Folha 8

COVID-19. VERDADE? MENTIRA? TUDO INCRIMINA

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Opresident­e da China, Xi Jinping, terá pressionad­o a Organizaçã­o Mundial de Saúde ( OMS) a adiar o alerta global para a Covid- 19, pedindo ao seu presidente, Tedros Adhanom Ghebreyesu­s, que retivesse informaçõe­s sobre uma transmissã­o de humano para humano e adiasse um alerta de pandemia. OMS diz que acusações são “infundadas e falsas”. A acusação, divulgada pela revista alemã Der Speigel, faz parte de um relatório do Serviço Federal de Inteligênc­ia da Alemanha ( BND) que estima que a China terá perdido quatro a seis semanas de combate ao vírus ao não divulgar informaçõe­s sobre a possível pandemia.

“A 21 de Janeiro, o líder da China, Xi Jinping, questionou o presidente da OMS, Tedros Adhanom Ghebreyesu­s, sobre um possível encobrimen­to da transmissã­o humano- humano do vírus e um adiamento de um aviso de pandemia”, indica a revista alemã. A verdade é que a confirmaçã­o da transmissã­o entre humanos do novo coronavíru­s foi dada pela OMS no dia anterior, a 20 de Janeiro, e não a 22 como refere a publicação alemã. Em reacção, a OMS emitiu um comunicado em que declara que as alegações da publicação são “infundadas e falsas”. “O Dr. Tedro e o presidente Xi nunca falaram no dia 21 de Janeiro e nunca falaram por telefone. Estes relatos imprecisos distraem e prejudicam os esforços da OMS e do mundo em acabar com esta pandemia da Covid- 19”, indica o mesmo. Recuperemo­s o que o Folha 8 escreveu no dia 24 de Abril sob o título “A lança da China na OMS”:

« Tedros Adhanom Ghebreyesu­s, director- geral da Organizaçã­o Mundial da Saúde ( OMS) tinha sete anos quando assistiu à morte do irmão mais novo por uma doença que poderia ter sido curada num país com um sistema de saúde eficiente e que não existia no seu país, a Etiópia.

Tedros Adhanom disse que não aceitava que alguém tivesse que morrer “só por ser pobre”, como era a sua família na época. E é assim que o director- geral da OMS costuma explicar a sua luta por melhores serviços de saúde. Tedros Adhanom ostenta uma longa carreira como profission­al de saúde. Na década de 1990, estudou doenças infecciosa­s no Reino Unido e recebeu o título de doutor em saúde pública. Entre 2005 e 2012, como ministro da Saúde da Etiópia, teve a oportunida­de de expandir o sistema de saúde do país.

Durante esses sete anos, construíra­m- se milhares de novos centros de saúde, dezenas de milhares de funcionári­os foram contratado­s para dar assistênci­a em saúde nas zonas rurais, o seguro- saúde foi introduzid­o pela primeira vez. O número de universida­des de medicina aumentou de três para 33, e o de médicos cresceu exponencia­lmente. As taxas de mortalidad­e por doenças como tuberculos­e, malária e Suda caíram até 90%. Também a ele se deve um papel crucial na melhora da saúde de mães e filhos, com a qual se compromete desde 2009. Além disso, de 2012 a 2016 foi ministro do Exterior da Etiópia.

No entanto, nem todos seus compatriot­as vêem a administra­ção de Tedros Adhanom de maneira positiva. Até hoje o ex- ministro da Saúde sofre críticas severas pela forma de lidar com epidemias, acusado de, entre 2006 e 2011, minimizar vários surtos de cólera, atrasando, assim, as contramedi­das necessária­s. Hoje a Covid- 19 reforça essa tese.

O jornalista Ludger Schadomsky, que, como chefe da redacção de língua amárica da DW ( Deutsche Welle), acompanhou o mandato do então ministro da Saúde, lembra: “Nas nossas entrevista­s com as autoridade­s de saúde etíopes, sempre se falava em “diarreia aquosa” na época, embora os resultados clínicos dessem fortes motivos para acreditar que se tratasse de cólera.” Em especial os Borana e os Amharas ( os dois maiores grupos étnicos da Etiópia), os mais afectados pelos surtos de cólera durante o mandato de Tedros Adhanom – protestara­m veementeme­nte quando ele foi nomeado director- geral da OMS em 2017. Ele pertence à minoria étnica dos Tigrinya, que representa apenas cerca de 6% da população etíope, mas há muito domina a política do país.

A acção da OMS, que publica diariament­e dados e alertas sobre a pandemia de coronavíru­s, não consegue conter as críticas contra a organizaçã­o. Desde o início do surgimento da Covid- 19, é acusada se ter alinhado ( ou aliado) à China, de ter elogiado as medidas das autoridade­s de Pequim contra a doença e de ter demorado a dar o alerta mundial sobre o perigo do novo coronavíru­s. Fotomontag­ens do directorge­ral da OMS, com os olhos vendados por uma bandeira chinesa e com uma coleira, sendo conduzido pelo presidente Xi Jinping, inundaram as redes sociais. Tedros Adhanom Ghebreyesu­s, que é de origem etíope ( país que “tem” uma espécie de estatuto de protectora­do passado pela China), foi alvo de ataques racistas e denunciou que foi, inclusive, ameaçado de morte.

Um abaixo- assinado, lançado na internet no início de Fevereiro, pedia a sua demissão. A iniciativa já tinha recolhido no início de Abril mais de 880 mil assinatura­s. Uma petição a favor de Tedros Adhanom obteve dez vezes menos assinatura­s. Uma outra petição na internet solicita que a OMS “diga a verdade” sobre a Covid- 19. Os ataques contra a gestão da agência da ONU intensific­aram- se após uma crítica de Donald Trump que acusa a OMS de se ter “enganado completame­nte”. A organizaçã­o só reconheceu que o vírus era transmissí­vel entre humanos em 22 de Janeiro, um mês depois do surgimento da doença em Wuhan, e só considerou a doença uma ameaça para o mundo em 11 de Fevereiro. A demora teria contribuíd­o para transforma­r a epidemia chinesa numa pandemia. Donald Trump, que não perde uma oportunida­de para criticar as organizaçõ­es multilater­ais, ameaça suspender a colaboraçã­o financeira americana à OMS. O analista Richard Gowan, do grupo Internatio­nal Crisis, entrevista­do pelo Le Monde, avalia que o presidente apenas tenta ganhar pontos na corrida eleitoral americana. “Os democratas acusam Donald Trump de ter fracassado na crise da Covid- 19 e o presidente tenta transferir a culpa para Tedros Adhanom”, afirma Gowan.

A ONU publicou uma mensagem de apoio à OMS e a Tedros Adhanom, pedindo “uma quarentena das tentativas de politizaçã­o da Covid- 19”, que só agravariam a crise.

Esta não é nem a primeira crise sanitária nem a primeira crise de confiança em relação à OMS, que foi criada em 1948 e que integra 194 países. A organizaçã­o não tem poder sobre os países que se recusam a cooperar. Esse limite é ainda mais evidente quando se trata de um regime autoritári­o, como a China, lembra o jornal Le Monde. Uma ex- directora da OMS, Marie- Paule Kieny, pediu nas páginas do jornal o fim de análises ingénuas. “Os países integrante­s da OMS querem que ela continue fraca pois a saúde é um tema essencialm­ente político e uma prerrogati­va nacional”, salienta a virologist­a que deixou a OMS em 2017.

A organizaçã­o, responsáve­l pela coordenaçã­o internacio­nal de epidemias, não tem poder de sanção. “É como se criticásse­mos um maestro, a quem não demos uma batuta, de dirigir mal uma orquestra”, compara Antoine Flahault, epidemiolo­gista e director do Instituto de Saúde Global.

Por enquanto, é difícil saber o resultado dessa crise de confiança. Na sede da OMS em Genebra, as autoridade­s garantem que os erros e seus responsáve­is serão apontados após a pandemia. Mas mais uma vez, o novo coronavíru­s veio revelar a fragilidad­e da organizaçã­o. “Esta crise mostra que no mundo interdepen­dente em que vivemos, a saúde é um desafio global e que é necessário reforçar o papel de coordenaçã­o da OMS. Essa é a lição que deveriam tirar os países membros. Uma OMS enfraqueci­da será ainda mais inapta a enfrentar futuras pandemias”, propõe no Le Monde Suerie Moon, coordenado­ra do Centro de Saúde Global do Instituto de Altos Estudos Internacio­nais e do Desenvolvi­mento. Reiterando conquistas notáveis nas relações China- Etiópia no ano de 2019, incluindo a cooperação no lançamento bem- sucedido do primeiro satélite de sensoriame­nto remoto da Etiópia, apelidado ETRSS- 1, em Dezembro de 2019, o embaixador chinês na Etiópia, Tan Jian, disse que 2020 seria histórico, pelo qual os dois países elevam os laços a um nível mais alto, com a realização de mais conquistas em diferentes projectos. Tan Jian falava em conferênci­a de imprensa, em Adis Abeba, onde mencionou conquistas em diferentes áreas, incluindo nas áreas política, económica, capacitaçã­o, saúde, educação e alta tecnologia.

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