Reencontro com o folclore
Ocantor Sabino Henda Kapassete está a preparar uma série de obras folclóricas que resultará em obra discográ ica, cujo lançamento “não tem ainda uma data em vista” pelas diculdades inanceiras com que se confronta. Natural de Camcupa, província do Bié, o jovem músico já se tornou numa das referências da música nacional, interpretando, fundamentalmente, temas na língua nacional Umbundu. Na primeira metade dos anos 80, Sabino Henda foi, ao lado dos malogrados José Machado “Mamborrô” e João de Assunção, bem assim como de Joseca, Gizela, Ângelo Boss, Impactus 4, Gingas do Maculusso e outros artistas piôs, uma das referências da música infantil no país. O cantor que se consagrou na música em 1980, aos nove anos, na sua terra na
tal, conta no mercado com as obras “Sobrevivo só”, “Hamiulo”, “Poeira velha” e “De lá para cá”.
Jornal Cultura – Sabemos que começou a cantar no início dos anos 80 ao lado de outras vozes infantis, com referência particular para o malogrado “Mamborrô”. Quando acontece, de concreto, a sua aparição como músico?
Sabino Henda – Consagrei-me como músico em 1980. A massi icação cultural teve mão na minha carreira artística, já que naquela altura havia essa possibilidade. A massi icação era notória em todas as províncias e recantos do país. Fruto disso, a partir daqui, do Cuito, Bié, forjei-me no mundo da música. JC – E como tudo começou?
SH– Através de programas da época. Consagrei-me em 1980, como disse atrás, e dali já não parei. Comecei a actuar com agrupamentos musicais, como os Proletários, e mesmo sem aparelhagens fazíamos muitas actividades. Posteriormente tivemos uma aparelhagem a partir da massi icação cultural que se fazia e isso foi o juntar do útil ao agradável. Fazíamos espectáculos como banda, actuando de Cabinda ao Cunene.
JC – Depois da conquista do Top dos Mais Queridos de 2004, com a música “Embrião”, icou um tanto ou quanto desaparecido dos palcos.
SH– Não. Nunca estive distante dos palcos. O que se passe é apenas uma estratégia de imagem, pois tenho aparecido pouco em actividades publicitadas e noutras de grande vulto. Isso serve para realçar apenas que tenho aparecido, já que se parasse perderia um bocado aquele traquejo que é necessário para aparecer em determinados palcos. Parar, como tal, nunca parei.
JC – Nesses mais de 30 anos de carreira obviamente teve muitas conquistas.
SH – A década 90 foi bastante relevante para mim, porque ganhei quase todos prémios a nível nacional. Venci todos os concursos realizados em Luanda em
1999. Ganhei o Variante, a Canção de Luanda, a Canção da Luanda Antena Comercial (LAC), um festival dos direitos humanos. Em 2002 ganhei o Variante a nível nacional, depois o Top Rádio Luanda de 2003, obtive o terceiro lugar noTop dos Mais Queridos nesse mesmo ano e em 2004 consagrei-me vencedor desse concurso com a música Embrião, que faz parte do disco Hamiulo. Quase todos festivais intermédios a nível de Luanda até 2004 foram ganhos por mim. Esse facto orgulhou-me sobremaneira.
JC – Quantos discos tem lançados no mercado musical?
SH– Neste momento tenho quatro discos editados. “Sobrevivo só”, de 1995; “Poeira velha”, 1999; “Hamiulo”, 2000; “De lá para cá”, em 2004. O lançamento desse meu último disco coincidiu com a fase minha licenciatura. A ideia era fazer coincidir a minha licenciatura com o lançamento de um livro, mas acabei, todavia, por fazê-lo com o disco porque já estava na forja.
JC – Além de músico, é também militar. Pode falar-nos desse percurso.
SH– Sou marinheiro. Ostento a patente de tenente de Fragata na Marinha e sou lincenciado em Realções Públicas Internacionais desde 2004, pela Universidade Privada de Angola (UPRA). Tenho o mestrado em Negócios e Finanças pela MBA (Marketing Bisnes e Administraccions), iz pós-graduação pela Évora, cuja defesa inicialmente prevista para Novembro fui forçado a pedir mais um semestre adicional para o fazer apenas no próximo mês de Maio.
JC – Como foi o seu percurso escolar até chegar a Luanda?
SH– Os meus primeiros anos escolares frequentei-os no Cuito, a capital da província do Bié, e posteriormente prossegui os meus estudos na capital do país, Luanda.
JC – É fácil conciliar essas actividades com a música?
SH– Perfeitamente. A actividade militar é para mim muito educativa pela disciplina em si que esta impõe. Sou quadro da Marinha de Guerra desde 1987, aquando da formação das Brigadas Artísticas desse organismo a nível nacional. Fui convocado para a equipa que trabalhou para a formação dessas brigadas artísticas a nível dos ramos, um posto que ostento até hoje. JC – Tem algum disco na forja?
SH– Não diria disco como tal já, mas sim tenho uma série de obras folclóricas. São obras de minha criação, de icção e de acontecimentos reais já preparadas, faltando apenas limar algumas arestas para entrarem em orquestração e posteriormente em estúdio. JC – Quando pode sair esse disco?
SH– Perante as di iculdades que enfrento não é possível já antever uma data para o lançamento. Por isso, pre iro não prometer nada por enquanto, por não ser fácil a conclusão desse trabalho discográ ico.
JC – Mas que di iculdades se refere em concreto?
SH– Estas di iculdades começam pela base. Não temos nesse momento um mercado sustentável que nos dê um rendimento favorável para se fazer um disco, daí que são necessários muitos apoios. Estes apoios às vezes tardam a chegar e consequentemente isso di iculta a produção das obras. Não basta ter-se um produtor no mercado, é imperioso que haja entidades que invistam mesmo na música e de facto ajudem na edi icação de um novo mercado para a mesma. Sente-se, en im, alguma insensibilidade hoje para se atingir esses objectivos no nosso mercado artístico. Portanto, não existem grandes produtores capazes de fazer um mercado da música rentável, em que se investe e vai-se buscar de seguida um retorno dos investimentos feitos.
JC – Fora da música e da actividade militar quem é Sabino Henda?
SH– Sou chefe de família, pai de cinco ilhos (uma menina e quatro rapazes) e vivo maritalmente. Nasci em 1971, no município de Camacupa.
JC – Orgulha-se de ter nascido nesse que é o ponto central do
país?
SH– Bastante. Julgo ser por essa razão que sou bem recebido em toda parte de Angola em que ponho os pés (risos).
JC – Como todo o músico, obviamente tem uma carreira marcada por altos e baixos.
SH– Efectivamente. Os momentos críticos resumem-se nas di iculdades com que me tenho confrontado, particularmente no que se refere ao capital inanceiro para fazer o meu projecto musical seguir em frente. As pessoas as vezes olham para o Sabino Henda e pensam ser alguém que já está bem feitinho na vida. Na verda- de tem sido di ícil a minha actividade nesse campo da música. Por isso, é deveras lamentável quando se tem um projecto, pretende-se caminhar num sentido, mas devido a imperativos de vária ordem a pessoa vê-se obrigada a enveredar por outro, remediando a situação. Isso é muito di ícil para qualquer artista.
JC – E que momentos tem a destacar como bons?
SH– Os momentos altos resumem-se naquelas como a actividade que realizar no Bié, enquadrada nos festejos dos doze anos da conquista da paz no país. Convites como estes traduzem o reconhecimento do quanto, como artista, tenho vindo a fazer ao longo destes anos. Nesta actividade, que se realiza no Pavilhão do Sporting do Bié, aqui no Cuito, onde já actuei há mais de 20 anos atrás, posso passar o testemunho e experiência a alguns músicos mais jovens que se forjam na actividade artística. Quero lembrar que na década de 80 eu era o único músico que representava o Bié nos grandes eventos musicais nacionais. Vezes sem conta eu não precisava concorrer nos concursos provinciais, porque não existiam músicos à altura para representar a província. Portanto, no começo da minha carreira no Bié conquistei vários prémios provinciais. JC – Isso é muito signi icativo para si.
SH– É óbvio. Depois da Independência Nacional o primeiro artista a fazer espectáculo com banda neste Pavilhão do Sporting, onde a 4 de Abril cantei de novo, fui, precisamente, eu. Isso traduz uma grande conquista para mim. Orgulha-me regressar a um palco aonde cantei há mais de vinte anos. JC – Sente-se realizado como músico?
SH– Neste prisma que acabei de caracterizar sim, porque ainda estou de pé. Quero realçar que momentos como os de 4 de Abril último (cantar num palco onde actuei há mais de vinte anos) re lectem uma oportunidade que me rejuvenesce cada vez mais. Permitem-me cantar o que gosto, passar a mensagem educativa, aquela que faz com que hoje sejamos reconhecidos pelos nossos feitos.