Jornal Cultura

Os kandengues atrevidos assumem a ruptura?

O casogeraçã­o do Sembado Puto Português

- Matadi Makola

D as suas constelaçõ­es, o Rangel já fez emergir a nível nacional três putos que foram grandes do kuduro, respectiva­mente: Puto Prata (o do

Kibexa); Puto Lilas (o do Volante) e o Puto Português (o do Wakimono). Dentre os três, o último “emigrou” para o semba, onde viu a sua fama e posição atingirem grandes proporções.

Puto Português faz o seu nome ao lado de Nakobeta. O seu kuduro registou bons momentos nos hits Manda Potência , em que a dupla conta com a participaç­ão do rapper Vuivui, dois Kalibrado. Um kuduro mexido e de rimas bem trabalhada­s; Chu

palá e Baba-baba são outros dois sucessos do kuduro de 2000; Mama Kudy foi outro tema que bateu, e que já trazia um pouco das misturas house de hoje. Em É hoje, com participaç­ão do Zoka Zoka, podemos encontrar ainda a sua carga rap. Tarraxa é uma tarraxinha e talvez a única tentativa neste estilo arriscada pelo kudurista. A mesma não chegou a ser muito conhecida. Trabalhada pelo Dj Havaiana, Freestyle éa música em que os kudurista Gata Agressiva e Zoka Zoka também participam. Waki

mono foi o maior sucesso da dupla Nakobeta e Puto Português, autoconsid­erada “a mais forte do planeta”.

Nos dois álbuns de semba editados até ao momento, as suas composiçõe­s não fogem das temáticas do rap, do ReB e do kuduro. É um cliché que gira em torno da dama “barona”, do adultério, da bebida, das trukuteca de início de inal de semana, fala sobre o pacheco, con litos amorosos, aculturaçã­o e acontecime­ntos inusitados do dia-a-dia.

O semba e o kuduro têm na sua intenção melódica discrepânc­ias que até agora se a iguram apáticas. Infelizmen­te, a transição de épocas – consequent­e do positivo e natural relativism­o cultural – trouxe os seus excessos, as suas aberrações; e talvez em todas as áreas da arte angolana se tenha infectado mesmo as consequênc­ias. O problema em mãos está na reversão total ou conversão ajustada. Nesta senda, questionam­os: será possível travar ou tratar a máquina pop que atingiu as camadas mais recentes e continuou o curso da “des iguração” cultural sob o pretexto de revindicar o seu suposto direito de se equipar/acompanhar a pedalada da máquina cultural das contempora­neidades europeias e americanas e com elas estabelece­r diálogos?

O estado do semba constitui um dos alvos desta problemáti­ca, que dele vemos brotar à galopada um subgénero que, pelas suas caracterís­ticas pop, indicia uma ruptura na melodia e na composição, cujo protagonis­mo nos dias que correm tem sido assumido pelo então kudurista Puto Português, e dessa sua “nova praia” já resultaram os discos Geração do Semba e Rit

mo e Melodia, dois registos musicais híbridos, apesar do protagonis­mo mediático causado.

Foi a principal animação da 3ª edição do Top kuduro, que aconteceu no Cine Atlântico no dia 30 de Novembro do ano passado. Do kuduro lembra os sucessos

Wakimono eo Chupalá, e do semba as músicas Zébedé e Oceano Atlântico, a última escrita em São Tomé.

Geração do Semba: os kandengues atrevidos assumem a ruptura

Pela sua profundida­de e exigência, poderia alguém saltar do semba para o kuduro num abrir e fechar de olhos? Ouvimo-lo: “Tomei a decisão e decidi arriscar. Pode não agradar a todos, mas há sempre alguém que acaba por gostar. No semba o sucesso foi imediato”.

O cd Geração do Semba, lançado em inais de 2010, foi o Disco do Ano do Top Rádio Luanda do mesmo ano. Foi um dos discos mais tocados pelas rádios. Basicament­e, a palavra semba voltou a estar na boca do público, principalm­ente jovem.

Com alguma verdade a favor, Português acusa: “O semba sempre foi muito mais tradiciona­l e muito mais para os kota. Isso é uma evolução que começa a se a irmar com o Yuri da Cunha. Ele é de facto a génese do semba jovem e novo: aquele das coisas de estúdio e mexidas electrónic­as. Hoje a juventude gosta mais do semba devido aos arranjos que nós impusemos. Houve muitas críticas e quem desacredit­asse da nova postura que impomos. Os mais velhos estão a deixar. Nós podemos não interpreta­r radicalmen­te, mas beber um pouco e fazer nascer uma nova cena”.

Embora não se discrimine as composiçõe­s em português, o semba sempre foi estruturad­o a ser veículo e ferramenta das línguas nacionais. É o seu ideal, uma caracterís­tica orgânica a preservar. Mas o novíssimo dia da música nasce concentrad­o na metrópole progressiv­a. Todo o público e status dependem apenas de Luanda. As novas estrelas são citadinas e só têm o português como língua materna. Nascem habituados aos prédios altos e toda a gama electrónic­a. Voltar para o coração de Angola é um sacri ício que talvez não estejam dispostos a aturar. São instantâne­os.

“Para nós preservamo­s a cultura não basta apenas cantar em kimbundu. Mas nós vamos fazer o que pudermos. Chega uma altura em que poderemos revisitar a origem do semba para atestar como o semba atingiu os patamares que hoje compreende. É lógico que é preciso apresentar as origens do semba, mas sem deixar de ser o “kandengue atrevido”. Tenho grande feição pelos músicos Paulo Flores e Yuri da Cunha. Pela grande parte de jovens que hoje consegue fazer semba, então decidi homenagear este grupo do novíssimo semba com o Geração do Semba. Muitos kotas já estão a deixar a música e tem de haver gente para dar continuida­de a este estilo. Admitimos que o semba já não é igual. Nós buscamos outros sons que nos diferencia­m, mas não deixou de ser semba”.

O kuduro é o estilo que sabia fazer e era a sua única opção. Entretanto, conta que já pensava e sempre gostou dos estilos semba e kizomba. Partilhou convivênci­as com os do seu círculo, podendo adiantar os nomes do Znóbia, Noite e Dia, Nakobeta, Puto Prata, Dj Walter Laton e outros que movimentav­am o circuito das novas tendências musicais aí no Rangel.

Mudou de estilo mas não de nome. Tem indumentár­ia de rapper americano ou de executivo europeu (o fato e gravata). Falou-nos um pouco disso: “Não tinha como mudar o nome. É uma marca. Eu tinha 12 anos quando decidi usar o nome de Puto Portguês. Já fazia kuduro. A minha atenção era usar um nome que chamasse a atenção das pessoas, por isso pensei num nome estrangeir­o. Como tinha doze anos, então juntei o puto ao português. Isso tudo aconteceu no Rangel. Trocar como? É complicado porque isso já é uma marca criada. Talvez num futuro próximo tirar o Puto e icar só o Português. Mas ainda não penso nisso”.

Já se sentiu tentado a cantar rap e chegou mesmo a gravar. Uma vez foi ter com um produtor e lhe explicou que queria experiment­ar um rap, mas não tirou porque não era intenção promover-se neste estilo.

Sempre se viu influencia­do pelo Nakobeta. Era vizinho do Znóbia e quase sempre ia vê-lo no seu estúdio, onde aproveitav­a para ensaiar coisas novas. Mas muitas vezes ia apenas para assistir. Assume que já não consegue voltar para o kuduro porque o semba lhe ocupa as suas ideias e tudo aquilo que idealizou na música.

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