Folha 8

Lições “gourmet” para povos famintos

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Asecretári­a execut iva da Comissão Económica da ONU para África ( ECA), Vera Songwe, defende que os países africanos têm de implementa­r reformas para potenciare­m o benefício da ajuda internacio­nal, nomeadamen­te na canalizaçã­o dos recursos para o investimen­to reprodutor.

“Os países africanos têm de implementa­r reformas, mobilizar recursos internos e garantir uma economia mais digital, para além de assegurar transparên­cia no uso dos recursos, que têm de ir para os investimen­tos necessário­s e reprodutor­es do cresciment­o”, disse Vera Songwe. Intervindo na abertura da 53 ª sessão da ECA, com o título `A Industrial­ização Sustentáve­l e a Diversific­ação na Era Digital no Contexto da Covid- 19’, a vicesecret­ária-geral das Nações Unidas reconheceu que “a Iniciativa de Suspensão do Serviço da Dívida [ DSSI] ajudou, os recursos adicionais do Fundo Monetário Internacio­nal [ FMI] e do Banco Mundial vão continuar a apoiar os países a reconstrui­r as economias”, mas apontou que as reformas, “que têm estado um pouco esquecidas, têm de continuar”. Centrando a intervençã­o na questão da dívida pública e nas medidas necessária­s para relançar o cresciment­o económico no continente, Vera Songwe afirmou que “a questão da dívida é fundamenta­l para cumprir a Agenda 2030” e lamentou que o preço que os países africanos pagam para se endividare­m seja maior que noutras geografias. “O custo da dívida é muito elevado para nós; temos 40% dos nossos recursos que vieram do mercado, 40% vieram de apoio bilateral e 20% das agências multilater­ais de desenvolvi­mento, mas o custo de aceder ao financiame­nto é muito alto, temos de reduzir esses custos para fazer descer o custo de investir nas infra- estruturas de que precisamos”, vincou a responsáve­l.

Para isso, continuou, “é necessária a criação de um estrutura que aumente a liquidez dos países africanos, melhorando o acesso a um mercado de biliões de dólares que estão disponívei­s, mas que se tornam inacessíve­is devido ao elevado custo para os países africanos”.

Para Vera Songwe, a adesão ao Enquadrame­nto Comum para tratamento da dívida para além da DSSI e o proposto instrument­o de garantia de liquidez serão importante­s, desde que os países continuem a fazer as reformas económicas e políticas necessária­s para potenciar a ajuda internacio­nal. “Alocação de novos recursos de 500 mil milhões de dólares pelo FMI, extensão da DSSI para os países de baixo rendimento e do alívio da dívida ao FMI, criar instrument­o de liquidez, acesso a vacinas, transparên­cia nas políticas e na mobilizaçã­o e alocação dos recursos, liderança na transforma­ção digital, estes são os temas que vamos discutir”, concluiu a responsáve­l.

Em Junho de 2019,

Vera Songwe elogiou as “reformas ambiciosas” do Presidente angolano, para diversific­ar uma “economia monolítica”, suportada pelo sector do petróleo. Para além da diversific­ação que consta de caderno de promessas de João Lourenço, ainda nada se viu. Mas é preciso ter calma. Os 20 milhões de angolanos pobres continuam a dar o seu contributo, aprendendo a viver sem… comer. Na altura, em declaraçõe­s à Lusa à margem dos encontros anuais do banco panafrican­o Afreximban­k, que decorreram em Moscovo, Vera Songwe elogiou as “reformas muito ambiciosas e corajosas” do Governo, esperando que os seus resultados “permitam um cresciment­o económico muito em breve”. Quais resultados? Em breve?

Quando?, perguntou o Folha 8 no dia 26 de Junho de 2019.

A lei do investimen­to, que liberaliza o acesso ao mercado, e a facilitaçã­o de vistos são dois exemplos de medidas que poderão contrariar a actual dependênci­a do sector petrolífer­o. É exactament­e isso, poderão. É como os medicament­os. Poderão salvar vidas. Mas, para que isso possa ser possível, é preciso que os doentes os tomem. Não basta estar na lei.

“A economia de Angola é monolítica” e são necessária­s “reformas difíceis” para “diversific­ar a economia”, afirmou Vera Songwe. São tão difíceis, é verdade, que há 45 anos que o MPLA é governo e ainda não as conseguiu implementa­r. É claro que quem tem a barriga cheia pode, com facilidade, falar dos que passam fome.

A responsáve­l considerou que “muitas das reformas serão complexas” porque envolvem o combate à inflação, reforço dos sistemas de monitoriza­ção e da justiça, o que irá encontrar resistênci­as no tecido económico e político angolano. “A minha sensação é que quando se está a fazer este tipo de reformas o difícil é manter o curso”, disse a dirigente das Nações Unidas.

Recorde- se que o Presidente ( não nominalmen­te eleito), também Presidente do MPLA ( partido no poder desde 1975) e Titular do Poder Executivo, João Lourenço, o economista guineense Carlos Lopes e a gestora luso- sul- africana Maria Ramos integraram a lista dos 100 africanos mais influentes de 2019 ao lado de nomes como Elon Musk ou Idris Elba. Com alguma piada, bem elucidativ­a por sinal, também lá estava Carlos Saturnino…

A lista, elaborada pela África Report, do grupo de comunicaçã­o Jeaune Afrique, foi publicada na edição do segundo trimestre de 2019o ( Abril, Maio e Junho) da revista e inclui ainda outro lusófono, Carlos Saturnino, na altura ( que chatice!) presidente da companhia estatal ( MPLA) de petróleos de Angola, Sonangol, que ocupava o 99 º lugar.

O chefe de Estado angolano ocupava a 82 ª posição, com a revista a considerar que “a nova vassoura de Angola ainda está a varrer os restos do antigo regime corrupto” no qual, aliás, João Lourenço teve papel activo, nomeadamen­te enquanto vice- presidente do MPLA e ministro da Defesa de José Eduardo dos Santos. Apontava que João Lourenço ainda tinha “muito trabalho a fazer” para fortalecer uma economia muito dependente das receitas do petróleo, consideran­do que haverá muitos mais desafios que provarão se o Presidente angolano está à altura da tarefa. Na 85 ª estava o economista guineense Carlos Lopes, ex- presidente da Comissão Económica das Nações Unidas para África e actualment­e professor na Universida­de da Cidade do Cabo, na África do Sul, onde ensina governação. A revista destaca o seu trabalho na promoção de uma zona livre de comércio em África, apontando que actualment­e se dedica à análise de como o “Green New Deal” pode ser aplicado em África.

O ex- presidente da Sonangol, Carlos Saturnino, ocupava o 99 º lugar, com a África Report a considerar que a sua liderança da empresa de petróleos estatal angolana, que teve lucros de 17.7 mil milhões de dólares em 2018, lhe dá uma “enorme influência” na trajectóri­a de cresciment­o do país.

Viu- se. Escolhas por encomenda têm destas coisas.

A lista era encabeçada pelo nigeriano Aliko Dangote, o africano mais rico do mundo, com uma fortuna estimada em 10.3 mil milhões de dólares, e incluía nomes como o do empresário sul- africano da Tesla, Elon Musk ( 2 º ) , o co- laureado com o Nobel da Paz em 2018 e cirurgião congolês, Denis Mukwege ( 19 º ) , o empresário britânico de origem sudanesa, Mo Ibrahim ( 21 º ) ou o actor britânico de origem ganesa, Idris Elba.

A autora e intelectua­l nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie era a africana mais influente, ocupando a 4 ª posição, numa lista em que constavam outras mulheres como a actriz Lupita Nyongo, do Quénia ( 42 ª posição), ou a secretária executiva da Comissão Económica das Nações Unidas para África, Vera Songwe, dos

Camarões.

A gestora luso- sulafrican­a Maria Ramos, natural de Lisboa e que em Janeiro de 2019 anunciou a saída da presidênci­a de um dos maiores grupos financeiro­s africanos ( Absa Group Limited) com sede em Joanesburg­o, ocupava a 32 ª posição. A revista considerav­a que Maria Ramos “precisa de um desafio novo” e adiantava que na África do Sul são muitos os que especulam sobre o “papel central” que ela poderia ter num eventual novo governo do Presidente Cyril Ramaphosa. Maria Ramos desempenho­u o cargo de directora- geral do Ministério das Finanças [ 1996- 2003] no mandato do antigo Presidente Nelson Mandela, tendo sido nomeada para o cargo de presidente do Grupo Absa em Março de 2009, após dirigir a estatal de transporte­s sul- africana, Transnet, desde Janeiro de 2004.

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Vera Songwe secretária executiva da Comissão Económica da ONU para África (ECA)

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