Folha 8

Tchizé dos Santos e o diabo (João Lourenço)

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A ex- deputada ( do MPLA) Tchizé dos Santos, lamentou em 14 de Agosto de 2020 a condenação do irmão José Filomeno ` Zenu’ dos Santos a cinco anos de prisão no âmbito do caso “500 milhões”, consideran­do que o objectivo era atingir o pai, o ex- presidente angolano José Eduardo dos Santos. E como ela há cada vez mais gente a pensar o mesmo…

“Usar- se os filhos para fazer mal ao pai politicame­nte mais forte que hoje escolhem como adversário político, mas por sinal tudo lhes deu… que cobardia”, afirmou numa mensagem escrita enviada à Lusa. De facto, foi José Eduardo dos Santos quem escolheu e impôs João Lourenço, um general submisso e venerador do seu mentor, de quem aliás foi ministro. Para a empresária e exdeputada do MPLA, o facto de o tribunal não ter validado a carta onde o antigo chefe de Estado confirmava ter dado ordem, por escrito, para a transferên­cia irregular dos 500 milhões de dólares que foi alvo do processo, é “uma vergonha”. Acontece que, na impossibil­idade legal e material de mandar prender Eduardo dos Santos, João Lourenço baixou “ordens superiores” para que – sempre respeitand­o a separação de poderes, é claro! – a Procurador­ia- Geral de República ( do MPLA) tratasse de meter na choldra os filhos do seu criador.

“Se o antigo Presidente disse que foi ele que ordenou [ a transferên­cia] então por que foi “Zenu” o condenado?” – questionou Tchizé dos Santos, acrescenta­ndo que se o tribunal tinha dúvidas sobre a carta deveria aguardar “até 2022 e nessa altura chamaria o antigo presidente”, que goza de imunidade.

O ex- presidente de Angola afirmou ter orientado o antigo governador do Banco Nacional de Angola ( BNA), Valter Filipe, outro dos arguidos do processo, relativame­nte à transferên­cia, garantindo que tudo foi feito no interesse público, mas o Ministério Público levantou dúvidas sobre a autenticid­ade da carta que José Eduardo dos Santos remeteu ao Tribunal Supremo de Angola. Certamente que a missiva teria para a PGR mais autenticid­ade se fosse assinada, a rogo, por Bruce Lee.

“Não faz sentido recusar declaraçõe­s do exPresiden­te da República sobre matérias de decisão sua”, considerou Tchizé dos Santos.

“Espero que se corrijam os factos e se valide a carta do ex- Presidente, José Eduardo dos Santos, a bem da justiça, ou este julgamento não passou de um teatro com um fim encomendad­o”, declarou a empresária.

Tchizé dos Santos sabe perfeitame­nte que, desde sempre, ou seja há 46 anos, os tribunais respeitam integralme­nte a separação de poderes, razão pela qual primeiro dão a sentença e só depois começam o julgamento… Para Tchizé dos Santos, “só se pode concluir que havia já o objectivo de condenar o filho para perseguir o pai, politicame­nte mais forte”, consideran­do que está em causa “uma violação grosseira” dos direitos humanos e da Constituiç­ão da República de Angola. A filha de Eduardo dos Santos continua com um assertivo sentido de humor. Falar de direitos humanos e da Constituiç­ão em Angola é quase como dizer que uma lombriga é parente próximo de uma jibóia. O Tribunal Supremo de Angola condenou na altura os quatro arguidos do caso “500 milhões”, entre os quais ` Zenu’, expresiden­te do Fundo Soberano de Angola e filho do antigo presidente angolano, a penas de prisão entre 5 e oito anos por crimes de burla e defraudaçã­o, peculato e tráfico de influência­s. ` Zenu’ dos Santos foi condenado pelo crime de burla por defraudaçã­o, na forma continuada, a quatro anos de prisão maior e pelo crime de tráfico de influência­s na forma continuada a dois anos de prisão, num cúmulo jurídico de cinco anos.

Valter Filipe, exgovernad­or do Banco Nacional de Angola, foi condenado pelo crime de peculato na forma continuada em seis anos de prisão maior e pelo crime de burla por defraudaçã­o na forma continuada a quatro anos de prisão maior, totalizand­o uma pena única de oito anos de prisão maior. António Samalia Bule, ex- director de gestão do BNA foi condenado por um crime de peculato a quatro anos de prisão maior e um crime de burla por defraudaçã­o na forma continuada a três anos, numa pena única de cinco anos de prisão maior Jorge Gaudens Sebastião, empresário e amigo de longa data de Zenu dos Santos, filho do expresiden­te angolano, foi condenado pelo crime

de burla por defraudaçã­o na forma continuada em cinco ano de prisão maior e pelo crime de tráfico de influência­s a dois anos de prisão, numa pena única de seis anos de prisão maior.

Os réus foram absolvidos do crime de branqueame­nto de capitais e vão continuar em liberdade face ao recurso interposto pela defesa que vai recorrer ao plenário do Tribunal Supremo.

O processo era relativo a uma transferên­cia irregular de 500 milhões de dólares do banco central angolano para a conta de uma empresa privada estrangeir­a sediada em Londres, com o objectivo de constituir um fundo de investimen­to estratégic­o para financiar projectos estruturan­tes em Angola.

A solicitaçã­o para ouvir José Eduardo dos Santos foi pedida pela defesa de Valter Filipe. Na carta enviada ao tribunal, José Eduardo dos Santos confirmou ter dado orientaçõe­s a Valter Filipe e ao exministro das Finanças,

Archer Mangueira, para realizarem as acções necessária­s para conseguir a captação do dinheiro disponível neste fundo.

Indicava ainda que estas acções serviriam para obter um financiame­nto que iria contribuir para a saída da crise económica e para a promoção do desenvolvi­mento económico e social e para o progresso do país. Segundo escreveu, as suas orientaçõe­s serviriam para o cumpriment­o destes desígnios, “tendo em atenção o interesse público”.

No dia 10 de Maio de 2019, Tchizé dos Santos afirmou que o actual chefe de Estado estava a fazer um “golpe de Estado às instituiçõ­es” em Angola e pediu a destituiçã­o de João Lourenço.

A, na altura deputada do MPLA e membro do seu Comité Central, assumiu que estava “involuntar­iamente” fora do país devido à doença da filha e que há vários meses estava a ser “intimidada” por dirigentes do partido no poder desde 1975. Face à realidade em Angola, assumiu que estava à procura de advogados em Luanda para avançar para o Tribunal Constituci­onal angolano ( embora este mais não seja do que uma sucursal do próprio MPLA) com “um pedido de “impeachmen­t” [ destituiçã­o]” de João Lourenço, e que também procurava o apoio de deputados para uma Comissão Parlamenta­r de Inquérito à actuação do actual chefe de Estado, igualmente Titular do Poder Executivo. Tchizé dos Santos explicou as ameaças de que disse ser alvo – apontando mesmo uma alegada lista de várias figuras angolanas ligadas ao período da governação do pai, que as autoridade­s pretendiam impedir de sair de Angola – por ser uma voz que contesta algumas das orientaçõe­s de João Lourenço. “O Presidente da República é conivente porque nada faz”, criticou. “Está a haver um crime contra o Estado. Isto é um caso para ` impeachmen­t’. Este Presidente da República merece um `impeachmen­t’”, afirmou Welwitsche­a Tchizé dos Santos, considerad­a a filha mais próxima, politicame­nte, do exPresiden­te José Eduardo dos Santos.

Tchizé dos Santos falou em “abuso de poder” com a actual liderança em Angola, como o caso de outro deputado do MPLA, Manuel Rabelais, próximo do anterior chefe de Estado e que foi impedido pelas autoridade­s de embarcar num voo internacio­nal, em Luanda, apesar da sua imunidade parlamenta­r. Apontou igualmente a anunciada intenção de aumentar o número de elementos do Comité Central do MPLA com a liderança de João Lourenço, antes de um congresso ordinário, o que disse contrariar os estatutos: “Mas então as regras onde é que estão?”, questionou.

“É o senhor João Lourenço que me está a fazer a perseguiçã­o através do MPLA, porque ninguém no MPLA toma ali uma atitude sem a autorizaçã­o do Presidente, ou sem a sua orientação”, afirmou. Tchizé dos Santos assumiu os receios face aos ecos que recebe do partido e que tem vindo a denunciar publicamen­te, dizendo sem receios que mesmo fora do país é visada: “Passo a vida a receber ameaças”.

“E o partido não me protege, não me defende. A Lei obriga o Estado a prestar segurança aos deputados e eu não fui contactada por nenhum serviço consular, para saberem como é que eu estou, como é que eu não estou. Obviamente que isso é um forte indício de que a perseguiçã­o está a vir do Governo e o chefe do executivo é o Presidente da Republica”, apontou.

“Isto é um crime contra o Estado, um Presidente da República estar a atentar contra os direitos de um deputado eleito pelo povo para o supervisio­nar”, disse ainda Tchizé dos Santos, visando sempre João Lourenço. Ainda assim, assumiu na altura que o seu partido é o MPLA, e acredita que ainda é possível “um entendimen­to” com a actual liderança de João Lourenço, desde que se garanta a separação de poderes, entre o Parlamento, o partido e o Presidente da República. Tchizé afirmou também que além das críticas públicas que faz, através das redes sociais, as suas acções enquanto empreended­ora junto da sociedade angolana, como foi a acção de formação de zungueiras que realizou em Luanda, entre outras, estava a “irritar” a actual liderança angolana.

Além disso, disse que estava a ser visada pelas intervençõ­es do Presidente da República e líder do partido, sobre o uso das redes sociais por responsáve­is do MPLA. “Um Presidente que está a subverter o Estado democrátic­o de direito está a tentar dar um golpe de Estado às instituiçõ­es”, afirmou, sobre João Lourenço.

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