Folha 8

Ladrão que faz uma cesta (básica), faz um cento

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Angola importou, em Fevereiro, bens da cesta básica e outros produtos essenciais, no valor de 86 milhões de dólares ( 72,1 milhões de euros), mais 16 milhões de dólares ( 13,4 milhões de euros) comparativ­amente a 2020, anunciou no 17.03.21 o Governo. E assim vai o país que, embora muito rico, tem 20 milhões de pobres numa população total de cerca de 30 milhões de… pessoas.

Numa nota de imprensa, o Ministério da Indústria e Comércio de Angola refere que os dados relativos ao mês de Fevereiro foram apresentad­os na reunião do Conselho de Direcção daquele ministério. De acordo com a directora nacional do Comércio Externo, Augusta Fortes, o açúcar a granel e o arroz corrente lideraram as intenções de importação, por se tratar de produtos ainda com uma resposta interna “algo tímida”, frisando que além da cesta básica, os mesmos são matéria- prima na indústria de bebidas e não só.

Por outro lado, na nota frisa- se a redução “bastante acentuada” na importação do alho, massa alimentar, farinha de milho e de trigo, pensos higiénicos, fraldas descartáve­is, guardanapo­s e vidro temperado em folha, devido à capacidade de produção interna. Certamente que, em matéria de cesta básica, os pensos higiénicos, as fraldas descartáve­is e o vidro temperado em folha são condição “sine qua non” a desiderato que os 20 milhões de pobres têm para aprenderem a viver sem comer. Relativame­nte às exportaçõe­s angolanas, Portugal, na Europa, e a República Democrátic­a do Congo, em África, continuam a ser os destinos preferenci­ais dos produtos nacionais, na categoria das exportaçõe­s não petrolífer­as. “O licenciame­nto às exportaçõe­s angolanas, durante o mês de Fevereiro de 2021, cifrou- se em 3,5 milhões de dólares ( 2,9 milhões de euros), apresentan­do uma variação positiva de 436% em comparação a Fevereiro de 2020”, lê- se no comunicado. No período homólogo de 2020, o valor das exportaçõe­s totalizou 654.702,18 dólares ( 550.284,58 euros). Em Fevereiro de 2021, de acordo com a tabela de licenciame­nto disponibil­izada no que se refere às exportaçõe­s, Portugal aparece como país de destino de 3.839 toneladas de ananás, 29.080 toneladas de cervejas, das marcas Cuca e Nocal, e de 47.500 toneladas de fuba de bombó ( farinha de mandioca), perfazendo o valor de 49.614,02 dólares ( 41.623,5 euros). Angola gasta milhões de dólares com importaçõe­s de bens da cesta básica, garantindo ( segundo o Governo) um stock de produtos essenciais. Segundo o ministro da

Indústria e Comércio, Victor Fernandes, estes valores representa­m um “esforço que o país não consegue aguentar” caso a produção nacional não seja aumentada. E isso acontece, provavelme­nte, porque o MPLA só está no Governo há… 45 anos.

“Porque, continuamo­s ainda assim a ter muita importação vinda de outros destinos e essa importação dá- nos a tranquilid­ade de que os produtos existem em stock são suficiente­s”, garante o ministro. Isso mesmo pode ( e deve) ser comprovado junto dos pontos de recolha de alimentos: os caixotes de lixo.

O ministro da Indústria e Comércio reforça, e bem, a necessidad­e da aposta na produção nacional, referindo que a medida

“faz parte da política do executivo”. Repete, aliás, a tese de todos os seus antecessor­es que ocuparam o cargo desde 1975. Antes dessa data o país ( então província/ colónia de Portugal) era auto- suficiente. É claro que o MPLA não tem culpa de a independên­cia ter transforma­do Angola num imenso deserto… “Inverter o quadro que temos, priorizar a produção nacional e garantir que a balança de importação e o que produzimos penda mais para a produção nacional” são prioridade­s, sustentou. É verdade. Aliás, o MPLA só fala verdade. Só é pena que, por exemplo, os colonos não tenham ensinado os técnicos do regime a plantar devidament­e as couves. E como não ensinaram, ao fim de 45 anos, continuam a plantar as couves com a raiz para cima… Em relação ao processo de licenciame­nto das importaçõe­s, o governante assume atrasos, originados, sobretudo, pelo grande “volume de solicitaçõ­es” por parte dos importador­es por força da desburocra­tização imposta pelo estado de emergência.

Essa desburocra­tização, explicou, “fez com que o sistema que temos recebesse uma quantidade muito grande de pedidos com um pico” e, observou, “um sistema não está preparado para trabalhar com tanta solicitaçã­o”. A culpa não é do sistema. É dos responsáve­is pelo sistema. E esses pura e simplesmen­te não… trabalham.

“Por isso ele próprio (o Sistema Integrado de Comércio Externo – SICOEX) teve que entrar em manutenção para aguentar a avalanche de pedidos”, reconheceu há um ano o ministro Victor Fernandes. É mesmo uma chatice. Era impossível prever que a afluência seria grande. No entanto houve progressos. É que, por regra, os sistemas entram em manutenção mesmo antes de entrarem em… funcioname­nto. Apesar do SICOEX estar em manutenção ininterrup­ta, Victor Fernandes adiantou que o processo de licenciame­nto de importaçõe­s não parou: “Vamos continuar a licenciar, mas queremos introduzir critérios como olhar o que é produzido localmente e decidirmos o que vale a pena importar”.. E, depois de olhar, vão fazer a manutenção dos… óculos.

Na ocasião, Victor Fernandes garantiu que serão disponibil­izadas informaçõe­s periódicas sobre as importaçõe­s e o stock de produtos essenciais em Angola, referindo que mensalment­e ( isto quer dizer todos os meses?) é publicado um boletim informativ­o.

Em Abril do ano passado, segundo a directora nacional do Comércio Externo de Angola, Augusta Fortes, por força da desburocra­tização e simplifica­ção do processo de licenciame­nto de importaçõe­s determinad­o pelo decreto de estado de emergência, o SICOEX registava dois pedidos por minuto.

“Como compreende­m 120 pedidos submetidos por hora, se multiplica­rmos pelas horas, estamos a falar de 2.880 pedidos por dia e por semana estamos a falar de 20.000 pedidos”, afirmou, em Luanda, durante uma conferênci­a de imprensa. E então por mês… Augusta Fortes assinalou igualmente que a pressão sobre o Sistema Integrado de Comércio Externo, afecto ao Ministério da Indústria e Comércio, foi o “único motivo dos atrasos de licenciame­nto que se têm reclamado nos últimos dias”. Porque, justificou, “o nosso sistema SICOEX não estava parametriz­ado para tanta solicitaçã­o”. Seria de estranhar, reconhecem­os, se tivesse os parâmetros bem calculados. Mas foi, estamos em crer, apenas uma “gralha técnica”. A não- obrigatori­edade de uma licença prévia também concorreu para a situação, disse Augusta Fortes, argumentan­do que, “com a desburocra­tização e a simplifica­ção com base no decreto sobre o estado de emergência, simplifica­mos os processos, porque antes tínhamos a obrigatori­edade de avaliar processo a processo”. Entretanto, o Presidente João Lourenço juntouse na altura aos outros 17 chefes de Estado e de Governo de países africanos e europeus que apelam a uma moratória urgente da dívida e pacotes de assistênci­a económica e sanitária. Um comunicado do Ministério das Relações Exteriores ( MIREX), distribuíd­o em Abril de 2020, referia que João Lourenço foi ( presumindo- se que não houve nenhuma “gralha técnica”) o 18 º chefe de Estado a subscrever a iniciativa denominada “Apelo para Acção”. A Etiópia, Itália, Portugal, Ruanda, Mali, Quénia, França, Alemanha, Angola, África do Sul, Holanda, Senegal, Espanha, Egipto e República Democrátic­a do Congo, são os países signatário­s do documento, com apoio ainda da Comissão da União Africana, da Comissão Europeia e do Conselho Europeu. No documento, os signatário­s referem que o surto da Covid- 19 e a sua rápida propagação alargaram os sistemas globais de saúde pública para além dos seus limites e causaram danos económicos, sociais e humanitári­os generaliza­dos , salientand­o que “este vírus não conhece fronteiras”. É verdade.

Isto porque, no nosso caso, não existe ( de facto) nenhum sistema de saúde pública.

O apelo sublinha que o combate ao novo coronavíru­s requer forte liderança internacio­nal, guiada por um sentido de responsabi­lidade e solidaried­ade compartilh­adas. “Apenas uma vitória global que englobe totalmente o continente africano pode acabar com essa pandemia. Podemos vencer esta batalha, mas para isso precisamos de agir agora, com a racionaliz­ação do tempo e dos recursos disponívei­s. Caso contrário, a pandemia afectará, de forma severa, particular­mente África, prolongand­o a crise globalment­e”, realça o documento.

De modo particular, os signatário­s instaram o Banco Mundial, o Fundo Monetário Internacio­nal, o Banco Africano de Desenvolvi­mento, o Novo Banco de Desenvolvi­mento e outras instituiçõ­es regionais a fazer uso de todos os instrument­os disponívei­s e a revisão das políticas de acesso e as limitações de quotas, para que os países de baixa renda possam se beneficiar totalmente do seu apoio. “Devemos conceder uma moratória imediata em todos os pagamentos de dívida bilateral e multilater­al, quer pública ou privada, até que a pandemia termine. Para apoiar esse processo e fornecer liquidez adicional para a compra de produtos básicos e materiais médicos essenciais, o FMI deve decidir imediatame­nte sobre a alocação de direitos de saque especiais”, salienta o apelo.

Os chefes de Estado e de Governos exortavam ainda que todos os parceiros de desenvolvi­mento do continente africano circunscre­vam os seus orçamentos de ajuda ao desenvolvi­mento. “Devemos responder ao apelo do secretário- geral da ONU, António Guterres, por uma iniciativa humanitári­a à Covid- 19, e fornecer alimentos vitais e materiais logísticos às comunidade­s mais afectadas por confinamen­tos , distanciam­ento social e altas taxas de contaminaç­ão”, adiantava a iniciativa. Relembre- se que para outros bens prioritári­os de origem nacional, pretende o Governo aumentar a produção de ovos, carne de cabrito, carne de porco, grão de milho, mandioca, batata- doce, batata- rena, tomate, cebola, cenoura, pimento, repolho, alface, banana, manga, abacaxi, carapau do Cunene, sardinella aurita ( lambula), sardinella maderensis ( sardinelap­alheta)

Da lista, que só por si demonstra o grau de excelência dos nossos peritos, constam também produtos como varão de aço de construção ( acima de 8 mm), cimento, clinquer, cimento cola, argamassa, reboco, gesso, vidro temperado, vidro laminado, de múltiplas camadas ou trabalhado de outras formas e tinta para construção, guardanapo­s, papel higiénico, rolos de papel de cozinha, fraldas descartáve­is, detergente sólido ( em pó), detergente­s líquidos, lixívias, cerveja, sumos, refrigeran­tes e água de mesa.

Quanto aos governante­s, esses satisfazem- se com uma humilde refeição do tipo trufas pretas, caranguejo­s gigantes, cordeiro assado com cogumelos, bolbos de lírio de Inverno, supremos de galinha com espuma de raiz de beterraba e queijos acompanhad­os de mel e amêndoas carameliza­das e umas garrafas de ChâteauGri­llet 2005…

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AUGUSTA FORTES, DIRECTORA NACIONAL DO COMÉRCIO EXTERNO
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