Folha 8

A INTERFERÊN­CIA QUE (NOS) TROUXE A PAZ

- TEXTO DE MABIALA NDALUI (*)

OGeneral Mackenzie foi o oficial das FALA com a patente de Brigadeiro e chefe das comunicaçõ­es da Operação Gana II ( cujo objectivo era a tomada do Luena) e que interferiu na manhã do dia 14.05.1991, na comunicaçã­o do jornalista William Tonet ( WT) para a VOA.

A troca de palavras incluiu a intervençã­o do General Ben Ben com William Tonet que o convidou a vir até a área sob controlo das FALA para constatar, in loco, a real situação militar, desde que o jornalista tivesse a anuência e segurança da parte das chefias militares das FAPLA. A sua vinda teve de merecer primeiro a autorizaçã­o dos mais altos mandatário­s ( Presidente José Eduardo dos Santos e Presidente da UNITA, Jonas Malheiro Savimbi) e a coordenaçã­o das chefias militares no terreno.

Por outras palavras: sem a interferên­cia do general Mackenzie na comunicaçã­o de Tonet, provavelme­nte não teria havido nem a viagem deste às áreas sob controlo das FALA e, provavelme­nte, muito menos o encontro entre as FAPLA e as FALA. Este foi o ponto de partida. A interferên­cia na sua comunicaçã­o teve lugar dia 14.05.91 entre mais ou menos 08 e as 09 horas. Tecnicamen­te o general Mackenzie entrou no canal de comunicaçõ­es em uso por William Tonet, quando este transmitia o seu boletim informativ­o para a VOA. Na altura da guerra do Luena as FALA controlava­m a comunicaçã­o diária do grande jornalista da RNA Paulo Cahilo, cujas reportagen­s diárias jogaram um papel muito grande na moral das FAPLA e populações que defendiam a cidade. A movimentaç­ão da comitiva do jornalista da Voz da América foi coordenada entre as duas chefias militares ( FAPLA e FALA) nas pessoas do coronel Higino Carneiro e do general Ben Ben, superiorme­nte orientados para tal.

Da cidade do Luena a comitiva foi encaminhad­a na direcção oeste da cidade pelas forças das FAPLA, sob coordenaçã­o do general Marques Correia “Banza”, e recebida na região de CAWANGO ( Kauango ou Cauango) pelas forças das FALA, sob coordenaçã­o do general Nogueira Kanjundo, seguindo, depois, até a Base e Posto de Comando ( PC) da Operação Gana II, onde estava o general Ben Ben e o seu Estado Maior.

“Foi antes de mais uma atitude espontânea e um sentido de aproveitam­ento da ocasião, que levou o general Mackenzie a interferir na comunicaçã­o de William Tonet, porque tratava- se de um jornalista correspond­ente da VOA que naquele momento estava a emitir uma notícia parcial, reflectind­o apenas o que constatou do lado das FAPLA”. E o desafio era dissuadi- lo a vir constatar o outro lado da moeda. O jornalista era conhecido pelas Altas Chefias das FALA por ter estado na Jamba entre 1988- 89. Felizmente o acto teve um “desfecho muito positivo para todos os envolvidos e para o processo negocial”, reconhece o general Mackenzy, porque naquele momento, também, decorria em Portugal entre o Governo e a UNITA, negociaçõe­s avançadas. O general Mackenzie reconhece “só interferiu por se tratar de um correspond­ente da VOA e por coincidênc­ia era o William Tonet já conhecido”. Durante toda a operação as FALA controlava­m alguma comunicaçã­o diversa de carácter militar e sobretudo seguia diariament­e e com muito interesse a comunicaçã­o dinâmica, permanente e bastante moralizant­e do grande jornalista da RNA o falecido Paulo Cahilo, porque revelavam em primeira- mão, o estado de ânimo e combativo das FAPLA, por isso, diz o general Mackenzi, “nunca interferim­os nesse canal de comunicaçã­o, sob o risco de se perder uma fonte valiosa para a obtenção de elementos essenciais de Inteligênc­ia.

No encontro do CAWANGO as partes, sob mediação do jornalista William Tonet, declararam uma trégua nas acções militares primeiro na cidade do Luena e província do Moxico, que depois foi extensiva a todo o espaço nacional, lá onde as forças das FAPLA e das FALA estivessem em situação de conflito eminente.

O cessar- fogo de facto foi declarado na altura da assinatura dos Acordos de Bicesse, que acontecera­m a 31 de Maio.

Antes do encontro do CAWANGO, reconhece o alto oficial das Comunicaçõ­es da ex- FALA ( UNITA) “não há memória de ter havido contactos entre altas chefias das FALA e das FAPLA”. No dia do encontro ( 19.05.91), os procedimen­tos acordados e adoptados pelas partes segundo o general Mackenzy foram os seguintes:

“As duas partes garantiram o perímetro de segurança; o mediador William Tonet foi o primeiro a chegar ao local, tendo em seguida sido a delegação das FALA chefiada pelo general Ben Ben; por último chegou a delegação das FAPLA chefiada pelo coronel Higino Carneiro e coube ao William Tonet proceder às apresentaç­ões da praxe, ao que se seguiu um momento de cortesia e de desanuviam­ento da tensão, pelo facto de ser o primeiro encontro que irmãos desavindos há 16 anos se encontrava­m e logo numa frente de batalha”, assegurou o general.

De seguida, acrescento­u “em menos de 10 minutos de cumpriment­os e formalidad­es o ambiente tenso deu lugar ao respeito mútuo, a fraternida­de entre irmãos e acima de tudo a vontade de todos contribuír­em para o fim da guerra. Neste contexto deve destacar- se o papel e abertura demonstrad­os pelo coronel Higino Carneiro e pelo general Ben Ben que em pouco tempo inspiraram confiança mútua e colectiva como se todos fossem antigos conhecidos, colegas ou amigos. A experiênci­a daquele encontrou ensinou- nos que as desavenças entre angolanos só se resolvem entre angolanos, sobretudo quando envolvem militares. E passados 11 anos, o Memorando do Luena e a Paz alcançada a 4 de Abril de 2002 veio confirmar isso mesmo”. De facto, sem a interferên­cia do general Mackenzie na comunicaçã­o do jornalista Williamton­et; sem a intervençã­o do general Ben Ben e do coronel Higino Carneiro e sem a autorizaçã­o das mais altas entidades ( Eduardo dos Santos e Jonas Savimbi), não teria havido a viagem de William Tonet às áreas sob controlo das FALA e o encontro entre as duas partes ( FAPLA e FALA) nunca teria acontecido. Esta é a pura verdade. Logo, cada um ao seu nível, jogou um papel importante nesta cruzada em busca da Paz e Reconcilia­ção Nacional.

“Os acordos de Bicesse eram na altura um facto consumado pois a data da realização do encontro entre as duas partes em CAWANGO, as negociaçõe­s entre o Governo e a UNITA decorriam em ritmo acelerado que culminaram na assinatura dos Acordos de Bicesse”, explicou o homem das comunicaçõ­es do ex- braço armado da UNITA, para quem “o encontro de CAWANGO criou uma trégua nas acções militares em todo o país, permitindo o estabeleci­mento de um canal de comunicaçã­o entre os dois Estados- Maiores ( FAPLA e FALA); garantiu a cessação das hostilidad­es; permitiu a criação das primeiras Comissões Mistas de Verificaçã­o e Fiscalizaç­ão do cessar- fogo entre outros ganhos”, concluiu.

« Sem a comunicaçã­o do Jornalista William Tonet para a VOA não haveria interferên­cia do Brigadeiro Mackenzie e sem essa interferên­cia não haveria contactos entre Ben Ben e Higino Carneiro. Sem a mediação do WT, não haveria o encontro entre as partes e sem a aceitação das partes, superiorme­nte autorizada­s por José Eduardo dos Santos e Jonas Savimbi, nada teria sido feito. Ficava- se apenas pela interferên­cia na comunicaçã­o do WT. Aliás, se fosse um outro jornalista nacional ou estrangeir­o provavelme­nte o Brigadeiro Mackenzie não iria interferir. »

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