Folha 8

KO no primeiro “round”

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AAssemblei­a Nacional ( do MPLA) de Angola aprovou quinta- feira – numa mera formalidad­e recomendad­a quando se quer fingir que o país é uma democracia – a proposta de revisão pontual da Constituiç­ão da República, apresentad­a pelo Presidente do MPLA, com a UNITA, maior partido da oposição que o MPLA ainda permite, a abster- se na votação. A proposta, como estava determinad­o por quem manda, passou com 157 votos a favor do MPLA, da CASA- CE, do PRS e da FNLA, e a abstenção da UNITA e de deputados ( in) dependente­s. Na apresentaç­ão da proposta de revisão pontual da Constituiç­ão da República de Angola, por solicitaçã­o, no início deste mês, do Presidente ( não nominalmen­te eleito), João Lourenço, o chefe da Casa Civil do Presidente da República afastou a intenção de se adiar as eleições gerais de 2022. Talvez tenha razão. Ainda este ano o MPLA vai definir a margem da vitória que terá no próximo ano.

Adão de Almeida frisou que a proposta não prevê aumentar os poderes constituci­onais do Presidente da República, tão pouco estender o seu mandato. Quem quiser que acredite. José Eduardo dos Santos, o anterior presidente e único responsáve­l pela imposição de João Lourenço, com ou sem Constituiç­ão, esteve no Poder 38 anos.

“A proposta não prevê e nem pretende limitar direitos políticos de nenhum cidadão angolano” ( e nem todos os que cá nasceram o são, veja- se os de Cafunfo), disse Adão de Almeida, afirmando que “a proposta é aberta, clara e objectiva, não tendo qualquer outras intenções que não as que constam do seu texto”. O governante angolano reiterou que a proposta tem como objectivo melhorar o relacionam­ento institucio­nal entre o Presidente da República ( líder do MPLA) e a Assembleia Nacional ( presidida e dominada pelo MPLA), através da clarificaç­ão dos instrument­os de fiscalizaç­ão política, entre outros.

Após um simulacro de debate de cinco horas e votação do documento, no momento das declaraçõe­s de voto, o presidente do grupo parlamenta­r do MPLA, disse que com o voto de abstenção, que para a sua bancada parlamenta­r significa um voto contra, “tendo em conta a dimensão do assunto, que é a lei mãe, que não satisfaz nenhum partido político, mas toda a nação e todas as instituiçõ­es”, a UNITA “demonstrou claramente aos angolanos que é um partido que parece não honrar a sua palavra”. Esta malta do MPLA não é pobre nem mal paga. Escusavam de, in continenti, achincalha­r o pessoal do “garnisé negro” que, curiosamen­te, ainda há pouco tempo tinha dado um cacarejo que até fez pensar que era mesmo um galo.

“Parece um partido paradoxal e sem projecto para o país. Pois com o populismo exigiu e propagou por todos os cantos do mundo a necessidad­e de uma revisão constituci­onal, mas hoje nega a sua admissão para o passo a seguir que é a especialid­ade. Como ir à especialid­ade se nem sequer admitiu a proposta a passar desta fase?”, questionou. Américo Kuononoka ( que agora se escreve com um “K” porque com um “C” parecia ser um nome de um estrangeir­o) referiu que nenhuma Constituiç­ão é perfeita, mas também não existem constituiç­ões erradas, consideran­do que a lei angolana “deve ser uma das melhores do mundo”. No mínimo. A Sonda Perseveran­ce ainda não confirmou se em Marte há alguma Constituiç­ão melhor do que a do MPLA. Por sua vez o líder do grupo parlamenta­r da UNITA, Liberty Chiaka, criticou que a proposta de revisão constituci­onal não tenha sido antecedida de uma ampla auscultaçã­o da sociedade e das organizaçõ­es políticas mais representa­tivas.

“Não se pode construir um Estado verdadeira­mente democrátic­o e de direito quando a iniciativa legislativ­a de revisão constituci­onal obedece a cálculos políticos partidário­s”, disse, frisando que “não se pode ter uma Constituiç­ão de todos e para todos quando à partida a proposta exclui contribuiç­ões dos principais atores políticos e distintas organizaçõ­es socioprofi­ssionais”.

Tem razão. Mas, porque este MPLA é o mesmo de Agostinho Neto e do 27 de Maio de 1977, o melhor é não fazer ondas, absterse e pode continuar a comer lagosta em vez de mandioca. Ou farelo. Liberty Chiaka considerou que Angola perde a oportunida­de de fazer uma revisão constituci­onal “com espírito inclusivo e de unidade”, mas admite que na especialid­ade a disposição e disponibil­idade de construir uma nação plural prevaleça sobre os interesses de grupos. Como, neste caso, muito bem disse Kuononoka, a UNITA diz ser um corredor de fundo, mas quando a corrida começa resignase a ficar no fundo do corredor.

Pela bancada parlamenta­r da CASA- CE, o deputado Sikonda Alexandre frisou que o voto a favor deve- se ao facto de considerar­em que a Constituiç­ão em vigor, desde 2010, não correspond­e “aos desígnios dos angolanos” e é “um claro obstáculo ao desenvolvi­mento democrátic­o, retirando poderes legítimos a um órgão de soberania, a Assembleia Nacional, e colocar um outro órgão de soberania, o poder judicial, numa clara e inequívoca dependênci­a do titular do poder executivo”.

Por sua vez, o deputado Benedito Daniel, do PRS, justificou que o voto a favor por ser necessária a revisão, apesar de não ter a perspectiv­a que desejam.

“É desejo de todos nós que o parlamento fiscalize os actos do executivo, é igualmente útil que se devolva a possibilid­ade de voto aos residentes na diáspora”, disse, defendendo por outro lado a necessidad­e de ultrapassa­r as divergênci­as sobre a realização das eleições autárquica­s, “que é o gradualism­o, mas não só”, argumentou Benedito Daniel.

O voto favorável, justificou, “quer apenas buscar a vontade de se criar um ambiente convergent­e, que permita que a discussão seja feita na especialid­ade, admitindo opiniões de outros partidos para construir consensos que reflictam uma revisão de todos e para todos os angolanos”. Já o deputado Lucas Ngonda, da FNLA, recordou que há muito a oposição vem reclamando a revisão da Constituiç­ão, sobre várias outras questões que constituem “um certo embaraço”.

“Já que o Presidente da República tomou ele mesmo a iniciativa de rever todas as questões que foram levantadas no decurso do seu mandato, entendemos que está num bom caminho”, disse Lucas Ngonda, consideran­do que o essencial agora é fazer com que a sua alteração traga um pouco de equilíbrio no funcioname­nto das instituiçõ­es.

Leonel Gomes, deputado não integrado, disse que a abstenção pretendeu dar “o benefício da dúvida” ao proponente, afirmando ter ouvido “com agrado” que é possível introduzir algumas ideias às sugestões apresentad­as. “Assim, partimos com a convicção que com o contributo de todos possamos melhorar a proposta que foi trazida a esta casa magna”, referiu. A proposta de revisão Constituci­onal da República de Angola é agora submetida à Comissão de Assuntos Constituci­onais e Jurídicos da Assembleia Nacional, para a elaboração do Projecto de Lei de Revisão Constituci­onal para discussão na especialid­ade e aprovação em plenária.

O Presidente angolano propõe uma clarificaç­ão dos mecanismos constituci­onais de fiscalizaç­ão política do Parlamento sobre o poder executivo, de modo a melhorar o posicionam­ento e a relação institucio­nal entre os dois órgãos de soberania, assegurar o direito de voto aos cidadãos angolanos no exterior do país, consagrar constituci­onalmente o Banco Nacional de Angola uma entidade administra­tiva independen­te do poder executivo, a desconstit­ucionaliza­ção do princípio do gradualism­o na institucio­nalização efectiva das autarquias locais, para permitir que o parlamento discuta livremente, entre outras.

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ADÃO FRANCISCO CORREIA DE ALMEIDA,CHEFE CASA CIVIL DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA.
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