Folha 8

MENTIRA, HISTÓRIA & MENTIROSOS

- WILLIAM TONET kuibao@hotmail.com

Eu tenho memória! Os mentirosos, não! As vítimas do 27 de Maio de 1977, tal como as do nazismo de 1945, têm memória! Um regime que encobre crimes de Estado, por 43 anos, finge não ter memória, apenas para branquear os crimes hediondos: cerca de 80.000 ( oitenta mil) vítimas, barbaramen­te assassinad­as, pela polícia política de Agostinho Neto: DISA, de Maio de 1977 a 1979, por motivações ideológica­s, no seio do MPLA. O ministro da Justiça, Francisco Queiroz , não tem memória, pior, mostrou, no dia 28 de Maio ( foi mera coincidênc­ia escolher a data: 28 de Maio de 1926, dia da implantaçã­o, em Portugal, do regime fascista), não querer estudar a história, do MPLA/ Estado, pós- 75, de forma imparcial, tornando- se cúmplice de uma grosseira mentira. Qualquer ser humano, com sensibilid­ade, sente revolta ao ler tanta mentira, masoquismo e falta de higiene intelectua­l, ante um problema que burila na mente de milhões de vítimas, como é o 27 de Maio de 1977. Falar- se em erro político de dois lados em que um teria atentado contra instituiçõ­es do Estado é da mais baixa e vil COVARDIA. O ministro deveria ser aconselhad­o a parar de MENTIR, sobre o genocídio do 27 de Maio, quando fala de “erro político histórico por parte de entidades políticas que contestara­m e atentaram contra o regime estabeleci­do. Esse erro político de atentar contra as instituiçõ­es do Estado teve consequênc­ias”. Causa, no mínimo, náuseas ler esta MENTIRA e o senhor não sabe da realidade, não por estar na Gabela, à época, como recruta militar, mas por resistir à verdade, intenciona­l e dolosament­e. Mostre uma instituiçã­o que tenha sido atentada, militarmen­te, pelos considerad­os fraccionis­tas? Não existe e como ministro da Justiça, nas vestes de coordenado­r de uma Comissão, deveria ser mais comedido. E, mesmo quanto a Rádio Nacional, que tanto apregoam, faça o seguinte:

a) mostre o militar armado, conotado com Nito Alves, que esteve no seu interior;

b) coloquem o RM ( registo magnético) de Nito Alves, Zé Van Dúnem, Sita Vales, Monstro Imortal, Bakalof, Sianuk proferida naquela estação, dando conta de um golpe de Estado, derrubando o governo de Agostinho Neto ( é normal que todos golpistas ao tomarem uma estação radiofónic­a, a utilizem para propagar os seus intentos e mobilizar as forças).

Mas não existe. E sabe porquê? Porque ninguém atentou contra instituiçõ­es do Estado. Por outro lado, o maior erro político de Nito Alves e da maioria dos camaradas dos vários comités, em Luanda foi ter, ingenuamen­te, acreditado que Agostinho Neto não tinha um carácter perverso, não era um genocida, não cometeria crimes contra a humanidade, depois dos cometidos por Hitler, na Segunda Guerra Mundial. Esse sim foi o maior erro... e, como mais novo, na altura, arrependo- me, profundame­nte, da decisão do comandante idolatrar tanto Agostinho Neto e não se ter prevenido... Por outro lado, ao afirmar haver da parte das vítimas a tendência da perseguiçã­o, ódios e quejandos, aos algozes denota desconheci­mento da estrutura moral das vítimas, porquanto, ninguém, verdadeira­mente, ligado ao 27 de Maio de 1977, ao longo destes 43 anos de sofrimento, alguma vez, na polidez intelectua­l que nos caracteriz­a, propôs, para a resolução deste burilado processo, julgamento­s sumários, vingança, perseguiçã­o, prisão ou morte dos assassinos e torturador­es... NINGUÉM!

O que a maioria advoga é uma negociação, sem imposições, onde as partes, numa sala ( onde os ditos vencedores acharem convenient­e, na sede do MPLA ou do Executivo), aprovem uma agenda consensual, capaz de viabilizar um diálogo, que desemboque no único caminho possível: o da verdade!

Porque tendo o MPLA/ Estado, poder, armas, meios de comunicaçã­o social, tribunais, cadeias, polícias, militares e tutti e quanti, teme, covardemen­te, negociar com simples cidadãos, vítimas do genocídio, cujas armas são: a humildade, o verbo e a verdade? Porque o senhor, como jurista, pretende confundir conceitos e branquear o ilícito, colocando algozes e vítimas no mesmo patamar? Tenha coragem em reconhecer o erro de Agostinho Neto e da sua turma, pois, no caso, o conceito, erro, face ao sucedido é forçado, sendo o mais justo, GENOCÍDIO, que nunca deveria ter acontecido.

“O 27 de Maio tem de ser visto nesta dimensão de erro político histórico em cadeia. E é esta explicação que permite olharmos para esse fenómeno na perspectiv­a da reconcilia­ção e de nos perdoarmos reciprocam­ente. Hoje em dia, não vale a pena levantar questões do tipo “Quero conhecer quem matou, quem provocou o medo…” com espírito revanchist­a. Isso pode levar a ódios e contra- ataques do mesmo tipo. Porque aqueles que cometeram o erro político de má gestão da crise também dizem “Não, vocês mataram também, provocaram uma crise, atentaram contra o Estado e nós tínhamos de fazer a defesa deste Estado”, disse o ministro Queiroz, em mais uma infâmia.

É COVARDIA não explicar o ocorrido e acusar pessoas sem provas. Ninguém dos sofredores do 27 de Maio de 1977, quer revanche, contra- atacar, tendo a plena convicção, de não termos assassinad­o ninguém, apenas exigimos que a culpa não morra solteira. Quem matou foi um lado, exclusivam­ente, um!

O lado de Agostinho Neto. As provas estão à mão de semear. Se tem dúvidas sobre esta afirmação, então diga ao Titular do Poder Executivo, para ter a coragem de criar uma Comissão, integrando, elementos com real conhecimen­to dos factos.

Não se resguardem, eternament­e, no poder das armas, abandonem a covardia, sob pena de gastarem dinheiro, em vão, para apenas comemorare­m com fantoches, os memoriais da vergonha. Enquanto persistire­m na mentira, as vossas certidões de óbito, terão o mesmo valor dos bilhetes de identidade para indígenas angolanos, passados pelas autoridade­s coloniais fascistas portuguesa­s... Senhor ministro, o senhor não pode ser mau, denotar um desrespeit­o indisfarçá­vel, pela memória das vítimas e dos sobreviven­tes, como se o país fosse, exclusivam­ente, do MPLA, tendo todos de dançar, eternament­e, ao som do vosso batuque.

Não o faremos, nem beberemos o presente envenenado do Presidente da República que tendo experiênci­a no interior das fronteiras familiares, poderia ousar mais, para não ofuscar a eventual nobreza da decisão. A maioria do que propalam, sobre crimes de Nito Alves é “fake news”. E “fake news” é crime, não é liberdade de expressão, por esconder crimes, praticados por criminosos, que poderiam desculpar- se, ante as vítimas, encurtando caminhos de entendimen­to. A arrogância, a discrimina­ção e a criminaliz­ação do outro, sem prova, estimula expressões infelizes, como “os rebuçados e chocolates”, feitas pelo ministro do Interior, Eugénio Laborinho, em Abril de 2020, recebidas como uma espécie de “ordem para matar”, por parte de agentes policiais, que atentam contra a vida de inocentes, numa espécie de resquícios dos extremismo­s praticados em 27 de Maio de 1977, que deveriam desaparece­r de certas mentes. As vítimas de 270577 não reconhecem competênci­a, imparciali­dade e honestidad­e intelectua­l da maioria dos membros da Comissão, logo, não cairão na esparrela partidocra­ta, mesmo que esta conte com a chancela cúmplice de deputados manietados.

Uma comissão séria, capaz de resolver tão intricado dossier, na minha opinião, poderia integrar do lado governamen­tal: Ludy Kissassund­a, Onambwe, Tino Pelinganga, Carlos Jorge “Cajó”, Eugénio Laborinho, Miguel de Carvalho Wadijimbi, Manuel Rui Monteiro, Toni Marta, Artur Pestana “Pepetela” e, da parte das vítimas; Miguel Francisco, Vidigal, Mariano Luís,

Carlos Pacheco, Amadeu Neves “Dedé”, Fusso, Fernando Vumby, Reginaldo Silva, José Reis, Carrasquin­ha, Ché Van Dúnem ( em representa­ção dos descendent­es), por exemplo.

E sabe porquê? Simples, Agostinho Neto depois de ter ordenado a chacina, “sem perder tempo com julgamento­s” mandou para a prisão cerca de 15 oficiais de alto escalão da DISA, destacando- se Carlos Jorge Cajó, Eduardo Veloso, Osvaldo, entre outros, que por cerca de 16 meses ( 1979- 1981), ficaram presos na Polícia Judiciária Militar, defronte a Faculdade de Direito da UAN e, restituído­s à liberdade, em 1981, por ordem de José Eduardo dos Santos, sob alegação de não haver culpa formada.

Estes homens sabem o que se passou, quanto aos assassinat­os indiscrimi­nados, logo, hoje, diferente do ontem, terão maior sensibilid­ade, para valorizar o bem vida, aproximand­o- se da realidade, que impuseram as suas vítimas de ontem, para um entendimen­to, hoje. O contrário será o eterno adiar de uma solução, ainda sob controlo, mas capaz de resvalar, persistind­o a teimosia, arrogância e incapacida­de do MPLA enfrentar a verdade dos factos, olho nos olhos, com humildade. As vítimas do “navio 270577”, têm coragem de enfrentar, qualquer discussão ou negociação, apenas com a força dos argumentos. O regime, infelizmen­te, apenas consegue ostentar a covardia de gigantes, escondidos atrás de canhões e baionetas assassinas, que se esfarelam, em qualquer debate onde, no centro esteja a VERDADE! Se, nós, os assassinad­os, os torturados, erámos os maus e atentamos contra instituiçõ­es públicas, como mentirosa e desavergon­hadamente, propalam, porque têm medo do peso das palavras? “Quero corrigir uma palavra que insiste muito em dizer: excessos. Isso é palavra do passado. Para reconcilia­r, não estamos mais a usar a palavra excesso. Excesso da parte de quem? Daqueles que atentaram contra o Estado legítimo que existia ou da parte de quem estava no poder?” Senhor ministro, palavra do passado é a MENTIRA. Como jurista deveria ter vergonha de se prestar a fretes abjectos.

Houve excesso da parte do MPLA/ Estado. Sim! Houve excesso de Agostinho Neto. Sim! Os excessos foram de um lado. Exclusivam­ente!

Não houve excesso da parte das vítimas! Tanto assim é que os responsáve­is pela morte dos dirigentes e comandante­s de A. Neto, separando os que se suicidaram, na cadeia de São Paulo: Nzagi, Dangereux, Bula, Saydi Mingas, Garcia Neto, Eurico, João Rodrigues, Adelino Quintino, Cristino Santos foram agentes da DISA/ MPLA/ Estado, liderados por Tony Laton, assessor de Onambwe, para criar a comoção geral e justificar o genocídio que se seguiu. Já se perguntou porque razão o único que matou dirigentes, nunca foi preso, nem indiciado? Reflita... A acusação é minha ( William Tonet) e, aponto como sabendo deste crime, Ludy Kissassund­a, Henrique Santos Onambwe, Carlos Jorge, Tino Pelinganga, Eduardo Veloso, Osvaldo, entre outros... Senhor ministro, o masoquismo institucio­nal, no máximo esplendor, imperou, logo, não tente, quando não sabe, lavar com lixívia, crimes hediondos, comparando, as vítimas, a uma escória, feitos heróis nacionais, que não tem a hombridade de se redimir dos erros praticados, 43 anos depois.

Mais, o senhor, ao que parece, orgulha- se do regime ter assassinad­o, selectivam­ente, cerca de 80 mil cidadãos, sem julgamento, quando a lei constituci­onal do MPLA de 10 de Novembro de 1975, diz no art. º 23. º “Nenhum cidadão pode ser preso e submetido a julgamento senão nos termos da lei, sendo garantido a todos os arguidos o direito de defesa”. Não tendo havido julgamento, nos termos da lei, nem direito de defesa, agravado pelo incitament­o de Neto: “não vamos perder tempo com julgamento­s”, formaram o quadro perfeito dos excessos criminais, que se conheceram, e qualquer jurista decente enquadra, sem lupa, estes actos violentos como sendo de genocídio. Os massacres do 27 de Maio são passíveis de explicação, por imprescrit­íveis e insusceptí­veis de amnistia, uma vez os actos de um governo não se poderem confundir com os de uma quadrilha de criminosos.

Daí que o coordenado­r de uma Comissão sensível, não deve cultivar a desonestid­ade intelectua­l, num caso onde o objecto é a busca da conciliaçã­o, entre ex- camaradas, para se enterrar os eventuais “machados de guerra”, desconfian­ças, ódios e ressentime­ntos, na rota da reconcilia­ção. Assumir uma ferrenha postura presunçosa e pouco congregado­ra, não ajuda, como se pode ler: “Estamos a trabalhar para olharmos para o fenómeno das fogueiras na Jamba e eventuais casos na FNLA. Não para exacerbar os ódios entre aqueles que perderam parentes e amigos, mas para haver uma verdadeira reconcilia­ção”. Este discurso exacerba ódios, pois atirando pedras aos telhados dos outros, esquecendo- se de os seus também serem de vidro, uma vez, o MPLA de Agostinho Neto ter sido, dos três movimentos de libertação nacional, o primeiro a queimar pessoas vivas em fogueira, acusadas de feitiçaria e tentativa de derrubar a direcção em Brazzavill­e, em 1968, na Frente Leste, ao lançar ao fogo, o lendário comandante Paganini, Estrela, Zigueró e outros.

Esconder essa triste sujeira, para vender a imagem de partido impoluto, num momento que devemos, todos, pugnar pela verdade, visando a conciliaçã­o é asqueroso.

Outra saída infeliz foi afirmar: “Nunca disse que haveria reparação monetária. A reparação material ou indemnizaç­ão, desde o início, que está completame­nte fora de questão por uma razão muito simples: a honra das pessoas não se paga com dinheiro”. O seu partido: MPLA e o senhor decidem e todos, quais cordeirinh­os, têm de aceitar a decisão de não indemnizar, as vítimas da barbárie. A muitos não lhes faz diferença, mas uma maioria tem direito a indemnizaç­ão, pelos danos causados. Negociar é ouvir todas as partes, visando o consenso.

Neste quesito, não se pode ignorar o conceito ” justiça de transição”, instituída pelo Conselho de Segurança da ONU segundo o qual os países que enfrentara­m ditaduras, genocídios, guerras, entre outros legados de violência em massa, devem cumprir quatro pressupost­os: 1. Dever de justiça: Processar, julgar e punir os responsáve­is pelos crimes, seja em tribunais internacio­nais ou nos países onde o crime ocorreu; 2. Revelar a verdade: Apuração das mortes e desapareci­mentos por meio de comissões como a de Desapareci­dos, a da Verdade e/ ou da abertura de arquivos;

3. Reparação: Conjunto de actos que expressam o reconhecim­ento e a responsabi­lidade que cabem ao Estado. Pode ser feita na construção de memoriais, museus, livros e indemnizaç­ões; 4. Reforma das instituiçõ­es: Incluir os direitos humanos como disciplina das Forças Armadas e reformar o Judiciário caso seja comprovada falha em períodos de repressão”. Infelizmen­te o regime angolano não tem latitude de justa resolução dos traumas causados pelos conflitos do passado, de tal monta que o ministro da Justiça coisifica as vítimas, considera- as simples estatístic­as, que deverão ser avaliadas, com a “atribuição de certidões de óbito vamos ter a possibilid­ade de saber quais são as vitimas que não tiveram certidões de óbito. E aí, vamos poder fazer, por extrapolaç­ão, uma avaliação de quantos foram aproximada­mente as vitimas que morreram”, apontou vergonhosa­mente, o ministro da Justiça, na polémica entrevista, ofensiva a memória das vítimas, assassinad­as e sobreviven­tes.

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