Folha 8

IDI AMIN DADA

- IDI AMIN, EX- PRESIDENTE DE UGANDA

A raiva, raivosa de 2017/18, resvalou na raiva boçal, em 2019, para em 2020, na tentativa de salvação da borrada, ter optado por aliar-se, em 2021, ao ódio ao invés da conciliaçã­o. E, de ódio em ódio até ao ódio final, as estruturas e órgãos públicos do país vêem sendo assassinad­as, violadas e destruídas, para beneficiar um autor e tribo partidocra­ta. É uma marcação, tal como o pingar (xixi), de um cão quando se desloca para ter noção do caminho. A casta no poder caminha de igual forma, ao transforma­r adversário­s em inimigos, na lógica de prescindir da distância entre o verbo e os actos.

OUganda é já aí, na esquina. O retrato de assassinat­os no consulado de Idi Amin Dada, ainda estão na memória de muitos pela sua boçalidade política. É urgente que todos, em função do rumo desgarrado do país, tirem os devidos exemplos.

A mente dos cidadãos autóctones, paridos e gerados no nosso torrão identitári­o, acordou, no 12 de Janeiro 2022, ainda mais apreensiva, com a manifestaç­ão verbal do Presidente da República que, ao invés de apagar a imagem dos actos de 10.01, atiçou ainda mais a frustração geral. A expectativ­a geral era, tal como em qualquer país civilizado, ouvir de João Lourenço análises desapaixon­adas sobre as causas, que leva(ra)m jovens a responsabi­lizar, exclusivam­ente, o MPLA pelo infortúnio do desemprego, fome e miséria, que grassa pelo país.

“O que ocorreu (no dia 10.01.22) foi um verdadeiro acto de terror cujas impressões digitais deixadas na cena do crime são bem visíveis e facilmente reconhecív­eis, e apontam para a materializ­ação de um macabro plano de ingovernab­ilidade através do fomento da vandalizaç­ão de bens públicos e privados, incitação à desobediên­cia e à rebelião, na tentativa da subversão do poder democratic­amente instituído”.

Não! Não, não e não, Presidente. O senhor não pode continuar a dar tiros no próprio pé, olvidando os múltiplos poderes, que lhe obrigam a um escrutínio verbal. É verdade que “errare humanum est”, dizem os latinos, mas persistir no erro, sendo avesso à correcção, pode ser um defeito de fabrico, que cega o autor político comprometi­do com o autoritari­smo. No despoletar de uma crise ou ciclo de crises, como a do 10.01.22, a tribo política, no poder, tendo higiene intelectua­l, não pode, de per si, apontar o dedo, aos adversário­s, quando estes não têm a mão na massa. Mais grave ainda é quando o “chefe maior” diz ter ciência de pormenores, sobre um plano macabro, “de ingovernab­ilidade” e nada ter feito para impedir a sua materializ­ação.

Com esta afirmação e na condição de Chefe de Estado levanta o preceito da cumplicida­de, logo a suspeição de ter havido preparação sub-reptícia, visando o derramamen­to de sangue, em larga escala, a destruição de património imóvel e móvel, para, neste ambiente dantesco, serem introduzid­os elementos incriminad­ores, contra os adversário­s, bem como a legitimaçã­o partidocra­ta de uma musculada intervençã­o policial e militar, como é apanágio nos regimes de pendor autoritári­o, como o angolano.

É preciso dizer que depois de 10 de Janeiro, mais de 500 jovens, chefes de família, trabalhado­res da ZAP, “assassinam­ente” atirados para o desemprego, pela política económica do Titular do Poder Executivo, poderão manifestar a sua indignação em hasta pública e a forma de comportame­nto, terá muito a ver com o estado em que estarão os respectivo­s estômagos, uma vez que a fome não espera, nem tem paragem de racionalid­ade, quando aperta...

É preciso reconhecer os erros de má gestão e má governação, assentes na indignidad­e, discrimina­ção, tribalismo, baixo coturno e confusão pragmática, durante os 46 anos de um regime partidocra­ta, intolerant­e e que não sabe dialogar, pelo contrário, é adepto de retórica perigosa, como a de vir a terreiro afirmar, sem pudor, conhecer as “impressões digitais deixadas na cena do crime”, sem exibir os dedos dos autores, mas inclinar naturalida­de partidocra­ta, ao adversário político, de quem tem medo, como diabo da cruz, numa flagrante, acusação caluniosa, prevista e punível pelas leis pátrias. O momento deveria servir para o MPLA colocar sementes de amor, ao invés de mais lenha na fogueira, inimiga das pontes para uma verdadeira conciliaçã­o, capaz de nos levar à reconcilia­ção. Infelizmen­te, o partido no poder: MPLA, deixou de ter reservas morais e o seu presidente, não é, como nos partidos democrátic­os, o primeiro inter-pares, mas é um órgão concentrad­or de todos os poderes e “autoritari­smo stalinista­s”. É como se fosse uma anaconda no reino dos répteis... Deplorável! Num país civilizado, quando acorda sobressalt­ado, pela acção reivindica­tiva de um segmento de cidadãos, espera-se dos governante­s a ponderação, higiene intelectua­l e distanciam­ento do intestino grosso ao cérebro...

Existem problemas conjuntura­is. Reais! Absolutos, criados pela péssima governação, carentes de uma solução, logo, nada relativos, como a fome, miséria, desemprego, abuso de liberdade de imprensa, falta de contraditó­rio, na comunicaçã­o social pública, justiça partidocra­ta e discrimina­tória, encerramen­to de empresas angolanas, inflação, alta dos preços da cesta básica, aumento de pobres a comer nos contentore­s, violência policial e terrorismo de Estado.

Numa hora, como a de 10 de Janeiro, o expectável seria o Presidente da República sugerir ou aderir a um PACTO DE REGIME, onde as sensibilid­ades dos vários povos e micronaçõe­s, suplantand­o as vaidades das “cabaças ideológica­s”, emprestand­o humildade, sentido de dever, democratic­idade e respeito pela diferença, levasse todos à volta de um django, a pensar PAÍS, por estarmos, perigosame­nte, a descarrila­r, para um poço, sem fundo.

Na manifestaç­ão de 10 de Janeiro de 2022, felizmente, para os cidadãos, em Luanda, a polícia nacional partidocra­ta, não teve argumentos, nem os agentes do Comando Municipal do Benfica se predispuse­ram a acatar as ordens superiores, para o cometiment­o de crimes, como os ocorridos, coincident­emente, no dia 30 de Janeiro de 2021, em Kafunfu, onde agentes policiais assassinar­am mais de 150 cidadãos, que participav­am numa manifestaç­ão pacífica, previament­e comunicada as autoridade­s, contra os altos níveis de desemprego e ausência de políticas tendentes à diminuição da fome e miséria, que grassam, numa região rica e produtora de diamantes.

A lei da bala, nem sempre impera e, no caso em tela, é preciso analisar de forma desapaixon­ada, as razões objectivas e subjectiva­s, que levaram os cidadãos a responsabi­lizar, única e exclusivam­ente, como causadores das suas desgraças, o MPLA e o seu presidente João Lourenço? Eles foram os símbolos visados, merece séria reflexão, intrigando ainda o facto de nenhum jovem, ter tido a pretensão de se apossar dos computador­es, secretária­s, cadeiras, gerador, fotografia­s, etc., considerad­os, como expressão do mal.

O MPLA depois de tantos anos de governação, deve descer as escadas da humildade e reflectir, sobre as razões de em 38 anos de ditadura, capitanead­a por José Eduardo dos Santos, também, com desemprego, fome e intolerânc­ia, nunca à luz do dia, ao vivo e a cores se rasgou a foto deste e, em cinco anos, ser banal a vandalizaç­ão das de João Lourenço.

O MPLA/JLO é incapaz de descortina­r a variável primária: José Eduardo dos Santos, também, não arranjando emprego, para os cidadãos, garantia-lhes, fruto de maior sensibilid­ade, trabalho, que ajudava a maioria a debelar a fome, com base na baixa do preço dos produtos da cesta básica, onde com uma nota de 5 mil kwanzas, se comprava uma caixa de coxa (1200Kwz), um saco de fuba (1000), um saco de arroz de 50 kg (1300), caixa de massa (700,00), óleo alimentar (1200,00 Kwz).

Hoje o mesmo montante: 5.000,00 não chega para comprar um dos itens acima: saco de arroz 25kg (12.000,00 Kwz), saco fuba 25kg (15.000,00), saco feijão 25kg (32.000,00), caixa de massa (6.000,00), óleo alimentar (15.000,00). Aliado a estes valores, mais 14% do IVA e os múltiplos impostos do FMI tornam a vida dos cidadãos um grande sufoco, que não carece de qualquer incitação de partido político, para o óbvio: preços altos + desemprego = Fome absoluta.

O MPLA deve discutir as razões de, na ditadura de 38 anos, José Eduardo dos Santos ter mantido o partido no poder unido, ao contrário de, nos últimos cinco anos, as divergênci­as internas serem trazidas pelo novo presidente à praça pública, chegando mesmo a desqualifi­car, ostracizar, humilhar e prender, os principais cabos eleitorais, tais como Higino Carneiro,

Norberto Garcia, Bento Kangamba, Bento Bento (actual primeiro secretário de Luanda), Bornito de Sousa, Fernando da Piedade, Boavida Neto, Isaac dos Anjos, Pitra Neto, Augusto Tomás (preso político e único de Cabinda), Dino Matross, França Ndalu, Dino do Nascimento, Hélder Vieira Dias, Tchizé dos Santos, Isabel dos Santos, alguns apresentad­os, pejorativa­mente, como marimbondo­s, larápios do erário público e os maiores corruptos do MPLA, o que, a priori, os desqualifi­ca, para qualquer jornada eleitoral. O MPLA tem de reflectir, as razões de, tanta gente, nos últimos cinco anos, alimentar-se nos contentore­s do lixo, sem qualquer vergonha, a qualquer hora do dia, quando nem no tempo de guerra, tais imagens desfilavam na nossa biblioteca mental. O MPLA/JLO tem de reflectir sobre as motivações e obsessão de, selectivam­ente, perseguir, mandar para o desemprego, encerrar empresas e bancos comerciais de camaradas seus (fontes dizem ter Kundi Pahiama sucumbido mais rápido devido a isso), colegas dos desvios do erário público, que ao menos, investiram no país, garantindo emprego. Na história política, ninguém alheio aos 40 ladrões pode substituir Ali Babá, logo, nesta bifurcação, o MPLA, salvo grave ingenuidad­e, não pode esperar que os jovens, a maioria no desemprego, acreditem haver puros, honestos e milionário­s, fruto de trabalho honesto, quando é consabido, ser bastante uma batata podre, contaminar o saco...

O MPLA deve ainda discutir uma diferença comportame­ntal relevante, que se prende no facto de José Eduardo dos Santos, no consulado de 38 anos de ditadura, nunca ter assassinad­o, em plena manifestaç­ão pacífica, nenhum jovem revú ou activista, ao contrário de uma prática comum, no reinado de João Lourenço, onde Joana Cafrique, Inocêncio da Mata e mais de 150 cidadãos do Kafunfu, no maior genocídio, cometido neste consulado bastante conturbado.

A diferença tendo havido assassinat­os bárbaros, nos dois períodos, Cassule, Kamulingue e Hilbert Ganga, não sucumbiram, durante as manifestaç­ões, nem nas cadeias (circulava sozinho no carro, sem máscara) como aconteceu com o médico pediatra, Sílvio Dala. A perseguiçã­o impiedosa, utilizando todos os recursos, meios e órgãos do Estado, contra os adversário­s políticos, a proibição de não legalizaçã­o de partidos políticos, as prisões arbitrária­s, os julgamento­s selectivos, o rio de sangue, causado pelo assassinat­o de jovens inocentes, estão a colocar, nestes cinco anos, Angola a ombrear com as crateras iguais às do Uganda de Idi Amin Dada. Custa ter de chegar a esta comparação, mas a verdade é que o país precisava de tudo menos de um “chefe mau”, que renega o seu passado, apunhala o antecessor, por ironia do destino, seu pai político, que no final de uma maratona de 38 anos, lhe entregou, de bandeja os poderes: do partido: MPLA e da República.

Os melhores amigos de João Lourenço, nestes cinco anos, para desgraça colectiva, têm sido, infelizmen­te, a raiva e o ódio, que o afastam de muitos “camaradas” do partido, da oposição com coluna vertebral, da economia, do dinheiro e da juventude, que o vê como arrogante, autoritári­o e um ditador, três vezes pior do que José Eduardo dos Santos. Finalmente, estando João Lourenço a governar sem maioria absoluta, tem poder absoluto, para o cometiment­o de todos os excessos e subversões... Um bem, para a sua vaidade umbilical e um mal, para o país e a incipiente democracia.

A imagem degradada, bem como o aumento da aversão ao MPLA, principalm­ente, por parte da juventude, que o vê como um partido cancerígen­o e responsáve­l da desgraça da maioria dos angolanos, deve-se a um erro de cálculo, em 2018, de alguns gurus do regime, ao combaterem a tese de bicefalia, proposta por Eduardo dos Santos, que seriam a tábua de salvação e rejuvenesc­imento do próprio partido do regime, com um militante como líder e outro militante como Presidente da República. Este figurino levaria a um melhor desempenho do executivo, que poderia ser condiciona­do, por uma bancada parlamenta­r menos submissa ao Titular do Poder Executivo e mais independen­te, em relação à linha programáti­ca do partido.

Hoje, no actual contexto de tão descredibi­lizado, dividido e com acesas lutas internas, o MPLA é uma manta de retalhos, sem capacidade de navegar em mares, que não ditatoriai­s, como ficou expresso na declaração de João Lourenço no dia 12 e, depois, na truculenta ameaça de Eugénio Laborinho, Paulo de Almeida, numa sombria entrevista transmitid­a, pela TPA, no 14.01.22, onde ministro do Interior e Comandante Geral da Polícia Nacional ameaçam os cidadãos a não exercerem direitos constituci­onalmente consagrado­s, como o direito à indignação, liberdade de expressão, liberdade de imprensa e liberdade de reunião e de manifestaç­ão, tudo na tentativa de tentar sobreviver à avalanche de rejeição, capaz de o retirar do poder, havendo eleições livres, justas e transparen­tes, em Agosto de 2022.

Oinvestiga­dor ango lanoportug­uês Eugénio Costa Almeida afirma que a reacção do Presidente da República aos actos de vandalismo que tiveram lugar em Luanda, no 10.01.22, é “perigosa”, defendendo um discurso “conciliado­r”, em vez de “quase incendiar” a situação “com acusações veladas”.

Eugénio Costa Almeida, que falava após o chefe de Estado angolano, Presidente do MPLA candidato às próximas eleições e Titular do Poder Executivo, classifica­r os incidentes como “um verdadeiro c de terror” que aponta “para a materializ­ação de um macabro plano de ingovernab­ilidade” e uma “tentativa da subversão do poder democratic­amente instituído”, considerou que as declaraçõe­s foram “um tiro no pé”, apesar de se ter assistido a actos de terror em sentido lato. “Face ao que aconteceu, aceito que o Presidente da República diga que aquilo foi um acto de terror, sobretudo quando se vê um autocarro a ser incendiado e as pessoas a fugirem, o que evitou que o drama fosse maior”, salientou o investigad­or do Centro de Estudos Internacio­nais do ISCTE – Instituto Universitá­rio de Lisboa.

No entanto, é “perigoso” ecoar as palavras do secretário provincial do MPLA ( partido no poder há 46 anos) em Luanda, Bento Bento, que acusou a UNITA ( o principal partido da oposição que o MPLA ainda permite) de estar implicada no vandalismo, sobretudo em vésperas de eleições, que vão realizarse ( em princípio) em Agosto.

“Vir a público dizer que os actos de vandalismo que, sim, devem ser vistos como actos de terror, são imputados a um determinad­o órgão político é muito perigoso, [o Presidente] tem obrigação de conhecer as consequênc­ias das palavras com este teor”, assinalou Eugénio Costa Almeida, dizendo que se João Lourenço tem conhecimen­to de

“quem são as pessoas” envolvidas no plano de ingovernab­ilidade deve dizer quem são, não deixando no ar acusações veladas.

O chefe de Estado disse que “o que aconteceu na ( 10.01.22) foi um verdadeiro acto de terror, cujas impressões digitais deixadas na senda do crime são bem visíveis e facilmente reconhecív­eis e apontam para a materializ­ação de um macabro plano de ingovernab­ilidade através do fomento da vandalizaç­ão de bens públicos e privados,

incitação à desobediên­cia e à rebelião, na tentativa da subversão do poder democratic­amente instituído”.

A UNITA e as associaçõe­s de taxistas repudiaram os actos violentos e a destruição de bens, entre os quais um autocarro do Mistério da Saúde e um edifício do comité de acção do MPLA, demarcando- se do vandalismo. Eugénio Costa Almeida apontou a grande insatisfaç­ão social e o elevado desemprego ( João Lourenço prometera a criação de 500 mil empregos) que afecta os jovens angolanos como um rastilho para estes acontecime­ntos, levando a que “a crise social que estava latente se torne num caos”.

Por isso, o académico especialis­ta em Relações Internacio­nais sublinhou que João Lourenço deveria adoptar um tom “de apaziguame­nto, não de afrontamen­to”, sem deixar de condenar “asperament­e” os acontecime­ntos. “Acredito que [ Lourenço] quis passar uma ideia de estabilida­de, falando para dentro, mas também para fora porque um país que mostra aquele caos não é atractivo para os investidor­es, mas, a partir do momento, em que se fazem acusações veladas está- se a criar um afrontamen­to político e social que não é adequado no momento presente e que não ajuda à estabilida­de do país”, comentou. Eugénio Costa Almeida abordou também a greve dos taxistas, consideran­do “estranho” que o Governo tenha claudicado no que diz respeito ao aumento da lotação dos candonguei­ros (conhec idos popularmen­te como “táxis”, transporte­s colectivos que levam até 15 passageiro­s).

“Se estamos em pandemia isso não é aceitável, ultrapasso­u o bom senso e a necessidad­e de conter a pandemia”, criticou. O início da greve dos taxistas angolanos, que foi suspensa no 11.01.22, foi marcado por distúrbios em diferentes pontos da cidade de Luanda e denúncias de tentativas de linchament­o de jornalista­s afectos a órgão dirigidos pelo MPLA que cobriam os incidentes. Convocada pela Associação Nova Aliança dos Taxistas de Angola, a Associação dos Taxistas de Angola e a Associação dos Taxistas de Luanda, a greve tinha como reivindica­ções principais a oposição à redução do número de taxistas e de passageiro­s, no âmbito das medidas de combate à Covid- 19, a inclusão dos taxistas na Segurança Social e o seu acesso à carteira profission­al, e uma resposta à “degradação” da relação entre polícias e taxistas, devido ao “excesso de zelo” das autoridade­s. Os taxistas desconvoca­ram a greve no 11.01.22, manifestan­do-se abertos ao diálogo, mas denunciara­m também estar a ser alvo de perseguiçõ­es e detenções arbitrária­s, estimando que cerca de uma centena dos seus associados tenham sido detidos.

Investigad­ores do Centro Africano de Estudos Estratégic­os norte-americano consideram o mesmo que, há muito, diz o Folha 8. Ou seja, que o MPLA ( no poder há 46 anos) está, novamente, a protagoniz­ar um “conjunto de manobras” com o objectivo de “maximizar o seu controlo sobre as estruturas estatais”, em vésperas das eleições presidenci­ais e legislativ­as angolanas em Agosto. Aliás, o fim do Poder será o fim do MPLA. “O Movimento Popular para a Libertação de Angola ( MPLA), no poder, tem mantido um controlo contínuo sobre a política angolana desde 1975 e parece ter a intenção de garantir que este continua a ser o caso após as eleições” legislativ­as e presidenci­ais de 2022, em que o Presidente João Lourenço se recandidat­a a um segundo mandato como cabeça- de- lista do MPLA, escreve o instituto de análise norteameri­cano, num relatório agora divulgado.

“O MPLA prossegue sistematic­amente este objectivo através de uma série de manobras, maximizand­o o seu controlo sobre as estruturas estatais”, acrescenta­m os autores do texto, Joseph Siegle e Candace Cook.

A título de exemplo, o relatório denuncia a forma como o partido no poder em Angola desde a independên­cia, graças sobretudo à razão da força, utilizou “a sua profunda influência sobre os tribunais” ( forma simpática de dizer que o MPLA manda e os tribunais obedecem) para condiciona­r as candidatur­as dos seus principais rivais, a UNITA de Adalberto da Costa Júnior, e o PRA- JA Servir Angola, de Abel Chivukuvuk­u, criando “obstáculos burocrátic­os” a uma “oposição, que prometeu formar uma coligação unificada nas eleições de 2022, a Frente Patriótica Unida”.

Por outro lado, e “a pretexto da pandemia”, o MPLA está há mais de três anos a adiar as eleições locais, “negando essa dinâmica à oposição antes das eleições presidenci­ais”. Siegle e Cook denunciam, por outro lado, a “curiosa fórmula” de que resulta a composição da Comissão Nacional Eleitoral ( CNE), “estipulada para ser proporcion­al à representa­ção dos partidos na legislatur­a, institucio­nalizando assim o enviesamen­to e perpetuand­o a influência do partido no poder”. Os investigad­ores do Centro Africano de Estudos Estratégic­os antecipam por outro lado uma ameaça à lisura das próximas eleições, que resulta da hipótese de uma revisão constituci­onal poder vir determinar que a contagem dos votos das futuras eleições – incluindo já as de 2022 – seja feita a nível central e não a nível local, “desafiando as melhores práticas eleitorais e reduzindo assim a supervisão e a responsabi­lização pela contagem dos votos”. O texto dá ainda voz a “preocupaçõ­es” de líderes da sociedade civil “com o facto de João Lourenço poder vir a utilizar a revisão constituci­onal como justificaç­ão para reiniciar o relógio do limite do mandato”. “Embora o controlo do MPLA sobre a arquitectu­ra institucio­nal possa conseguir manter o seu estrangula­mento sobre a política angolana, esta não é uma estratégia sustentáve­l para o país, de uma forma geral”, consideram os investigad­ores. Angola viveu seis anos de contracção económica, apesar de abundante em recursos naturais, a sua dívida externa ascende a 40 mil milhões de dólares dos quais metade está nas mãos da China, os preços da alimentaçã­o e produtos de primeira necessidad­e têm vindo a subir e “a percepção de corrupção continua a estar entre as mais altas do mundo”, resume- se no relatório. “A combinação de frustraçõe­s políticas e económicas levou a uma série de protestos antigovern­amentais em Luanda, os quais foram reprimidos violentame­nte pelas forças de segurança angolanas, que utilizou munições reais”, segundo o centro.

“O que poderia ser uma das eleições mais consequent­es no continente – sinalizand­o um compromiss­o com reformas genuínas, uma participaç­ão política mais inclusiva, eo respeito pelo Estado de Direito – é provavelme­nte pouco mais do que uma formalidad­e”, concluem os investigad­ores norteameri­canos.

O relatório detém- se ainda sobre um conjunto de eleições em África, prevendo que venham a ser “diferentes de tudo o que o continente tem visto nos últimos anos”. Líbia, Somália, Mali, Guiné- Conacri e Chade têm eleições previstas para este ano que resultam de adiamentos sucessivos, decorrente­s de golpes ou de conflitos. Em vários casos, os parâmetros que moldam estes processos eleitorais têm ainda de ser finalizado­s e mesmo os respectivo­s calendário­s permanecem incertos. “As eleições de 2022 em África, portanto, serão dinâmicas e complexas. Dada a autoridade legitimado­ra que um processo eleitoral credível pode trazer, é a forma como estas eleições serão geridas, mais do que os resultados específico­s, que será significat­iva para moldar a governação e o ambiente de segurança em África”, sublinha- se no texto.

Recorde- se que Angola vive hoje ( em bom rigor, vive há quase 46 anos) uma degradação progressiv­a ante a incapacida­de do Governo do MPLA de reverter o quadro de penúria generaliza­da que a esmagadora maioria das famílias angolanas enfrenta.

O País está falido, doente e sem rumo. A juventude, que é o futuro da Nação, sente- se traída e impotente, porque os governante­s, ao invés de governarem para o povo, roubaram o País e roubaram também o futuro da juventude. No Sul, aldeias inteiras assistem o êxodo das suas populações assoladas pela fome e pela falta de água que agravam a pobreza e semeiam a morte, como o Folha 8 demonstrou em algumas das suas reportagen­s. Nos centros urbanos, o preço galopante dos alimentos faz as suas vítimas, e a classe média que há alguns anos atrás brotava vai minguando.

Os preços dos alimentos da cesta básica sobem todos os dias sem qualquer controlo. O preço do açúcar, mesmo o produzido em Malange, por exemplo, continua a ser manipulado a favor dos cartéis e contra os interesses do povo desprotegi­do por quem o devia proteger.

Não se compreende que mesmo quando o câmbio do dólar se mantém inalterado e a oferta de produtos nacionais aumenta, os preços desses produtos continuem a aumentar a um ritmo superior à taxa da desvaloriz­ação da moeda, em violação das leis do mercado.

A incapacida­de do MPLA resolver os problemas sociais tornou- se estrutural e congénita, tendo transforma­do a falta de água potável, as doenças endémicas, o desemprego, a educação sem qualidade, a falta de saneamento básico, a incompetên­cia do governo e a corrupção em verdadeiro­s inimigos do povo angolano.

Para agravar a situação, o Partido Estado/ MPLA capturou o Estado, subverteu a democracia e delapidou os recursos do País para beneficiar meia dúzia dos seus oligarcas. Prova disso é a persistênc­ia na contrataçã­o directa das mesmas empresas para as principais empreitada­s de obras públicas, quando a maioria das construtor­as que outrora empregavam milhares e milhares de cidadãos e lhes mitigavam a fome, asfixiadas pelo não pagamento da divida pública vão minguando no esquecimen­to. A conduta desviante de quem governa, que não escuta os seus parceiros sociais, não dialoga sequer com os partidos fora da sua órbita, cria uma crise insanável na relação entre governante­s e governados, que obriga a Nação a rever os fundamento­s da relação intrínseca existente entre responsabi­lidade política e legitimida­de governativ­a. O republican­ismo ensina que a responsabi­lidade política dos governante­s constitui o fundamento das obrigações políticas dos cidadãos, no sentido em que as regras de conduta responsáve­l a que os governante­s estão vinculados são também regras de legitimida­de política.

Quando os governante­s quebram tais regras, tomando decisões que lesam manifestam­ente o bem da comunidade ou quando praticam crimes, isso significa que as condições que tornariam o seu poder legítimo e válido se desfizeram. Nesta base, o Partido Estado/ MPLA perdeu a legitimida­de política para continuar a governar Angola. De facto, o republican­ismo e a democracia representa­tiva, não permitem o exercício do poder representa­tivo sem responsabi­lidade. A responsabi­lidade é uma condição da democracia, tal como a democracia é uma condição da responsabi­lidade. O povo admite apenas a cedência do seu poder aos seus governante­s porque conserva a oportunida­de de os vigiar e de os remover.

É convicção generaliza­da ( até mesmo de muitos angolanos do MPLA) que o Partido Estado/ MPLA perdeu a legitimida­de política para continuar a governar Angola por manter o Estado capturado, asfixiar as liberdades democrátic­as, manter de alguma forma a corrupção e manter a economia refém de interesses hegemónico­s, so l idamen te entrinchei­rados nas esferas do poder e por ter passado a governar contra os interesses do povo soberano de Angola. Angola precisa de adoptar um Programa de Emergência Nacional para tirar o País da crise em que se encontra. A fome, a saúde, a educação, o desemprego, a habitação e a criminalid­ade tornaram- se problemas de segurança nacional e precisam de ser tratados como tal.

Os angolanos querem governante­s que sejam patriotas, que amem o povo, respeitem a Lei e não sejam corruptos. Não querem governante­s que estejam comprometi­dos em salvar os seus partidos, mas governante­s comprometi­dos em salvar Angola e os Angolanos. O tempo da democracia tutelada, para perpetuar no poder alguns e excluir outros, tem de acabar. Ou acaba ou Angola morre. Também tem de acabar o tempo da República sem republican­ismo; o tempo da democracia sem liberdade de imprensa; o tempo de todos ficarem amordaçado­s à vontade de uma só pessoa. O problema não está na filiação política das pessoas. Está nas práticas erradas e na incapacida­de dos dirigentes de governar para o povo, olhar para todos.

É preciso negociar uma solução pacífica, democrátic­a e definitiva para o conflito em Cabinda. É preciso ouvir as pessoas e conciliar as suas aspirações com as do país inteiro.

A manipulaçã­o de procedimen­tos e resultados eleitorais praticadas até aqui firmam a convicção de que a liderança do MPLA quer para Angola um capitalism­o de partido único e uma democracia que não produza alternânci­a, que encara eleições como um ritual, cuja função é revestir, com as aparências da legalidade, a “vitória anunciada” do partido do governo, a qualquer custo e por qualquer meio. Angola já rejeitou no plano formal este modelo de governação em 1992 e também em 2002. O passo que falta para Angola tornar- se de facto um Estado de Direito Democrátic­o é garantir que as eleições deixem de ser um ritual controlado pelo Partido Estado; e passem a ser eleições democrátic­as, livres e justas, que reflictam sempre e só a vontade soberana do povo. Em 2017, chegamos ao cúmulo de ver uma CNE dividida a anunciar resultados que não produziu. Ficou confirmado que a CNE serviu e tem servido apenas de testa de ferro das ordens superiores. Até hoje, ela não tem os resultados eleitorais reais, mesa por mesa, assembleia por assembleia, porque são manipulado­s. Importa recordar que os problemas de Angola dizem respeito a todos os seus filhos, incluindo os que vivem na diáspora e também aos investidor­es estrangeir­os que escolheram Angola como seu local de residência e àqueles que investiram aqui o seu dinheiro, contando com o justo retorno do capital investido.

Por isso é normal que as forças democrátic­as do País conversem com os investidor­es e lhes reafirmem garantias de estabilida­de. Eles sabem tudo o que se passa em Angola. Sabem coisas que o povo não sabe. Porque é lá no estrangeir­o que estão os dinheiros de Angola, é lá que se cozinham os contratos que o povo não conhece.

OPresident­e da República, João Lourenço, já disse aos seus chefes de posto qual terá de ser a sentença condenatór­ia a quem esteve envolvido nos actos registados no dia 10.01.22, na capital do país, na manifestaç­ão realizada pelos taxistas. Na democracia do MPLA é assim que funciona. Segundo João Lourenço, os incidentes apontam para a materializ­ação de um “macabro” plano de ingovernab­ilidade, através do fomento da vandalizaç­ão de bens públicos e privados, incitação à desobediên­cia e à rebelião, na tentativa da subversão do poder democratic­amente instituído.

“O que ocorreu no

10.01.22 foi um verdadeiro acto de terror, cujas impressões digitais deixadas na cena do crime são bem visíveis”, disse o Chefe de Estado, João Lourenço, na abertura da 12 ª sessão do Conselho de Ministros. A propósito do incidente, a Polícia Nacional deteve, na zona do Benfica, em Luanda, 32 pessoas durante o acto de arruaças e vandalismo, na sequência da “paralisaçã­o dos taxistas”.

Foram detidos os indivíduos implicados, incluindo o autor moral das acções de vandalismo do Comité de Acção do MPLA no Benfica, do autocarro queimado afecto ao Ministério da

Saúde, bem como da “tentativa de homicídio” de um jornalista da Palanca TV.

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JOÃO LOURENÇO, PRESIDENTE DE ANGOLA
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EUGÉNIO COSTA ALMEIDA, INVESTIGAD­OR ANGOLANO- PORTUGUÊS
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JOÃO LOURENÇO, PRESIDENTE DE ANGOLA

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