Somos livres para estar de acordo ( com o MPLA)
Em Outubro passado, a VOA escreveu que jornalistas e fazedores de opinião em Angola não acreditam na liberdade de imprensa em ano eleitoral, a julgar pela contínua pressão do regime sobre os profissionais da classe. Nada de novo, portanto. Como o Folha 8 disse logo que João Lourenço tomou posse, e como dizia antes, Angola continua sem ter jacarés vegetarianos. Nos últimos tempos, como agora foi reiterado pelo simulacro de conferência de imprensa, as denúncias têm surgido de todos os lados de uma pressão cada vez maior do poder público para impedir que vozes que não as do Governo e do partido no poder, o MPLA, cheguem às antenas e páginas da imprensa pública, actualmente dominada pelo Estado, escreveu a VOA.
Há mais de um ano, o Governo passou para a tutela do Estado vários meios de comunicação pertencentes a antigos dirigentes por, segundo a Procuradoria- Geral da República ( PGR), terem sido adquiridos com recursos públicos.
“Não teremos nada de novo que nós não saibamos”, considera Jorge Eurico, editor do jornal em formato electrónico “O Kwanza”, acrescentando, escreve a VOA que para o jornalista, neste ano de pré- campanha “o circulo vai ficar cada vez mais apertado”.
O jornalista e director do jornal “O Crime”, Mariano Brás, diz que a crise económica colocou a imprensa privada numa situação de mendicidade e propensa ao aliciamento fácil no período eleitoral, mas também sujeita à intimidação e pressão políticas.
“Neste período de eleições,
a postura adoptada pelo regime é de intimidação. Não acredito que haverá um acompanhamento imparcial das eleições”, afirma Mariano Brás. Por seu turno, o reverendo e activista social Elias Isaac entende, segundo disse à VOA, que o problema da liberdade imprensa em Angola não está nos jornalistas mas “na estrutura política e de governação do país que fingidamente manifesta acreditar na democracia mas a sua alma e a sua essência é autoritária”. Refira- se que tanto o Sindicato de Jornalistas Angolanos como o Instituto de Comunicação Social da África Austral, MISA- Angola, têm denunciado nos últimos tempos uma maior pressão do Governo sobre jornalistas.
A liberdade de expressão global está “em declínio”, encontrando- se no nível mais baixo numa década, alertava o Article 19, que avalia o estado actual deste direito no mundo, e que coloca Portugal em 11. º lugar
no ranking e Angola num brilhantíssimo 104. º lugar. Esta informação consta no relatório “The Global Expression Report 2019/ 2020: The state of freedom of expression around the world”, divulgado pela organização internacional Article 19, numa análise a 25 indicadores em 161 países para elaborar um marcador geral com que pontua a liberdade de expressão numa escala de 1 a 100.
A classificação, onde a Dinamarca lidera, seguida da Suíça e Noruega, e a Coreia do Norte é o último da lista, agrupa os países dentro de cinco categorias: em crise, muito restringidos, restringidos, menos restringidos e abertos.
Os países escandinavos ocupam quatro das seis primeiras posições, sendo o Canadá ( em 4. º lugar) o único país não europeu no ‘ top 10’, no que respeita à liberdade de expressão aberta.
Portugal lidera o “top 5” no que respeita ao indicador ‘ liberdade de reunião’ de
forma pacífica. Numa análise aos países de língua oficial portuguesa, que constam do ranking, Timor- Leste é o que ocupa a melhor posição, em
54. º lugar, com liberdade de expressão menos restringida. Moçambique ocupa o
81. º lugar e o Brasil a 94. ª posição, com liberdade de expressão categorizada como restringida. Angola fica em 104. º lugar, com aquele direito classificado de muito restringido. A título de curiosidade, também Hong Kong tem a mesma classificação que Angola, ocupando o 111. º lugar.
“Na esteira da pandemia Covid- 19, enfrentamos um reequilíbrio global da relação entre indivíduos, comunidades e o Estado. Desde Dezembro de 2019, assistimos ao redesenhamento do mundo em inúmeras maneiras: as fronteiras aumentaram, a vigilância aumentou e o movimento foi drasticamente reduzido”, lê- se no referido relatório. Durante a pandemia,
“houve estados de emergência declarados em 90 países, criando situações legislativas excepcionais que têm permitido limitações de direitos e liberdades, foram mais de 220 as medidas e políticas globais que restringem a expressão, reunião, e informação, com evidências que as eleições também estão a ser vítimas de manipulação sob pretexto de protecção da saúde pública”, prossegue. Além disso, “mais de metade da população mundial – cerca de 3,9 mil milhões de pessoas – vivem em países onde a liberdade de expressão está em crise: o nível mais alto de sempre. O declínio a longo termo tende a ser em países com líderes democraticamente eleitos que mantiveram o poder por longos períodos e que lentamente corroeram as instituições democráticas”.
“A liberdade de expressão global está em declínio, actualmente no mínimo numa década”, sublinha. Aponta também que, “entre os receios de desinformação na crise da saúde”, a regulação dos media “tornou- se mais rígida, com a tendência das ‘ fake news’ a assumir novas proporções à medida que os governos usam a crise sanitária como desculpa para restringir ainda mais” liberdade de expressão. O relatório denuncia que o “poder sobre a liberdade de expressão é cada vez mais consolidado nas mãos de algumas redes sociais, embora o foco das autoridades continue a cair no policiamento dos utilizadores, em vez de garantir que as plataformas e empresas respeitam os direitos humanos”.