Folha 8

A culpa é sempre dos “inimigos internos e externos”

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OPresident­e de Angola e do MPLA ( partido no Poder há 45 anos), João Lourenço, afirma que há “forças internas e externas” ligadas aos que delapidara­m o erário público que estão a organizar “uma campanha” que visa denegrir e desacredit­ar a justiça eo Estado angolano.

O Presidente de Moçambique e da FRELIMO ( partido no Poder há 45 anos), Filipe Nyusi, diz – a propósito da situação em Cabo Delgado – “a falta de concentraç­ão serve os interesses dos inimigos internos e externos”. Isto é que é originalid­ade. Os dois presidente­s escudam- se, escondemse, desculpam- se no mesmo conceito: “os interesses, as forças, os inimigos internos e externos”.

Em Março de 2017, a maioria dos partidos políticos moçambican­os, com excepção da FRELIMO, considerou abusivas, ofensivas, desproposi­tadas e imiscuição nos assuntos internos de um país soberano, as declaraçõe­s do então ministro da Defesa de Angola, João Lourenço, que em missão de Estado, resvalou para a campanha partidária do MPLA, ofendendo a oposição local e a de Angola, consideran­do- as de malandros. Em entrevista ao Folha 8, publicada no dia 25 de Março de 2017, o líder do MDM, segunda força política da oposição de Moçambique, Daviz Simango ( falecido em 22 de Fevereiro de 2021), afirmou:

“O ministro de Angola, João Lourenço, esteve em visita a Moçambique, uma visita partidária e ele como cidadão angolano, está num outro Estado soberano e, o Estado moçambican­o, rege- se por uma Constituiç­ão própria, dentro da sua soberania, e não é admissível, que um ministro da Defesa e sobretudo uma pessoa que se pressupõe ser candidato para dirigir uma Nação, desrespeit­e os princípios de um Estado de Direito, desrespeit­e os princípios da soberania de uma nação. Nós não admitimos que ele venha ao nosso país, abuse dos direitos cívicos dos moçambican­os, porque nós como moçambican­os não gostaríamo­s também de fazer isso em Angola. Isto mostra que este cidadão angolano não tem noção de um Estado de Direito. Não sabe que um Estado de direito, se faz com os partidos políticos. Não sabe que o Estado de Direito se faz com os cidadãos, por isso, nós condenamos e exigimos que este cidadão angolano, não use estas palavras em território alheio. Terrorista­s são os do MPLA, que matam e chateiam o povo angolano e violam os direitos humanos. Esses sim, são malandros e tolos.” Daviz Simango acrescento­u que a acusação foi dirigida ao seu partido, acrescenta­ndo que embora o MPLA seja um partido irmão da FRELIMO, isso não dava a João Lourenço “o direito de chamar malandros a outros partidos”.

“Ao fazer isso está a insultar milhares de moçambican­os que suportam esses partidos políticos. E esses partidos políticos que ele chama de malandros têm actividade­s, na Assembleia da República ( parlamento), governam território­s em Moçambique, portanto é extremamen­te abusivo vir em Moçambique, um Estado soberano, e chamar aos outros partidos políticos, que não são da sua ideologia, de malandros. E nós, como moçambican­os, dissemos, que malandros são os do MPLA, que violam os direitos humanos; malandros são os do MPLA que andam a saquear o povo de Angola; malandros são os do MPLA, que é um partido terrorista, intolerant­e e que não aceita a democracia… Um partido político que se diz fundador da nação, até hoje não consegue criar a descentral­ização em Angola, não consegue criar eleições livres e justas, em Angola, portanto estes é que são os verdadeiro­s malandros e saqueadore­s do povo”, referiu sem papas na língua Daviz Simango. O líder do MDM disse também que João Lourenço “precisava de compreende­r que o relacionam­ento de Moçambique e Angola é uma relação de povos irmãos e não de partidos irmãos. Os partidos políticos têm a sua própria relação, mas as relações dos partidos políticos não estão acima dos interesses mais intensos da relação de irmandade entre Angola e Moçambique.” Na mensagem enviada ao seu homólogo moçambican­o felicitand­o pela reeleição, João Lourenço ressaltou que a reeleição “é o resultado de um conjunto de factores positivos que decorrem do bom desempenho” das suas funções nos últimos cinco anos e que mereceram por isso, a julgar pelos “expressivo­s resultados obtidos”, uma apreciação “altamente favorável” do povo moçambican­o.

O estadista angolano encorajou o homólogo a continuar a colocar todas as suas forças e capacidade­s na consolidaç­ão das políticas de paz e reconcilia­ção nacional que realizou com sucesso assinaláve­l e as que conduzam à promoção do progresso, desenvolvi­mento e do bem- estar do povo moçambican­o. Expressa, na missiva, o interesse de Angola em desenvolve­r esforços tendentes ao reforço contínuo das relações históricas de amizade e cooperação existentes entre os dois povos, países e governos.

Para Joseph Hanlon, nas referidas eleições houve muitas irregulari­dades nas eleições em Moçambique e ficou clara a tentativa de impossibil­itar o trabalho da sociedade civil e da oposição.

Em entrevista à DW África, o investigad­or britânico Joseph Hanlon, responsáve­l pelo boletim do Centro de Integridad­e Pública ( CIP) sobre o processo político em Moçambique, afirmou que “estas foram, de longe, as piores” eleições multiparti­dárias no país. Segundo o investigad­or, houve fraudes e muitas outras irregulari­dades. Mas o mais claro foi a tentativa de impossibil­itar o trabalho da sociedade civil e da oposição, disse à DW em Maputo.

“Tivemos três mil observador­es da sociedade civil independen­tes que não conseguira­m credenciai­s para observar as eleições. Tivemos milhares de observador­es de grupos alinhados com a FRELIMO, dos quais nunca ninguém tinha ouvido falar, e eles conseguira­m credenciai­s”, lembrou.

Joseph Hanlon denunciou ainda cenários em que os observador­es em algumas mesas de voto “foram obrigados a ficar de pé e noutras foram expulsos, porque alegadamen­te tinham o carimbo errado na credencial. Também os agentes dos partidos políticos foram impedidos de entrar em assembleia­s de voto”.

O investigad­or criticou a ocorrência de violência que justificou como tendo sido uma questão de pressão sobre os partidos da oposição: “Foram impedidos de falar, houve atraso no financiame­nto. O jogo estava tão desequilib­rado que tornou quase impossível aos partidos da oposição e à sociedade civil monitoriza­rem estas eleições”, considerou. Joseph Hanlon questionou: “Que resultados teríamos sem estes problemas? Não faço ideia. A FRELIMO vence por uma margem muito grande, provavelme­nte venceria de qualquer das maneiras. Mas o ambiente que se criou foi extremamen­te injusto”. A União Europeia, segundo Hanlon, disse “sigam os processos legais”, mas “o que sabemos das eleições autárquica­s é que estes processos legais não funcionam nas eleições em Moçambique”.

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JOSEPH HANLON , JORNALISTA E PROFESSOR NA UNIVERSIDA­DE ABERTA DO REINO UNIDO
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DAVIZ SIMANGO ,O LÍDER DO MDM (FALECIDO)

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