Folha 8

TEMPO DA CATARSE

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O senhor e o seu governo ainda estão a tempo de fazer a catarse e a redenção sobre esse passado medonho. Em vez de agir igual a um chefe partidário ou igual a um caudilho, o senhor no mais alto posto da governação do país tem a obrigação de optar por outra linhagem. A linhagem da democracia

O senhor e todos os seus pares, em resumo, devem tomar consciênci­a que num Estado Constituci­onal de Direito as decisões políticas dos governante­s se fundam no respeito pelos direitos de liberdade e no respeito pelos direitos sociais, os quais jamais podem ser postos em causa ou feridos. O mesmo se pode dizer de outros valores, igualmente sagrados: o direito à vida, o direito à integridad­e física e o respeito pela saúde dos cidadãos.

Eis- nos chegados, enfim, ao ponto nevrálgico desta matéria. O ditatorial­ismo de Agostinho Neto espoliou a sociedade angolana daqueles valores, arrasou- os de forma brutal numa acção dantesca só vista em regimes políticos sanguinári­os. Oprimido por esta ciranda de abusos e sofrimento­s, o país permanece até à data petrificad­o em traumas difíceis de sarar. Entretanto, a sua administra­ção, senhor general, apareceu a propor ( ou, melhor, a impor) uma agenda de reconcilia­ção nacional para expurgar da sociedade aqueles males. É caso para perguntar: como, com que métodos? As respostas do senhor ministro da Justiça, no mínimo, têm- se revelado ambíguas e totalmente despidas de respeito pelo sofrimento de quem perdeu a vida ou sobreviveu por anos a todos os estigmas de violência e humilhação. Não se encaixa na equação política de um governo sério o que os senhores do MPLA pretendem com o “aclarament­o” da questão do 27 de Maio. Os artifícios frívolos do senhor ministro são notórios e repetidos e não afiançam nada de bom. No ar pairam muitas mentiras, por isso já se percebeu onde o governo quer chegar: exonerar Neto de qualquer responsabi­lidade no tocante aos crimes de lesa- humanidade e conservar embalsamad­a outra verdade: a vontade perversa de Neto no dia 27 de Maio de liquidar a oposição interna do MPLA e exercer um domínio absoluto, férreo, sobre o partido e a sociedade. Assim sendo, a única porta de saída para todo este imbróglio em torno da reconcilia­ção criado pelo seu governo ( que misturou o 27 de Maio com conflitos armados, formando com isso um cocktail disparatad­íssimo) é o senhor general pedir perdão e reconhecer a hecatombe causada pela ditadura de Agostinho Neto. Reconhecer que o império do crime esteve no comando do país durante todo aquele período. As figuras dos criminosos têm um valor arquetípic­o de tal importânci­a histórica que as gerações do presente e do futuro precisam de as conhecer de molde a evitar- se que as tragédias de ontem se repitam. Por conseguint­e, senhor general, não lhe resta outra atitude senão pedir perdão, se for realmente preocupaçã­o sua sair engrandeci­do desta história e colher a admiração indistinta de todos os cidadãos.

O senhor e todos os seus pares, em resumo, devem tomar consciênci­a que num Estado Constituci­onal de Direito as decisões políticas dos governante­s se fundam no respeito pelos direitos de liberdade e no respeito pelos direitos sociais, os quais jamais podem ser postos em causa ou feridos

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