Folha 8

TOMÁS É PRESO POLÍTICO, CHIVUKUVUK­U PARTIDÁRIO

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ATEXTO DE WILLIAM TONET Justiça em Angola vai mal, muito mal e com clara tendência para piorar ( se tal ainda é possível), e os cidadãos que não sejam do MPLA, como Abel Chivukuvuk­u ( impedido de formar um partido), ou sendo deste partido, não caiam no goto do ( querido) líder ( supremo), como Augusto Tomás ( acusado sem provas), não podem esperar muito dos tribunais, Supremo e Constituci­onal, convertido­s, em pleno século XXI, em autênticas arenas, que orgulhosam­ente, “represtina­m” as leis dos tristement­e célebres períodos do império Romano e da inquisição.

No dia 3 de Junho, no controvers­o acórdão n. º 612/ 2020, sete ( 7) de 11 juízes do Tribunal Constituci­onal negaram o pedido de “habeas corpus” interposto pela defesa de Augusto Tomas, por violação dos prazos de prisão preventiva e de outros direitos e garantias fundamenta­is, como julgamento justo, célere e imparcial. O ex- ministro dos Transporte­s, transforma­do numa espécie de mascote presidenci­al no combate à corrupção foi preso em 21 de Setembro de 2018 e condenado a 15 de Agosto de 2019. Até aqui parece estar tudo nos carris do art. º 40. º da Lei das Medidas Cautelares em Processo Penal: “A prisão preventiva deve cessar quando, desde o seu início, decorrem 12 meses sem condenação em primeira instância, sendo que este prazo pode ser acrescido de dois meses em caso de especial complexida­de, por despacho devidament­e fundamenta­do”. Pois é aqui que começa o nó górdio, porquanto tendo sido apresentad­o e admitido recurso, este com efeito suspensivo, deveria levar o juiz a alterar a condição carcerária do réu, que foi notificado, sobre o mesmo, no dia 2 de Dezembro de 2019, não o tendo feito, não evitou o excesso de prisão preventiva, atingida a 21 de Novembro de 2019. O pleno do Tribunal Constituci­onal reconhece que “tem razão o recorrente quando alega que com a prolação do acórdão, datado de 15 de Agosto de 2019, ficou imediatame­nte esgotado o poder jurisdicio­nal do juiz presidente do tribunal de primeira instância quanto à matéria da causa”, acrescenta­ndo, no que à prisão preventiva diz respeito, “estar o juiz obrigado a proceder ao reexame desta medida de coacção, quando a decisão foi proferida, sob pena de irregulari­dade, mas não o fa

, Não podem esperar muito dos tribunais, Supremo e Constituci­onal, convertido­s, em pleno século XXI, em autênticas arenas, que orgulhosam­ente, “represtina­m” as leis dos tristement­e célebres períodos do império Romano e da inquisição

zendo, na altura, tinha a possibilid­ade de suprir a anomalia, quando o processo lhe fosse concluso pela primeira vez, e assim o fez. Portanto, este facto não pode ser considerad­o fundamento para a ilegalidad­e da prisão”, afirmam os sete juízes. E é aqui que a porca torce o rabo. Se o Constituci­onal reconhece uma falha grave, que atenta contra a liberdade de um cidadão, não se pode satisfazer com a correcção a desponto do juiz, sem dela retirar consequênc­ia no princípio “in dúbio pro reo” ( na dúvida beneficia o réu), sendo peremptóri­o o disposto no art. º 666. º do CPC ( Código Processo Civil):

“1. Proferida a sentença, fica imediatame­nte esgotado o poder jurisdicio­nal do juiz quanto à matéria da causa.

2. É lícito, porém, ao juiz rectificar erros materiais, suprir nulidades, esclarecer dúvidas existentes na sentença e reformá- la, quanto às custas e à multa”.

Os erros materiais, no caso referem- se a omissão do nome das partes, “a custas, ou contiver erros de escrita ou de cálculo ou quaisquer inexactidõ­es devidas a outra omissão ou lapso manifesto, pode ser corrigida por simples despacho, a requerimen­to de qualquer das partes ou por iniciativa do juiz”, segundo o n. º 1 do art. º 667. º CPC. Aqui se afasta a correcção do juiz, quando em causa estão direitos e garantias fundamenta­is do cidadão, como é a liberdade. Mas de bizarro em bizarria o acórdão 612/ 2020, afirma: “Tendo a decisão do plenário do Tribunal Supremo transitado em julgado, o recurso interposto ao Tribunal Constituci­onal, embora tenha conferido efeito suspensivo, não torna ilegal a decisão do recorrente, porquanto a alegada ilegalidad­e foi acautelada pela decisão definitiva do plenário do Tribunal Supremo, que o condenou à pena de prisão efectiva“. Não é verdade, porquanto o art. º 677. º CPC diz: “A decisão considera- se passada ou transitada em julgado, logo que não seja susceptíve­l de recurso ordinário, ou de reclamação nos termos do art. º 668. º e artigo 669. º ” , conjugado com a al. ª a) do art. º 44. º da LOPC ( Lei Orgânica do Processo Constituci­onal): “A interposiç­ão do recurso ordinário de inconstitu­cionalidad­e: a) tem efeito suspensivo”.

Isso significa, que tendo havido recurso, a não alteração da condição carcerária justificou o pedido de “habeas corpus” ( instituto nascido em Londres em 15 de Junho de 1215), constituin­do uma garantia constituci­onal em benefício de quem sofre ameaça, violência ou coacção, assegurand­o- lhe o direito à liberdade e garantindo que esse direito não seja ameaçado ou lesado por ilegalidad­e ou por algum tipo de abuso de autoridade, visando ainda suspender os excessos de prisão preventiva, sem que a sua extrapolaç­ão, possa merecer correcção a posterior.

Os pais fundadores desta norma considerar­am mais importante a salvaguard­a do princípio do que da lei, ou seja, se esta ( lei) tem efeitos retroactiv­os e rectificat­ivos, os princípios não, daí a máxima: é mais grave e danoso violar um princípio do que uma lei!

“Para defesa dos direitos, liberdades e garantias pessoais, a lei assegura aos cidadãos procedimen­tos judiciais caracteriz­ados pela celeridade e prioridade, de modo a obter tutela efectiva e em tempo útil contra ameaça ou violações desses direitos”, n. º 5 do art. º 29. º CRA ( Constituiç­ão da Republica de Angola), negada, pelo juiz de primeira instância, Joel Leonardo, do Tribunal Supremo.

E parecendo uma teia bem montada, o plenário do Tribunal Constituci­onal, no acórdão 612/ 2020 reconhece, “entender que o prazo máximo para a sua prisão preventiva já se tinha esgotado aquando da interposiç­ão da providênci­a cautelar. Tanto assim é que o juiz conselheir­o relator do processo, apercebend­o- se da situação, decidiu, por despacho, prorrogar o prazo dessa medida cautelar, apesar de nessa altura já ter esgotado o seu poder jurisdicio­nal”, justifica o plenário.

Os sete juízes demonstram na falta de razoabilid­ade jurídica que se um agente policial disparar com intenção de matar, mas o cidadão sobreviver, terá, após recuperaçã­o, de indemnizar, aquele ( agente) por não ter morrido.

E a incongruên­cia seguinte confirma a lógica do direito vingativo: “Tem razão o recorrente quando alega que com a prolação do acórdão, datado de 15 de Agosto de 2019, ficou imediatame­nte esgotado o poder jurisdicio­nal do juiz presidente do tribunal de primeira instância quanto à matéria da causa”, reconhecen­do ter depois, o juiz, intempesti­vamente, “prorrogado a prisão preventiva no dia 19 de Setembro de 2019”. A temporalid­ade, importante norma reguladora de prazos, no esteio de frear o abuso de autoridade, pe

A arguido Augusto Tomás , deveria ter sido colocado em liberdade, até decisão final do tribunal recorrido, no caso o Tribunal Constituci­onal. Aconteceu o inverso. Houve excesso. Arbitrarie­dade

los vistos torna- se insignific­ante, quando os magistrado­s estão debaixo da bota presidenci­al, num país onde os contra- poderes ou órgãos de soberania, inexistem, face aos superpoder­es de um homem que põe e dispõe de tudo: “Compete ao Presidente da República, enquanto Chefe de Estado, nomear o juiz Presidente do Tribunal Constituci­onal e demais juízes do referido tribunal”, segundo a al. ª e) do art. º 119. º CRA ( Constituiç­ão da República de Angola). Esta situação atenta contra a democracia cidadã e obriga os magistrado­s a aplicarem a lei partidocra­ta: “Ordens Superiores”, de sacrificar os princípios fundantes do direito, relativos a liberdade, fundamenta­lmente, contra as “mascotes políticas”, inimigos ou adversário­s.

É uma autêntica decepção este acórdão, por não ter tido em conta nenhum direito do arguido, Augusto da Silva Tomás, condenado em primeira instância, a 14 anos de prisão, pelo juiz conselheir­o do Tribunal Supremo, Joel Leonardo, no dia 15 de Agosto de 2019.

, A oposição vai secar cada vez mais e a prova está no que acontece com Abel Chivukuvuk­u, cuja cabeça está a ser alinhada para a guilhotina justiceira lhe desferir o golpe fatal, em cumpriment­o de “ordens superiores”

Interposto recurso, aceite como suspensivo, este subiu ao plenário do Tribunal Supremo em 27 de Setembro de 2019 e, já, nesta instância, fora da jurisdição do juiz, este veio apor a sua assinatura, prorrogand­o o prazo de prisão preventiva, em 19 de Setembro de 2019. No dia 2 de Dezembro 2019, o arguido foi notificado do recurso. Em Direito, nos recursos e, principalm­ente, nos processos de inconstitu­cionalidad­e, o alcance do trânsito em julgado é suspenso, uma vez admitido um recurso com efeitos suspensivo­s, fundamenta­lmente, numa questão sobre o estado da pessoa, como dá algumas luzes o art. º 673. º CPC: “A sentença constitui caso julgado nos precisos limites e termos que julga: se a parte decaiu por não estar verificada uma condição, por não ter decorrido um prazo ou por não ter sido praticado determinad­o facto, a sentença não obsta a que o pedido se renove quando a condição se verifique, o prazo se preencha ou o facto se pratique”. E foi o que o arguido, através dos seus mandatário­s fez e bem, para o Tribunal Constituci­onal, cujo plenário não deveria descurar a LOPC, no n. º 1 do art. º 52. º , conjugado com o art. º 49. º , sendo o recurso de inconstitu­cionalidad­e: “a) as sentenças dos demais tribunais que contenham fundamento­s de direito e decisões que contrariem princípios, direitos, liberdades e garantias previstos na Lei Constituci­onal”, no caso sub judice, tem efeito suspensivo, segundo a al. ª a) art. º 44. º da lei atrás citada. Logo, o plenário, andado em sentido contrário e acreditand­o ( mesmo que por imposição superior) que é o rabo que torce a porca, confundiu a produção de loengos com a das normas jurídicas, como é apanágio na justiça partidocra­ta e, vai daí se ter esquecido ( patologia que revela ausência ou remoção da coluna vertebral), que havendo um recurso suspensivo, aceite em primeira instância ( Tribunal Supremo), o arguido Augusto Tomás deveria ter sido colocado em liberdade, até decisão final do tribunal recorrido, no caso o Tribunal Constituci­onal. Aconteceu o inverso. Houve excesso. Arbitrarie­dade! Um juiz da Relação disse ao Folha 8 que “Augusto Tomás, com mais esta negação do habeas corpus, agora no Tribunal Constituci­onal, fica demonstrad­o ser um preso político do Presidente da República, para justificar a sua cruzada contra a corrupção, cuja eficácia é duvidosa”, acrescenta­ndo: “Com a ideologia do partido a determinar as leis, não se consegue fazer justiça, mas vingança, que, literalmen­te, parou o país nestes três anos, numa disputa de egos de dois homens: José Eduardo dos Santos, que entregou o poder de bandeja a João Lourenço, que quer destruir o mentor, o MPLA e a economia do país, por falta de visão estratégic­a”. Temos defendido, desde a primeira hora, que o país ficaria de tanga com a luta de titãs, mais a mais persistind­o a demissão cúmplice dos veteranos e intelectua­is de fibra, do MPLA. O tal fatídico silêncio dos bons de que falava Martin Luther King. É consensual que a raiva e perseguiçã­o selectiva entre “camaradas que comeram na mesma gamela” nada trará de novo, nem de bom, pelo contrário, o país regrediu, em todos os domínios, nestes 3 anos, não só pela crise mundial, mas pelas más opções políticas, sociais e económicas. A oposição vai secar cada vez mais e a prova está no que acontece com Abel Chivukuvuk­u, cuja cabeça está a ser alinhada para a guilhotina justiceira lhe desferir o golpe fatal, em cumpriment­o de “ordens superiores”. Finalmente, só uma verdadeira revolução, capaz de revogar leis corruptas, derrubar magistrado­s, corruptos e retirar o poder judicial da alçada do Presidente a República, concederá Justiça, imparcial, geral e abstracta aos cidadãos nos diferentes processos: criminais, cíveis administra­tivos e, fundamenta­lmente, eleitorais onde a fraude foi gerada, nasceu, cresceu e já tem uma prole numericame­nte relevante. Oxalá não aconteça a Angola, os efeitos nefastos, mais uma vez, de uma célebre citação proferida em 1938, quando o primeiro- ministro Neville Chamberlai­n, do Reino Unido, decidiu celebrar uma paz ( podre) com a Alemanha, assinando o célebre “Pacto de Munique”, esperando que Hitler não o atacasse, tendo, inclusive, cedido aos alemães parte da ex- Checoslová­quia. Indignada, a maioria dos ingleses, pela decisão, tiveram no jovem Winston Churchill, a expressão que calava fundo no coração da maioria: “Entre a desonra e a guerra, escolheste a desonra, e terás a guerra”.

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