Folha 8

UM PAÍS DIVIDIDO SOBRE DIREITOS E OPORTUNIDA­DES

- TEXTO DE ANTÓNIO KUNGA

Aentrada em vigor do novo Código Penal, sem querer entrar no mérito do seu bojo principal, tem estado a causar celeuma na sociedade acentuando uma profunda divisão, entre conservado­res e moderados, quanto a interpreta­ção da norma jurídica e o fim último do legislador material, quanto à liberdade de orientação sexual. Desde logo emergiram dois grupos: os prós e os contras, divergindo entre ter sido uma aceitação que configura, quanto a moral e os bons costumes um “crime abominável’’, mas os outros reagindo no reconhecim­ento do `’respeito pelas diferenças’’.

No entanto o Código não atende a Constituiç­ão que continua a considerar o matrimónio válido, tanto no civil, como religioso, como sendo a união de um homem e uma mulher, que se tornará difícil contornar, numa querela jurídica ou pretensão da comunidade, que defende o contrário, nomeadamen­te a comunidade LGBT( Lésbicas, Gay, Bissexuais, travestis, transsexua­is e trangenero­s), que considerar­am o dia 11.02.2021 como o “Dia do Orgulho Nacional LGBT’, por ter sido a data de entrada em vigor do novo código penal, que substituiu o de 1886. Um dos rostos mais visíveis e irreverent­es desta comunidade, Imanni da Silva, conhecida activista deste movimento, considera ter sido um marco, ainda que se esteja a interpreta­r mal a norma pois deixou isso vincado ao celebrar na sua página no Facebook, o facto do novo Código penal, prever, no n. º 3 do art. º 170. º : “As penas estabeleci­das nos números anteriores são agravadas de metade nos seus limites, mínimo e máximo se a ameaça for dirigida a uma pessoa por causa da sua raça, cor, etnia, local de nascimento, sexo, ORIENTAÇÃO SEXUAL, doença ou deficiênci­a fisica ou psíquica, crença ou religião, convicções políticas ou ideológica­s, condição ou origem social ou quaisquer outras formas de discrimina­ção”. E é aqui, que Imanni da Silva, há 10 anos nesta cruzada vê uma janela aberta para a legalizaçã­o da comunidade, que anseia por este reconhecim­ento legal de forma ainda mais explicito, para que não fique a pulga por detrás da orelha. “Fiz cirurgia que permitiu mudar o órgão sexual ( pénis, para rachadura de vagina)”. E nesta onda de contentame­nto não está sozinha ( o), pois a comunidade pelo que se sabe, justifica tem vindo a crescer, muito, em Angola.

“Esta nova lei foi bastante aplaudida, aqui e mesmo no mundo, com as nossas congéneres a saudar a iniciativa como uma evolução da mentalidad­e dos legislador­es angolanos’’, disse a activista.

No entanto se uns ficaram eufóricos e optimistas, outros mantém- se cépticos, condenando a aprovação e mesmo o sentido dúbio do art. º 170. º do Código Penal, que pode deixar no ar, na sua opinião, “uma interpreta­ção dúbia e leviana, capaz de se descambar, numa autêntica heresia, como o conhecido deputado a Assembleia Nacional, pela bancada da CASA – CE, Makuta Nkondo, que reprovou a iniciativa, ainda que incubada veleidade de se legalizar “o diabo cultural”, que atenta contra a cultura Bantu: `’ homossexua­lidade é um crime abominável’’, justifica o parlamenta­r, sublinhand­o, em aditamento que `’ Nzamby ( Deus) criou o homem e a mulher, como elementos reprodutor­es da família e sobrevivên­cia de uma sociedade sádia’’.

No ar o tradiciona­lista homem das leis, deixa no ar a seguinte interrogaç­ão: `’ Onde é que os homossexua­is arrajam filhos? Adoptar filhos nascidos da heterossex­ualidade é malandrage­m. É brincadeir­a! Não deviam adoptar filhos de ninguém, deviam, sim, fazer filhos à maneira deles’’, asseverou. Noutro extremo, a Igreja Católica não sai dos seus pergaminho­s de considerar que a criação do mundo e a visão cristã, pugna pela união entre o homem e mulher, único matrimónio reconhecid­o no seu seio, pese não poder discrimina­r a entrada de qualquer fiel, no seu interior, até por não haver um detector de opção sexual, nas entradas.

“Nós mantemos a nossa tradição de não reconhecer o homossexua­lismo, mas puygnamos, enquanto católicos, pelo respeito de todos os seres humanos, que franqueiam as nossas portas, para oração e intercepçã­o com Deus e o seu filho, Jesus Cristo”, disse ao F8 o padre Joaquim N. P. Andrade acrescenta­ndo que, mesmo as ovelhas desgarrada­s “têm direito ao respeito, à amizade, à justiça e de poderem participar numa comunidade cristã’’. O processo está longe de ter chegado a resultados conclusivo­s e ao fim, mas o caminho se faz caminhando, pois as portas de hoje, deixam entrar uma luz de discussão do papel da pessoa humana cristã, da sua dignidade e direitos como cidadão e como cristão.

As critícas de Makuta Nkondo e da ortodoxia de parte da Igreja Católica, não parecem, abalar a convicção de Imanni da Silva, que assegurou, que a homossexua­lidade “fez parte da diversidad­e sexual humana, desde que o mundo é mundo, pelo que, tentar negar este facto e das civilizaçõ­es africanas não terem um histórico de relações entre pessoas do mesmo sexo é um reflexo de machismo e preconceit­o enraizado na estrutura mental de algumas pessoas’’, concluiu.

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Angola