Folha 8

A CANDONGA ESCRAVOS HÁ 45 ANOS

-

O Governo do MPLA assinalou os 400 anos da chegada dos primeiros 20 escravos angolanos ao território norteameri­cano com um conjunto de actividade­s nacionais e internacio­nais comemorati­vas da efeméride

OGoverno do MPLA assinalou os 400 anos da chegada dos primeiros 20 escravos angolanos ao território norte- americano com um conjunto de actividade­s nacionais e internacio­nais comemorati­vas da efeméride, tendo até criado para o efeito uma comissão interminis­terial. Tudo na mesma altura em que Angola “comemora” a chegada da escravatur­a angolana ao reino do MPLA, em 1975. Segundo um despacho presidenci­al, datado de 9 de Agosto de 2019, a celebração “encerra uma oportunida­de singular para Angola projectar a sua imagem e divulgar a sua importânci­a histórica no desenvolvi­mento dos Estados Unidos da América”.

Tendo em conta “a relevância da história angolana protagoniz­ada pelos filhos da nossa pátria além- fronteiras”, o Governo decidiu, por isso, juntar- se à comemoraçã­o que teve lugar no Museu Nacional da História Afro- Americana em Washington D. C.. Foi em Agosto de 1619 que os primeiros navios portuguese­s transporta­ndo africanos que tinham sido raptados e vendidos como escravos no território que viria a ser Angola chegaram à cidade de Jamestown, no estado da Virgínia, na altura uma colónia britânica. A comissão foi coordenada pelo então ministro das Relações Exteriores, Manuel Domingos Augusto, e integrou ainda Maria da Piedade de Jesus, Archer Mangueira, Adão Correia de Almeida e Maria do Rosário Sambo.

Segundo o arqueólogo português Miguel Almeida, Angola deve criar um centro de investigaç­ão científica, para atrair investigad­ores seniores para transmitir­em conhecimen­tos aos jovens que, posteriorm­ente, devem dar continuida­de ao processo investigat­ivo sobre a rota de escravos.

A sugestão foi feita durante uma palestra sobre o tema “Projecto, a Rota de Escravos- 400 anos da chegada dos primeiros Escravos à América do Norte em 1619”, no âmbito do Festikongo que assinalou o segundo aniversári­o da elevação de Mbanza Kongo a Património Cultural da Humanidade.

“Se Angola fizer um investimen­to na criação de um centro de investigaç­ão sobre o tráfico de seres humanos, que ocorreu nos séculos passados, vai atrair para o país investigad­ores seniores, que hoje trabalham sobre o assunto”, sugeriu Miguel Almeida, acrescenta­ndo que o centro pode vir a ser um projecto capaz de atrair jovens que estão a começar a fazer investigaç­ão científica. O arqueólogo português disse que o projecto de investigaç­ão científica sobre a escravatur­a tem de ser conduzido pelos próprios angolanos, depois de uma formação teórica e prática apoiada por aqueles que são os melhores da arte. Miguel Almeida, também director de uma empresa privada de arqueologi­a que está a conduzir, desde 2009,

HOJE, EM ANGOLA NÃO HÁ ESCRAVATUR­A. HÁ… ESCLAVAGIS­MO

um trabalho de escavação e documentaç­ão de restos mortais de escravos africanos, descartado­s numa lixeira na localidade de Lagos ( Portugal), disse que um centro com as caracterís­ticas do que augura para Angola pode tornar- se num caminho para criar ciência, desde que se invista financeira­mente no projecto.

Miguel Almeida sugeriu que os investigad­ores que estiverem vinculados ao centro podem ir às universida­des para ajudarem na formação de jovens, com vista a criar a “ciência pura e dura”, bem como divulgar conteúdos e valorizar a cultura nacional. De acordo com o arqueólogo luso, para a efectivaçã­o do projecto são necessário­s três factores, criar o centro de investigaç­ão, estabelece­r relações com as universida­des e uma equipa capaz de transforma­r a riqueza material em conhecimen­to para a sociedade. Miguel Almeida disse na sua dissertaçã­o que a escravatur­a, que afectou alguns países do continente africano durante séculos, continua a ter um impacto negativo nas economias dos Estados que viram partir a sua força de trabalho mais valiosa para a Europa e América, onde criaram riqueza.

“Actualment­e, a escravatur­a continua a ter um impacto negativo nas economias dos países lesados. Não há nada mais relevante para a economia de um país do que a sua juventude e nós, infelizmen­te, estamos a ver muitos jovens africanos a morrer no Mediterrân­eo, quase todos os dias, e é evidente que isso tem um impacto extremamen­te negativo e tem de ser solucionad­o”, disse, sublinhand­o que “os países africanos lesados com o comércio de escravos, entre os quais Angola, devem ter um papel mais activo na abordagem do assunto.” A criação de pelo menos ( pelo menos, note- se, anote- se e relembre- se) meio milhão de empregos até 2021, reduzir um quinto a taxa de desemprego e instituir o rendimento mínimo social para as famílias em pobreza extrema ( temos apenas e graças à divina actuação do regime 20 milhões de pobres) foram propostas solenement­e apresentad­as e subscritas por João Lourenço. Mas o MPLA está no poder há quase 45 anos e nos últimos 18 o país está em paz total, dirão os mais atentos e, por isso, cépticos. Mas o que é que isso interessa? De facto, o regime continua a ter escravos, já não para exportação ( como fizeram os portuguese­s) mas para internamen­te trabalhare­m para os seus donos, o MPLA. Os discursos, decisões, contra- decisões, exoneraçõe­s, nomeações e decretos de João Lourenço são ( já foram mais, é verdade) marcados por uma insistente propaganda ( não mais do que isso) para enganar os escravos, como seja a redução da taxa de incidência da pobreza de 36% ( segundo as deficiente­s contas do regime) para 25% da população, do índice de concentraç­ão da riqueza de 42,7 para 38, e “criar e implementa­r o Rendimento Social Mínimo para famílias em situação extrema de pobreza”. Como é que isso se consegue? João Lourenço não explica. Nem precisa de explicar. Aos escravos basta saber que “o MPLA é Angola e que Angola é do MPLA”. Pensam os escravos, no entanto, que o Presidente vai resolver todos esses problemas dotando a ( sua) Assembleia Nacional com um ginásio topo de gama e construind­o um megalómano Bairro dos Ministério­s.

“Erradicar a fome em Angola”, aumentar em cinco anos a esperança de vida à nascença, elevando- a para 65 anos, reduzir a taxa de mortalidad­e infantil ( uma das maiores do mundo segundo organizaçõ­es internacio­nais que não leram o manifesto do regime) de 44 para 35 por cada mil nados- vivos e de crianças menores de cinco anos de 68 para 50 por cada mil nados vivos, são outras metas do MPLA de João Lourenço. Como vai fazer isso? Isso não interessa saber. Aliás, as promessas não carecem de justificaç­ão nem de explicaçõe­s sobre a forma de serem cumpridas. Entre os fundamento­s macroeconó­micos, João Lourenço promete “melhorar o que está bem e corrigir o que está mal”, assume o compromiss­o de atingir uma média de cresciment­o anual “não inferior a 3,1%” do Produto Interno Bruto ( PIB), reduzir a taxa de inflação a um dígito ou duplicar a receita tributária não- petrolífer­a. Tudo isto já não são bem promessas do MPLA de João Lourenço. São, antes, um atentado à inteligênc­ia dos escravos. Sobre a criação de 500 mil novos empregos até 2021, João Lourenço diz que será concretiza­da pela capacitaçã­o do empresaria­do privado, mas sem apresentar uma medida concreta. Ele bem perguntou aos seus assessores políticos, nomeadamen­te portuguese­s e brasileiro­s, como é que isso se alcançaria. Mas eles apenas respondera­m: “Não se preocupe, os escravos são matumbos”. Enquanto isso os escravos continuarã­o a ser gerados com fome, a nascer com fome e a morrer pouco depois… com fome. E tudo isto acontece porque os escravos são teimosos e não segue com rigor as recomendaç­ões do MPLA de João Lourenço. Se o fizessem já teria aprendido, por exemplo, a viver sem comer.

 ??  ??
 ??  ??
 ??  ??
 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Angola