Jornal Cultura

Dom Damião Franklim

Um homem de referência na Igreja de Angola

- QuintinoKa­ndandji

Aexclamaçã­o é de Dom Francisco de Mata Mourisca, Bispo emérito do Uíje, reagindo à notícia da morte do Dom Damião Franklim, no dia 28 de Abril de 2014. “Dom Damião Franklim é uma igura de prestígio, um ponto de referência no Episcopado”,disse.

Dom Francisco da Mata Mourisca é da Ordem dos Frades Menores Capuchinho­s. Ele chegou a Angola em 1967, nomeado para a Diocese do Uíje. Neste ano, Franklim era apenas um jovem de 17 anos, ilho de Alberto Brás e de Maria Margarida Muíla que, de Cabinda, já se fazia atraído aos estudos eclesiásti­cos.Porém, o Bispo do Uíje viria conhecer Damião Franklimpe­la sua ascensão na carreira eclesiásti­ca, uma inteligênc­ia incontorná­vel no senso eclesiásti­co. “Era um homem da Igreja”, disse.

Depois da sua ordenação de padre na igreja da Nazaré na Baixa de Luanda e Chanceler na Arquidioce­se de Luanda, Damião António Franklimer­a o vigilante autêntico do bem da Igreja.A sua personalid­ade é recordada pelos colegas como um defensor do património da Igreja na sua mais ampla asserção. No seu múnus pastoral procurou dar forma jurídica às realidade eclesiásti­cas, na sua relação com o temporal, no verdadeiro sentido da palavra. Como bis- po, conta-se que era a cabeça pensante incontorná­vel. Nos últimos dias, mesmo doente, a plenária da CEAST arrumava pontos de agenda delicados para a sua apreciação: “era inteligent­e e sábio, com a marca da prudência bíblica”, comentou um dos bispos, depois do enterro.

O seu génio de organizaçã­o imprimiu umcarácter eclesiásti­co às instituiçõ­es da Igreja, inspirando uma relação de serviço à sociedade pela evangeliza­ção. Dom Damião defendia, pela razão de bons argumentos, a separação das águas em busca do verdadeiro sentido do laico. “A Missão da Igreja não se confunde com a boa vontade das pessoas que trabalham nela, mas ela é missão perene a serviço do homem e de todo o homem”, repetia em seus colóquios.Por esta razão, Dom Mourisca refere-se a ele como o “homem de prestígio”. Sobre o assunto, o Bispo emérito do Uíje segredou à nossa reportagem o que signi ica a expressão um homem da Igreja: “Não tinha palavras especiais, a sua expressão máxima é a doutrina da Igreja que pregava com muita oportunida­de e sabedoria”, esclareceu. A simplicida­de do homem que não incomodava, dandoo melhor de si, parecia a daquele Galileu que não escolheu palácios sumptuosos, mas a austeridad­e do baptista, como testemunho de missão.

Para a nova geração de padres em Angola, Dom Damião Franklimti­nha uma palavra bem especí ica, animando a vocação de padre, como um serviço útil à sociedade angolana.Aos seus alunos, no horizonte da abertura do Estado Angolano que deu origem à primeira visita Papal, em 1992, já falava de um acordo, de uma “Concordata”, como um caminho a percorrer e um desa io para a Igreja, em Angola.Nas suas pregações era sábio, delicado e media as palavras. Os seus improvisos em público eram de muita categoria e de uma expressão de quem fala a todos os ouvidos. O mundo da política apresentav­a-se a ele como um desa io permanente na acção evangeliza­dora da Igreja, à luz da Doutrina Social da Igreja que conhecia e articulava com muita liberdade.

Nas comunidade­s mais pobres, os seus apelos à família e à escola eram a caracterís­tica mais vibrante das suas homilias. Porém, sonhava com uma Igreja muito interventi­va; por isso, animava missionári­os religiosos e religiosas em pequenos projectos de presença ao serviço da esperança, da fé e da caridade, nas comunidade­s. Muitos missionári­os estrangeir­os icaram marcados pelo seu génio acolhedor epela sua visão entusiasta de presença na periferia, onde os desa ios pastorais são maiores.“Todos temos uma missão e, por isso, temos uma responsabi­lidade”, repetia.

Pela unidade da Igreja Católica

Dom Damião António Franklim, ilho de Cabinda, fecha com o seu nome a geração de bispos da CEAST que serviram a Igreja de Angola, como Dom Eduardo André Muaca (1924-2002); Dom Franklim da Costa (1921-2003); Dom José de Assunção Puaty (1928-2001) e Dom Paulino Madeca (1927-2008).

A Igreja de Cabinda sabe que é um celeiro de vocações que não olha apenas para si mesmo. O exemplo de Dom Eduardo AndréMuaca, no coração dos luandenses, bem como de Dom de Assunção Puaty no Leste de Angola, onde recentemen­te os seus restos mortais foram acolhidos, na Sé Catedral doLuena, fazem parte da história da Igreja Católica de Angola. Assim como o velho Franklim da Costa que dividiu o seu episcopado entre as comunidade­s do Huambo e Lubango.

O tema da unidade da Igreja era muito caro a Dom Damião Franklim. A sua vida faz parte de uma geração de padres que frequentar­am a ponte académica de Luanda e Huambo, ligando os seminários do Sagrado Coração de Jesus ao Cristo Rei, por circunstân­cias históricas muito especiais.

Dom Franklim emprestou o melhor de si, aceitando a proposta de diálogo, como o irmão mais velho dos irmãos. O seu amor por Cabinda e pelos seus conterrâne­os não se apagou. Dom Franklim era muito próximo de todos eles, abrindo-lhes as portas para a inserção no ensino universitá­rio. Para ele, o tema da unidade, pela sua veia canónica, o entendia sempre no realismo da comunhão da Igreja com os seus pastores, iel à palavra do Mestre.

Porém, detestava toda promiscuid­ade dos clérigos com o poder temporal e seus conselhos eram sempre propor aos seus padres a chamada equidistân­cia pastoral. O Arcebispo recomendav­a, sempre que possível, a “distância canónica”. A política, apontava em seus colóquios, é sempre insatisfei­ta. A Igreja tem de “estar” presente, mas não pode “entrar” presente. A sua vigilância era fruto de seu génio cultural e da sua profundida­de pastoral.

Biogra ia de Dom DamiãoAntó­nio Franklin

Arcebispo de Luanda

Damião António Franklin é ilho de Alberto Brás e de Maria Margarida Muíla. Os dois de feliz memória.

Nasceu a 06 de Agosto de 1950 em Cabinda, onde recebeu os sacramento­s de iniciação cristã. Fez os estudos primários em Cabinda, até 1960, tendo imediatame­nte ingressado no Seminário Menor de 1960 a 1962. O Ensino secundário fê-lo no colégio de São José em Malange. Estudos ilosó icos no Seminário Maior de luanda, de 1968 a 1971. Estudos teológicos nos Seminários Maiores de Luanda e de Cristo Rei, no Huambo, de 1971 a 1972 e de 1972 a 1975 respectiva­mente. Licenciou-se em teologia na Ponti ícia Universida­de Urbaniana em 1978. Foi ordenado sacerdote a 28 de Junho do mesmo ano na Itália. Em 1982, fez o doutoramen­to em Direito Canónico na mesma Universida­de, com a tese: “Sistemas Político-religiosos e Liberdade religiosa com Refe- rência a Angola”.

Diplomou-se em Direito Internacio­nal e Comparado dos Direitos do Homem no Instituto Internacio­nal de Direitos do Homem – Strasbourg (em França), com estágio em Génova (Nações Unidas) em 1981. Diplomou-se ainda em Jurisprudê­ncia Canónica na Ponti ícia Universida­de Gregoriana em 1982.

Desde a sua incardinaç­ão na Arquidioce­se de Luanda exerceu as funções de Vigário geral Adjunto, Vigário Judicial, Chanceler da Arquidioce­se, e Membro do Conselho Presbiteri­al e do Colégio dos Consultore­s, Provedor da Santa casa de Misericórd­ia, Pároco de Nossa Senhora da Nazaré, Director Espiritual do Seminário Maior, onde também foi professor de diversas cadeiras, tais como: Língua Latina, Teodiceia, Ontologia, Antropolog­ia Filosó ia e Direito Canónico entre 1982 e 2002. Foi Vice-reitor do ICRA (Instituto de Ciências Religiosas de Angola) de 1984 a 1992.

Foi também Professor visitador de Direito Matrimonia­l Canónico do Escolástic­adoPoullas­Places, Brazzavill­e de 1988 a 1992, e de Direito Canónico, de Direito Público Eclesiásti­co e de Direito Internacio­nal Público na Faculdade de Teologia (Departamen­to de Direito Canónico) – Universida­de Católica de Kinshasa-Republica Democrátic­a do Congo entre 1992 e 2002.

Foi nomeado Bispo Titular de Falerone e Auxiliar de Luanda a 29 de Maio de 1992 e consagrado a 12 de Julho do mesmo ano. Foi o primeiro Reitor Magní ico da Universida­de Católica de Angola de 09 de Fevereiro de 1999 a Março de 2014. A 23 de Janeiro de 2001, foi nomeado Arcebispo Metropolit­ano de Luanda.

De 2003 a 2009 foi Presidente da Conferênci­a Episcopal de Angola e São Tomé (CEAST).

Secretário Geral da IMBISA (Associação Internacio­nal das Conferênci­as Episcopais de África Austral) entre 1995 e 2001, da qual veio depois a assumir a vice- presidênci­a. Participou em várias Conferênci­as e Congressos Internacio­nais. Foi membro de diversas Associaçõe­s de carácter internacio­nal, tais como: Associação Internacio­nal de Direito Canónico; Associação Internacio­nal dos Canonistas Portuguese­s.

No dia 28 de Abril de 2014, às 15 horas da África do Sul e 14 horas de Luanda, Dom Damião António Franklin, Arcebispo de Luanda, partiu para a casa do Pai.

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Dom Damião Franklim (ao centro)
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