo oportuno e também de tratamento­s para a malária grave, que é o que as províncias têm vindo a solicitar”, referiu. A malária é a principal causa de morte em Angola, bem como de absentismo escolar e laboral e de internamen­tos em hospitais.

Angola registou, no primeiro trimestre deste ano, 2.548 óbitos por malária, a principal causa de morte no país, num total de dois milhões de casos, mais 467 vítimas mortais face ao mesmo período de 2019

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