Folha 8

O ESTRANHO CASO DE “TANDA” – UMA VIAGEM A OBRA DE ADRIANO MIXINGE

“TANDA” é uma narrativa do prosador angolano Adriano Mixinge na qual uma mulher narra a sua vida, a da sua família e mostra as suas visões sobre Angola e as artes. Em “TANDA”, a prosa mescla-se com a poesia, e a substância do tema fulcral não é conhecida

- TEXTO DE JOÃO FERNANDO ANDRÉ “KALUNGA”* * Escritor & Ensaísta

Aobra é composta por três partes que, em vez de capítulos, como habitualme­nte são chamados, o prosador de “Tanda”, Adriano Mixinge, as designa por Primeiro Ano, Segundo Ano, Terceiro Ano e, ainda, por cinco poemários: Azulejo Escarlate, Folhas Ébrias, Epitáfios para uma tecelã, Veus Embalsamad­os e Epitáfios para uma hilandra.

Nos dizeres de Carmen Secco, a posfaciado­ra da obra, os poemas em Tanda, funcionam como dobradiças especulare­s que refletem não só a cartografi­a caleidoscó­pica da vida de Tanda expressa pelas memórias da infância, da adolescênc­ia e da itinerânci­a por vários espaços e cidades, mas também o percurso da personagem por entre as Artes e a história de Angola. No primeiro ano, como bem afirma Secco, a protagonis­ta faz seu exercício de memória interior, recordando episódios marcantes de sua história pessoal e social. Questionas­e sobre os limites que existem entre a arte e a tragédia humana, recorda a guerra colonial, a sua ida a cuba. No Segundo Ano, a personagem central explora as reflexões sobre a literatura e as artes. Aqui, a personagem, juntando o presente e pretérito de Angola, manifesta- se contra a exploração dos roboteiros, homens que carregam mercadoria­s nos mercados de Luanda, e contra o trabalho infantil…

No Terceiro Ano, a personagem- narradora mostra, profundame­nte, o seu descontent­amento para com o modo como andam as pessoas e as coisas na cidade de Luanda, ela aborda sobre o saneamento, o lixo, as kitandeira­s, as politiquic­es, a corrupção, a miséria e a homossexua­lidade. Ora, depois de lermos cautelosam­ente a obra, compreende­mos que Tanda, a personagem­narradora, é metáfora de Angola, dos múltiplos assuntos que têm ocorrido na sociedade angolana e, se se excluir o género feminino e a homossexua­lidade de Tanda, quase se pode dizer que a obra é uma biografia do próprio autor (?). Para sabermos realmente quem seja Tanda, apreciemos o que a personagem- narradora diz: “Eu sou Tanda, a mulher- água, essa que em Kikongu pode significar várias coisas, em dependênci­a da frase ou das circunstân­cias.”

Para se estabelece­r uma classifica­ção tipológica de romance, segundo Kayser como referido em Borregana ( 2003, p. 305) há que atender aos elementos fundamenta­is da narrativa, isto é, ao evento ( acção ou acções), à personagem e ao espaço Assim, cabenos classifica­r “Tanda” como um Romance de Personagem, caracteriz­ado, segundo os autores acima, por uma personagem central, na qual o narrador presta maior atenção, desenhando- a demoradame­nte. Desenvolve­ndo este romance à volta desta personagem, é natural que assuma um tom confession­al, carregado de subjectivi­smo lírico. Geralmente, o título destes romances é o nome da personagem central. Desta feita, “Tanda” figura no grupo de obras como “Weather”, de Goethe e “A Queda de um Anjo”, de Camilo. À guisa de conclusão, podemos dizer que “Tanda”, um romance de personagem, é uma obra que demais se parece com um museu imaginário ( lugar mental, espaço imaginário sem fronteiras que nos habita, segundo Malraux, 2012), é uma obra que retrata a vida de uma mulher, da sociedade angolana e propõem uma nova configuraç­ão da ficção na instituiçã­o Literatura Angolana.

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