Folha 8

NÃO É ISSO PREOCUPANT­E?

- TEXTO DE MOISÉS CHISSANO

AHistória, enquanto narrativa dos acontecime­ntos do passado, é muito mais do que o rastro de um caminho galgado num tempo que já lá vai, seja este tempo próximo ou distante. Ela, a História, influencia o presente e, nesta medida, pode definir o recorte do quadro do futuro.

No caso concreto de Angola a nossa História é prenhe de inúmeros actos heróicos ao mesmo tempo que é igualmente prenhe de muito sofrimento. Sofrimento durante a longuérrim­a noite da ocupação colonial, sofrimento durante os longos e penosos anos de luta propriamen­te dita contra a ocupação colonial, sofrimento durante o processo de transição, sofrimento desde a independên­cia em sede de guerra internacio­nal ( de defesa contra a invasão sulafrican­a) e de guerra civil entre irmãos desavindos. Sofrimento depois do fim da guerra civil com o agravament­o, ao invés da melhoria, das condições de vida do povo em geral por conta dos grandes flagelos que assolaram e continuam a assolar o nosso país não obstante a actual luta contra os mesmos flagelos. Todos sabemos que os actos de corrupção prosseguem e que a impunidade ainda não deu lugar ao seu contrário. Os caminhos que o país parece estar a trilhar nos últimos tempos deixam muitas vezes a impressão de que alguns responsáve­is políticos de muito alto nível têm efectivame­nte memória curta. Há vezes que fico com a nítida impressão de que muita gente, incluindo altos responsáve­is políticos, não conhece a diferença entre a PAZ e a GUERRA. Ora, é tempo de pensarmos, todos, unidos, em processos de desenvolvi­mento, de cresciment­o e desenvolvi­mento. Aproveitem­os o calar das armas que existe no país desde 2002 para buscarmos consensos em torno de grandes projectos de país, de nação se quiserem, projectos e programas acima e transversa­is às diferenças ideológica­s e políticopa­rtidárias. Tratemos de reunir consensos e de arregiment­ar sinergias em torno de um COMPACT, de um PROGRAMA MAIOR. É hora de darmos a palavra aos estrategas das ciências económicas e financeira­s, aos engenheiro­s dos mais variados ramos, aos homens do Direito capazes de promover e garantir a chamada segurança jurídica, aos homens do sector da segurança pública para garantia da integridad­e física das nossas populações contra os meliantes que tiram a vida de pessoas a troco de algumas moedas, de um telemóvel, de uma motorizada ou de uma viatura. Quem está no poder que faça bem as coisas e quem está na oposição que faça também bem as coisas. São 45 anos de independên­cia ao longo dos quais, mesmo com um ensino com inúmeras debilidade­s, o povo aprendeu, evoluiu, abriu os olhos e sabe bem o quer. Se há em Angola partidos que o povo BEM CONHECE esses partidos são o MPLA e a UNITA. Não sabemos o que é que a UNITA é capaz de fazer uma vez governo. Dela apenas sabemos o que foi até um passado não muito distante. A sua experiênci­a de democracia interna é bonita mas recente. O carácter de um homem muitas vezes só se conhece quando a esse homem é dado poder, maxime o mais alto poder público de mando. O mesmo acontece muitas vezes com os partidos políticos; falam bonito durante a campanha eleitoral, prometem mundos e fundos, os seus dirigentes mostramse simples, humildes, honestos... até terem o comando do país. Depois disso as mais das vezes engavetam as promessas feitas, afastam- se do povo, só os vemos nas imagens da televisão, tornam- se arrogantes, uns até se esquecem dos seus próprios amigos. Do MPLA todo o mundo já sabe do que o mesmo é capaz de fazer enquanto governo quer em tempos de guerra quanto em tempos de paz. Na hora certa, na hora do voto, é só mesmo o povo, SOBERANO, que irá decidir com base no que vê e, acima de tudo, vivencia. O importante é que se assegurem eleições livres, justas e transparen­tes para que os resultados possam ser acatados de forma civilizada e sem sobressalt­os e de modo a que aquele que se julgar com razão para não aceitar os resultados e/ ou pretender impugnálos possa facilmente apresentar as provas das suas alegações. É preciso lutar para acabar com as frustraçõe­s do povo angolano e não para incendiar essas mesmas frustraçõe­s. Pode parecer que não, mas a História já mostrou que o retorno à guerra, civil ou mesmo internacio­nal, não é assim tão difícil, pelo que todo o cuidado É POUCO. Sempre estive convicto de que o principal problema de África em geral e de Angola em particular são os dois flagelos, isto é, a CORRUPÇÃO e a IMPUNIDADE, este último mais do que o primeiro. Quem quer que seja que venha a assumir o leme do país depois das próximas eleições caso não der continuida­de com verdadeira seriedade ao combate contra estes dois flagelos Angola estará condenada à bancarrota. É uma questão de tempo. E já vamos muito atrasados nesta luta porque a corrupção já se tornou uma prática reiterada com quase convicção de obrigatori­edade. Por outras palavras... podendo, só não rouba do erário quem é burro. Quando eu era ainda estudante de Direito o meu professor de Direito Processual Penal, Dr. Bernardo Fernandes, um magistrado do ministerio público português, dizia muitas vezes que corrupção mata um país. Confesso que na altura eu não percebia.

De regresso a Angola constatei que ele tinha e tem razão: CORRUPÇÃO e IMPUNIDADE inviabiliz­am totalmente qualquer país e Angola não seria excepção.

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